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HORIZONTE DE ESTRELAS - MISSÃO 05

MISSÃO 05

ROTA DE FUGA 

Por alguns segundos — longos, infinitos, torturantes — tudo o que existia era o som das próprias respirações. Rápidas. Ofegantes. Rasgando o ar reciclado da sala de engenharia como se os pulmões estivessem tentando fugir do próprio peito. A porta se mantinha firme. Trincada. Marcada por garras. Mas... por enquanto... segura.

Zurgo deslizou pelas placas metálicas do chão, escorregando até sentar, costas na parede, peito subindo e descendo como um motor prestes a fundir. Mako ainda segurava o blaster, mas com a mão tremendo tanto que parecia prestes a derrubar. Nyx fazia um escaneamento rápido do ambiente, sensores girando, faíscas escapando de uma rachadura no ombro esquerdo.

E Lúcia. Ela estava de pé. Mãos nos joelhos. Testa suada. Olhar fixo na porta. Como se esperar mais três segundos pudesse fazer aquele pesadelo simplesmente evaporar. Mas não evaporou. Do outro lado da porta… Ainda estava lá. Ela. Respirando. Esperando. E talvez... sorrindo.

“Certo...” — Lúcia puxou o ar, se endireitou, passou a mão no rosto, ajeitou o coldre na perna. — “Isso não acabou. Nem de perto.”

Mako deu um meio sorriso, nervoso, sacudindo o blaster, limpando o suor da testa com a manga rasgada.

“Sabe... eu não fazia ideia que sair com você podia ser... tão intenso assim.” — Tentou parecer descontraído. Não conseguiu. — “Próxima vez, vamos só... sei lá... beber. Jogar paiko. Qualquer coisa que não envolva quase virar lanche alienígena, tá bom?”

Zurgo deu uma risada nervosa, meio engasgada, meio soluço.

“Concordo. Completamente. Completamente. Com-p-le-ta-men-te...” — e ficou balançando a cabeça, apertando uma chave inglesa que nem sabia que ainda tava segurando.

Nyx nem reagiu. Só girou a cabeça devagar, olhos de plasma brilhando.

“Proposta de interação social... desnecessária. Prioridade: localização do módulo de conduíte quântico. Sem ele, não há chance de extração bem-sucedida.”

Lúcia olhou pro grupo, respirou fundo, e com aquela voz que não permitia discussão, soltou:

“Certo... vamos pegar o que viemos pegar. E vamos dar o fora daqui.”

Virou-se pra sala. Pela primeira vez desde que entraram, realmente olhou. A engenharia da ISV Kronos não parecia só abandonada. Parecia ter sido... devorada. Cabos pendiam do teto como vísceras mecânicas. Paredes abertas, retorcidas, marcadas por garras — ou ferramentas, ou... algo entre as duas coisas. Painéis queimados. Sangue. Marcas de luta. De desespero. E, espalhados no chão, ferramentas, partes de drones, restos de armaduras... e ossos. O silêncio agora não era só assustador. Era... respeitoso. Como pisar no túmulo de algo que ainda respira. No canto direito, uma estação de comando semi-intacta. No centro da sala, um reator secundário desligado, cuspindo faíscas intermitentes, pulsando como um coração falhando. E no fundo… Um compartimento de armazenamento técnico. Fechado. Trancado. Com uma etiqueta holográfica tremeluzindo:

ACESSO RESTRITO – COMPONENTE NÚCLEO DE CONDUTOR QUÂNTICO

Zurgo olhou, engoliu em seco.

“Ali... tá ali. Tá ali. Eu reconheço esse painel. É... é... É AQUILO. É ELE. O módulo.”

Nyx fez um movimento de cabeça, sensores piscando. — “Confirmação: probabilidade 92,7%. Unidade de conduíte localizada. Caminho... obstruído por destroços.”

Lúcia apertou os olhos, ajustou a jaqueta, respirou fundo, e virou-se de volta pro grupo:

“Então bora trabalhar...” — olhou de canto pro teto, onde, mesmo não vendo, ainda ouvia aquele som abafado — “...e bora fazer isso rápido.”

Do outro lado da porta, mais uma vez...
TOC. TOC. TOC.

Como se dissesse:

“Eu ainda tô aqui.”

Zurgo se abaixou na frente do painel principal da engenharia, esfregando as mãos suadas na própria calça.

— “Certo... certo... não parece tão ruim...” — Ele olhou mais de perto e seu rosto ficou pálido. — “Ok, minto. Parece péssimo. Isso tá... isso tá MUITO quebrado.”

O painel estava aberto, fios expostos, cabos derretidos, alguns completamente carbonizados. Válvulas hidráulicas soltavam vapor de alta pressão, e pelo menos três componentes estavam literalmente faltando. Mako cruzou os braços, olhando pro painel e depois pro teto.

“Perfeito. Sensacional. A gente vem parar na única nave da galáxia onde até os fios estão mortos.”

Nyx se aproximou do terminal de dados secundário, conectando o braço biônico. Seus olhos começaram a piscar em sequências rápidas, alternando espectros, vasculhando arquivos, processos e logs corrompidos. Enquanto isso, Lúcia girava no próprio eixo, blaster em punho, olhando pro teto, pras paredes, pro chão, ouvindo…

Ouvindo…

A coisa lá fora. Respirando. Esperando. Batendo. Zurgo respirou fundo, abriu a mochila, puxou três cabos remendados, uma chave de torque, uma célula de indução defeituosa e um pedaço de conduíte que parecia ter sido mordido.

“Ok... vocês já ouviram falar de... bypass criativo?” — perguntou, sem esperar resposta.

“Não, mas adoro quando você começa a falar essas coisas.” — respondeu Mako, sarcástico.

Zurgo bateu no painel, encaixou dois cabos onde definitivamente não era pra caber, soldou com a própria pistola de plasma, cruzou uma célula de carga direto no núcleo auxiliar e…

Faíscas voaram. O painel inteiro acendeu.

“FUNCIONOU! EU NÃO SEI COMO, MAS FUNCIONOU!!!” — berrou, levantando os braços como se tivesse acabado de ganhar uma corrida.

Os sistemas da engenharia começaram a zumbir. Luzes piscando. Motores de suporte rodando. Energia restaurada. Mas... com a energia…

vieram os sons. Sirenes. Alarmes. Portas rangendo. Trilhos se movendo. Ventiladores antigos tossindo poeira e ar reciclado. E, do outro lado da porta…

Ela percebeu. Ela ouviu. Nyx, ainda conectada, acessou os sistemas.

“Transferindo arquivos... decifrando... integridade dos dados: 48%…”

“Acessando logs da pesquisa Kronos…”

“Classificação: Ultra Confidencial. Autorização militar.”

A voz da androide ficou mais baixa. Mais... pesada.

“Informação relevante: espécimes biológicos de codinome... Projeto Erebos. Quantidade... três.”

O silêncio que se instalou na sala não foi o mesmo silêncio de antes. Foi um silêncio diferente.

Um silêncio que doía.

Mako arregalou os olhos. — “...Três?”

Zurgo quase derrubou a chave de torque. — “N-n-não, não, não... você quis dizer... tipo... três tentativas? Três rascunhos? Três... modelos?!”

Nyx não respondeu. Ela apenas projetou o arquivo corrompido no ar. Hologramas tremeluziram, distorcidos, zumbindo com falhas. Pedaços de vídeo, registros de áudio.

“Registro Kronos-A7. Teste de contenção fracassado. Unidade E-02 apresentou desenvolvimento acelerado. Unidade E-01 segue agressiva, sem sinais de cansaço. Unidade E-03... desaparecida dos sensores internos. Risco de brecha crítica…”

“Prioridade máxima: evacuação da tripulação. Protocolos de segurança falharam. Projeto Erebos... fora de controle.”

O vídeo cortou. Só estática. Zurgo respirava como se tivesse corrido mais do que o corredor anterior inteiro.

“A GENTE NÃO TÁ PRESO COM ELA... A GENTE TÁ PRESO COM ELAS!!!”

Lúcia apertou os olhos, respirou fundo. Segurou o blaster como quem segura uma extensão do próprio braço.

“Certo... certo... não muda nada. Nosso trabalho é o mesmo. Achar o módulo. Levar pra nave. E sumir daqui antes que essas... coisas decidam brincar de esconde-esconde no nosso esqueleto.”

O som atrás da porta ficou... diferente. Mais pesado. Mais... grave. Não era mais só uma batida.

Eram... várias. Nyx completou o processo.

“Localização do módulo confirmada. Compartimento selado. Requer acesso manual. Alerta: falhas estruturais nas seções Gamma e Delta. Risco de colapso... elevado.”

Lúcia olhou pro grupo, ajeitou a jaqueta, travou o blaster.

“Bora. Quanto mais tempo a gente fica aqui...” — olhou pro teto, pro chão, pras paredes, pro holograma... — “...menos tempo a gente fica vivo.”

A nave inteira parecia... acordar. O silêncio que se seguiu depois de removerem o módulo não foi de alívio. Foi aquele tipo de silêncio que tem gosto de sangue na boca, suor nos olhos e o som abafado de garras arranhando metal do outro lado da porta. Zurgo limpava as mãos sujas na calça, ofegante. Mako olhava pro teto, pro chão, pro módulo, depois pro teto de novo — como se fosse possível encontrar um milagre escondido entre os cabos. Nyx estava de pé, estática, sensores varrendo o espaço, calculando, calculando, calculando. E Lúcia encarava o grupo, batendo o dedo no coldre.

“Certo... temos o módulo.” — A voz dela era firme, mas não disfarçava o tom seco de ansiedade. — “Agora... como a gente sai daqui?”

Mako cruzou os braços, quase pulando no próprio lugar. — “É, isso... isso! Excelente pergunta! Porque... alguém aqui tá com um mapa milagroso? Um buraco negro portátil? Um portal dimensional escondido?!” Zurgo começou a girar a chave de torque nas mãos, encarando o chão.

“A rota que usamos pra entrar tá descartada. Não tem chance. A criatura... ou as criaturas...” — fez uma careta — “...sabem onde estamos. Se tentarmos voltar pelos corredores... somos carne moída antes da primeira esquina.”

Nyx piscou, olhos alternando padrões.

“Análise: acesso principal à doca frontal... comprometido. Integridade estrutural abaixo de 18%. Probabilidade de desabamento... 92,6%.”

Mako passou a mão no rosto, quase arrancando os próprios cabelos.

“Perfeito. Sensacional. Entramos pelo portão da frente e agora ele tá em chamas... ou pior, em garras.”

Lúcia apertou os olhos, girou sobre os calcanhares, varrendo a sala. Olhava cada pedaço de painel, cada conduíte exposto, cada símbolo holográfico piscando.

“Essa nave é uma laboratório, certo? Ela não tem só uma doca. Deve ter rotas de emergência. Um hangar secundário, cápsulas de evacuação...”

Nyx se virou, sensores zunindo.

“Buscando... analisando...” — Os olhos dela projetaram um mapa holográfico parcial, cheio de falhas e zonas corrompidas, mas ainda legível. — “Doca auxiliar três. Seção Beta. Não aparece nos registros externos da nave. Provavelmente projetada para transporte discreto de cargas sensíveis... ou experimentos.”

Zurgo se aproximou, olhos grudados no mapa.

“Dá pra acessar por aqui...” — apontou — “...um corredor de manutenção que corre paralelo às linhas principais. Tá isolado. Não aparece na malha de tráfego da nave. Usado só por técnicos.”

Mako se inclinou, encarando o holograma.

“E a doca... tá funcional?”

Nyx fez uma pausa, processando.

“Dados inconclusivos. Energia da seção... intermitente. Mas... trilho de transporte de carga conectado à doca está operacional. Probabilidade de funcionamento... 63,2%.”

Zurgo girou a chave de torque, sorrindo meio nervoso.

“Então... se a doca estiver inteira... a gente chega nela. E se não estiver...” — encolheu os ombros — “...bom... aí não precisa mais se preocupar com nada.”

Mako jogou as mãos pro alto.

“Ótimo. Plano perfeito. Perfeito. Uma rota escondida, passando pelos intestinos dessa nave amaldiçoada, que talvez... só talvez... nos leve pra uma doca que talvez... só talvez... ainda existe.”

Lúcia respirou fundo, olhou pra cada um deles, depois fixou o olhar no mapa tremeluzindo.
“É isso que temos.” — Disse, firme. — “Não temos escolha. Pegamos o módulo, seguimos por esse corredor de manutenção e rezamos pra doca estar inteira. E se não estiver... a gente dá um jeito. Como sempre.”

Zurgo suspirou, batendo a chave contra a palma da mão.

“Tá. Então bora trabalhar. Se alguém achar uma cápsula de evacuação perdida no caminho... dá um grito.”

Mako soltou um riso curto, sem humor.

“Pode deixar. E se eu achar um portão pro paraíso... eu aviso também.”

O mapa tremeluzia, as rotas piscavam. A linha da vida deles agora era um corredor apertado, escuro, esquecido no canto de uma nave projetada pra fazer experimentos que nunca deveriam ter existido.

Do outro lado da porta, o som das garras ficou mais pesado. Mais. Vários. Mais perto. O tempo deles estava acabando. O mapa holográfico tremeluzia, projetando a linha de fuga. Corredor técnico. Doca auxiliar três. Talvez... só talvez... uma chance de escapar. Por um instante, houve aquele silêncio. Não o silêncio da calma. O silêncio do cérebro funcionando no limite, costurando cada pensamento como se a própria vida dependesse — porque, de fato, dependia. Lúcia olhava pro mapa. Mas não via só o mapa. Via o que essa nave era. O que ela continha. O que poderia acontecer se... se alguém, qualquer um, encontrasse isso. Ela respirou fundo, apertou o punho. Passou a mão pelo rosto, como quem tenta limpar o peso da própria consciência. E então falou. Baixo. Firme. Pesado.

“A gente não pode simplesmente ir embora...”

Zurgo levantou o rosto, franzindo a testa. — “...Hã?”

Lúcia olhou pros olhos de cada um. — “Se nós encontramos essa nave... outros também podem. E se acharem... essas coisas... podem sair daqui. Matar. Se multiplicar. Chegar em alguma estação, algum planeta. Não dá pra deixar isso assim. Não dá.”

O silêncio se estendeu. Nyx piscou, sensores zunindo, processando, mas nada disse.

Mako balançou a cabeça.

“Aí, não. NÃO. A gente não tá falando disso. A gente não vai começar com ‘vamos fazer a coisa certa’, ‘vamos salvar o universo’, não. Eu vim aqui pegar um módulo. Só isso. Só. Isso.”

Zurgo, até então quieto, olhando o mapa... franziu mais a testa.

O olhar ficou diferente. O jeito dele mudou. Começou a andar pela sala. Olhando pro teto. Pros painéis. Pros cabos. Pros tanques. Pros anéis de confinamento. Pro reator auxiliar tossindo faíscas.

Passou a mão no queixo, murmurando pra si mesmo. — “...na verdade... na verdade...”

Girou, apontou pro grupo.

“...a gente pode fazer isso.”

Mako piscou. — “Fazer o quê?!”

Zurgo sorriu. Meio nervoso. Meio brilhante. Meio... gênio.

“Explodir a nave.”

“O QUÊ?!” — Mako quase tropeçou.

“Pensa. Pensa comigo. Essa nave roda com um reator de confinamento magnético modelo ZK-900. É velho. Antigo. E... sabe de uma coisa linda sobre essas belezinhas?” — bateu no painel, quase com carinho. — “Eles não sabem falhar com elegância. Quando falham... eles falham GRANDE.”

Se abaixou, puxou uma placa quebrada, rabiscou no chão com graxa e poeira.

“Tá vendo aqui?” — desenhou um círculo. — “Núcleo de confinamento. Plasma superaquecido girando, mantido no lugar por anéis magnéticos. Bonitinho. Controlado.”

Desenhou três linhas cortando o círculo.

“Se a gente desligar os anéis de contenção... mas mantiver os injetores de combustível abertos, o plasma começa a se expandir. Primeiro aquece. Depois... derrete os próprios estabilizadores. A pressão sobe, sobe... até que...” — estalou os dedos. — “BOOM.”

Fez uma pausa. Apontou pro teto, pros tanques.

“Mas não é um ‘boom’ qualquer. É um colapso de confinamento. O campo magnético implode, o plasma escapa... e a energia acumulada se libera em uma fração de segundo. A explosão... é equivalente a... umas quarenta, talvez cinquenta megatons.”

Mako ergueu as mãos.

“VOCÊ SABE O QUE É CINQUENTA MEGATONS, ZURGO?!!!”

Zurgo girou a chave de torque no dedo, deu de ombros. — “O suficiente pra essa nave deixar de existir. E qualquer coisa dentro dela virar poeira cósmica.”

Mako segurou a cabeça com as duas mãos. — “Não... não, não, não. Vocês tão loucos. Isso não é um plano. Isso é... sei lá... é suicídio com roteiro!!!”

Zurgo ignorou. — “E a melhor parte... eu posso configurar um atraso no colapso. Dez minutos. É o máximo. Qualquer coisa além disso... e o próprio superaquecimento dispara antes.”

Apontou pro mapa. — “Nesse tempo, a gente pega o módulo, corre pelo corredor de manutenção até a doca auxiliar. O trilho de carga ainda tá funcional. Se a doca estiver inteira...” — respirou — “...a gente vive.” Mako respirava pesado. Olhava pra eles, pro mapa, pro chão, pro teto. Fechou os olhos, mordeu o lábio inferior, apertou os punhos. E então explodiu:

— **“VOCÊS SÃO TODOS LOUCOS! TODOS! LÚCIA, ELE É MALUCO! NYX, VOCÊ É UM MONSTRO SEM ALMA! E VOCÊ, ZURGO...” — apontou — “...você precisa de terapia urgente! MAS... OK! OK! VAMOS FAZER ISSO! VAMOS VIRAR LENDA OU CARBONO!!!”

Lúcia sorriu. Aquele sorriso seco, amargo, que ela só dava quando sabia que estava prestes a fazer algo absolutamente insano.

“Então bora. Montar uma estrela... e sumir antes dela nascer.”

Do outro lado da porta… O inferno... esperava. Zurgo correu até o painel lateral do reator, abriu uma caixa de fusíveis que definitivamente não queria ser aberta e mergulhou metade do corpo ali.

— “Tá... tá... estabilizadores térmicos... cadê... ah, claro, quebrados. Ótimo.” — Ele soltava enquanto puxava fios, arrancava painéis, e jogava peças no chão como se desmontasse um brinquedo velho — só que um brinquedo capaz de vaporizar quilômetros cúbicos de espaço.

Lúcia e Nyx seguravam o perímetro, armas erguidas, olhos — ou sensores — atentos a qualquer sombra que se mexesse no teto ou nos cantos.

Mako andava de um lado pro outro, mordendo o lábio, puxando os próprios cabelos. — “Não... não... isso não tá acontecendo. Isso NÃO tá acontecendo...” — resmungava, olhando pro relógio de pulso como se isso fosse atrasar o tempo.

Zurgo grunhiu, girando uma chave de torque e soldando dois cabos que, pela cor, jamais deveriam estar juntos.

“Se alguém aqui tiver medo de instabilidade eletromagnética... fecha os olhos. Sério.”

O painel cuspiu faíscas, as luzes da engenharia piscaram, e uma sirene — que parecia não funcionar há décadas — subitamente despertou, gritando um som agudo e rouco:

ALERTA. NÍVEL DE CONFINAMENTO COMPROMETIDO. PROTOCOLOS DE EMERGÊNCIA ATIVADOS.

Zurgo bateu no terminal. — “CALA A BOCA. EU SEI O QUE TÔ FAZENDO... eu acho...”

Nyx virou a cabeça. — “Aumento de radiação no núcleo. Sobrepressão nas bobinas de contenção. Colapso do confinamento... em andamento.”

Zurgo então conectou um dispositivo improvisado — uma espécie de caixa com fios, uma célula de energia quebrada e, no topo, um velho cronômetro digital amarrado com fita isolante.

A tela acendeu.

09:59. Contagem regressiva iniciada.

“Pronto. Tá feito.” — Zurgo limpou a graxa das mãos na própria calça, sorriso nervoso. — “O bebê tá chorando. E daqui a dez minutos, vai gritar tão alto que nem vai sobrar eco.”

Mako arregalou os olhos. — “DEZ MINUTOS?!! SÓ DEZ?!!”

“Se quiser eu posso colocar vinte...” — Zurgo fez uma pausa, deu dois tapinhas no painel — “...mas aí ela explode antes. Então...” — sorriu — “...confia.”

O som de metal rangendo veio do teto. Depois, passos. Não de uma. Não de duas.

De muitas patas. Garras. Respirações. Onde quer que elas estivessem... sabiam. Sentiam.

Nyx girou a cabeça, olhos piscando. — “Movimentação detectada. Setor acima. Se aproximando.”

Lúcia girou, batendo a mão no coldre, segurando firme. — “Certo. A bomba tá armada. O módulo tá com a gente. Agora...” — olhou pro grupo, pro mapa, pras sombras que já se moviam — “...é hora de correr.” Zurgo apontou pro mapa tremeluzindo no terminal.

“Corredor de manutenção. Acesso pela escotilha ali...” — apontou — “...se tudo der certo, leva até a doca auxiliar três. Trilho de carga. Nossa linha de vida.”

O som de algo — ou várias coisas — arranhando as paredes ficou mais alto. Mais perto. O cheiro de ozônio queimado, fluido hidráulico e... algo mais. Algo metálico, quente, orgânico. Mako apertou o blaster contra o peito, respirou fundo.

“Dez minutos. É isso. Dez minutos... pra viver ou... virar parte da decoração cósmica.”

O cronômetro piscava.

09:27.

09:26.

Lúcia olhou pra porta da escotilha aberta, depois pro grupo.

“Bora, gente. Ou saímos voando... ou saímos em partículas.”

E, quando deram o primeiro passo pro corredor escuro, apertado, torto, sujo, cheio de cabos pendurados e marcas de garras nas paredes… Um rugido. Atrás deles. Perto. Muito perto.

E o som de algo caindo no chão metálico... vindo diretamente atrás. O cronômetro continuava.

09:12…

 09:11...

4 Comentários

  1. Meu amigo!!!

    A agonia prossegue.

    O ritmo narrativo eletrizante que você dá ao texto, deixa a gente aflito, vivenciando a cena, a cada frase, parágrafo ou fala.

    Tá tensa a coisa!

    Parece que não vai dar certo, que as criaturas vão chegar antes.
    Espero que eles escapem!

    Parabéns!

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    1. Acho que acabei traumatizando vocês com Por Trás Dos Olhos.....

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  2. Rapá! Ridley Scott devia te chamar quando resolvesse fazer um novo Alien.
    Tu mandou muito bem na tensão que só aumenta e na descrição de ação e ambientação, consegui visualizar tudo o que estava acontecendo e até sentir o cagaço que os personagens estavam sentindo.
    Mandou bem demais! Parabéns!

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