Eu ainda me lembro como se fosse hoje. A explosão, o barulho quase ensurdecedor… e tudo aconteceu tão rápido… tão rápido que minha cabeça infantil mal conseguia processar.
Meu pai sempre me contava suas histórias, de como ele se tornou o Ranger Verde e de como o grupo dos Rangers Veteranos, mesmo sem o conhecer, não desistiram dele. Eu particularmente sempre achei aquelas histórias um pouco infantil demais até pra mim, mas eram elas que traziam o dinheiro pra dentro de casa, e meu pai adorava me contar. Os olhos dele brilhavam a cada vez que se sentava ao meu lado e contava seus feitos, os monstros que derrotou, as vidas que salvou. Mesmo eu já conhecendo todas elas de cor, eu não poderia tirar aquilo dele, então eu sempre o deixava falar de seus feitos e sempre o ouvia como se nunca tivesse ouvido aqueles relatos antes. Tudo pra mim era tão fantasioso, e de repente, em um único dia, tudo que ele havia me dito se torna realidade da forma mais dura e cruel que uma criança poderia presenciar. Aquele monstro caiu dos céus na minha casa, matou a minha mãe na minha frente e na frente do meu pai que mal pode se levantar pra lutar com ele. Eu assisti a vida da minha mãe sumir dos olhos dela. Eu vi minha mãe morrer... e quando eu achava que tínhamos escapado, meu pai toma uma decisão que terminaria de me devastar. Ele partiu junto com os outros Rangers, me deixando aos cuidados do Tio Brian.
Depois daquela noite na fazenda em que o meu pai me colocou no carro do Tio Brian, eu nunca mais tive notícias dele. Aquele ano foi o ano mais difícil da minha vida. Eu não pude enterrar minha mãe. Não houve uma cerimônia pra ir, não há um túmulo pra se visitar. Tudo que tenho dela ficou na minha memória.
Depois de seis meses sofrendo, a vida precisava continuar. O Tio Brian, a quem eu ainda chamava apenas de Brian, se prontificou a me arrumar uma escola e a me colocar de volta, ou pelo menos tentar me colocar de volta, no fluxo de uma vida normal, mas eu não era mais a mesma, eu nunca mais conseguiria ser...normal. Na nova escola, eu me sentia sozinha, me sentia abandonada. Tudo que acontecia à minha volta deixou de ter o menor sentido pra mim. Eu fiquei nervosa, fiquei furiosa, fiquei violenta. Reagia negativamente a diversas situações do dia a dia com as quais qualquer criança de cinco anos conseguiria lidar muito melhor do que eu. Não foram duas ou três vezes que o Tio Brian foi me buscar na escola dentro da sala da diretoria. Em uma certa vez, eu espanquei um garoto que me chamou de aberração, porque ele descobriu que eu morava com o Tio Brian e ele descobriu sobre a opção amorosa dele. Pra esse garoto o Tio Brian era uma aberração e por consequência, eu também era. Não suportei, não pela ofensa, não pelo tio Brian, mas talvez, por que eu precisava de um motivo, uma razão pra por pra fora toda a raiva e ódio que eu sentia por que a vida me tirou da minha família. O garoto foi parar no hospital e o Tio Brian teve que desaparecer comigo, pra não perder minha guarda pro estado.
Eu nunca parei pra pensar, mas o Tio Brian comeu o pão que o diabo amassou pra cumprir a promessa que ele fez ao meu pai, de cuidar de mim. Eu nunca tinha dado valor àquela atitude, eu nunca tinha entendido a atitude. Até o dia que, olhando pela fresta do quarto dele, que naquele dia ele esqueceu de trancar, o peguei chorando a morte do Billy, implorando a Deus para que ele de alguma forma voltasse pra ele. Já faziam mais de seis meses que estávamos juntos, quer dizer, que ele tentava me ajudar, me consolar, resolver meus problemas. Eu sempre me senti sufocada com tamanho cuidado, mas naquele dia, eu percebi que ao invés de me sufocar, o que ele fazia era me colocar acima da própria vida, do próprio sofrimento, pra que eu não sofresse. Ele tentava de tudo pra me agradar, e eu mal pude parar de olhar um pouco pro meu próprio umbigo pra perceber, o quão devastado ele também estava, pois se eu perdi o meu pai, a minha mãe, ele perdeu a única pessoa no mundo que se importava com ele. Eu não estava sozinha porque ele sempre esteve comigo desde o dia em que saímos daquela fazenda, mas ele estava sozinho, porque eu nunca estive com ele de verdade. Naquele dia, os meus seis meses de teimosia, de egoísmo, vieram como um soco no meu estômago, e eu chorei, chorei compulsivamente e não tive dúvidas, entrei no quarto e o abracei, abracei tão forte quanto abraçaria meu pai se eu o visse, e finalmente eu entendi que ambos perdemos tudo naquele dia.
Os outros seis meses passaram-se tranquilamente. Nós nos ajudamos muito, ficamos juntos, e foi nesse período que o Brian se tornou o meu Tio Brian. Estávamos mais unidos do que nunca, e mesmo sentindo muita falta da minha família, Tio Brian era o mais próximo de uma família que eu tinha, e eu era o mais próximo de uma família pra ele. Quando tudo estava indo bem, e eu me preparava pra uma nova tentativa de uma vida normal, alguém bateu na porta. Aquela garota da noite da fazenda a quem chamavam de Alpha, havia acabado de chegar. Ela falou da morte do meu pai, da morte do Billy, da morte de todos os Rangers. De como eles haviam lutado, de como haviam entregue suas vidas para salvar o seu planeta, o seu tempo, e de como todos os seres desse planeta eram gratos pelos Rangers terem existido. Ela contou de sua promessa de tentar salvar a terra em retribuição, e que nosso tempo estava acabando, que tínhamos que nos preparar. Ouvir que meu pai estava morto havia acabado comigo, mas quando o Tio Brian soube do Billy, ele desmoronou.
Eu queria sofrer, queria me trancar no quarto e deixar esse maldito mundo explodir, mas não seria justo, eu já havia passado tempo demais sofrendo na dependencia do Tio Brian. Era a minha vez de segurar as pontas. Meu pai mandou a Alpha de volta por que ele confiava que com a moeda do poder, eu pudesse lutar e salvar as pessoas. Eu não precisei da moeda. Só precisava estar lá. O Tio Brian foi a primeira pessoa que eu salvei.
Depois que passamos um tempo remoendo o sofrimento e nos preparando, pegamos um motorhome que o tio Brian tinha estacionado a tempos em uma garagem, e saímos pelo mundo. Claro que pra aguentar a viagem a Alpha adicionou alguma tecnologia Actariana ao veículo. Partimos sem rumo, e meu treinamento começou. No começo era muito difícil, era quase impossível acreditar que um dia eu estaria lutando contra seja lá o que fosse surgir para destruir nosso planeta. Alpha me testava até o limite. Em dados momentos eu desmaiava durante o treinamento. Mas mesmo assim, mesmo com todas as dificuldades eu continuei. Minha condição física começou a melhorar. As dores que sentia no começo, já não doíam mais, a sensação de que meu pulmão iria explodir a cada quilômetro acrescentado a uma corrida, eu já não sentia. Meus movimentos ficaram mais rápidos, minhas habilidades foram se aperfeiçoando com o passar do tempo. Alpha era uma excelente treinadora. O problema era quando resolvia testar a minha paciência. A minha habilidade de não perder a cabeça quando ouvisse alguma coisa da qual eu não gostasse era quase nula, e eu sempre me distraía quando ela ofendia meu pai, ou falava mal do Tio Brian. Ela fazia isso pra me desestabilizar, porque ela sabia que tais palavras me feriam, e ela fazia isso quase sempre em que eu estava me saindo bem em algum treinamento, e quando ela fazia isso eu sempre falhava em me controlar.
Eu já estava no limite. Andando pelo mundo, treinando em diversos lugares diferentes, sob frio, chuva ou um sol de quase cinquenta graus, nas montanhas, florestas ou areia, meu rosto em nada lembrava aquela pele rosada limpinha de uma garota criada em berço de ouro. Minhas unhas estavam sempre sujas. Maquiagens, eu nem usava mais, já não me importava. Eu só queria estar pronta pra fazer aquilo que meus pais e seus amigos não poderiam fazer. E graças ao treinamento da Alpha, agora eu tenho essa possibilidade.
Meu tio Brian e a Alpha, que hoje eu tenho como minha irmã, fizeram uma promessa ao meu pai. Meu tio prometeu cuidar de mim, a Alpha prometeu me preparar para qualquer coisa que estivesse por vir. Eu fiquei perdida, sozinha no escuro. O Tio Brian, mesmo com toda a dor que carregava, me trouxe de volta pra luz, a Alpha me deu um objetivo pra continuar na luz. É Graças a esses dois que eu posso dizer: Meu nome é Torry, e eu tô pronta.
12 Comentários
UOU!
ResponderExcluirUm conto realmente emocionante, que desenhou muito bem como será essa heroína, que já me deixa ansioso para ler as aventuras que a esperam...
Gostei porque esse texto já mostra algo que não é mostrado em alguns casos, como ficam as famílias dos heróis que acabam caindo, como elas seguem em frente.
Mandou bem demais nesse texto cara!
Parabéns!
Grande Norberto. Como sempre você está atento as minhas intenções com os textos que posto e os desafios que me imponho. Sim cara, a ideia era mostrar um pouco de como eles seguiram em frente depois de perder tudo, mas além disso, eu queria contextualizar um pouco da Torry já crescida. De como ela se sente. Quando eu começar a saga Fim do Mundo, o leitor ja sabe o que esperar!! Obrigado pela leitura e grande Abraço!
ExcluirCaramba... Essa bateu forte... Que soco no estômago ouvir/ler a narrativa da Torry... Nossa, ver como tudo seguiu, como ela sofreu, como ela viveu mal todo esse tempo e, se compreende completamente que ela teria tendência à tudo isso devido ao trauma e ao choque que recebeu naquele momento fatídico e no dia seguinte, mas, eu confesso que apesar da tragédia da Torry, a parte do Brian foi a mais tocante e mais emocionante, porque sem dúvidas, como a própria personagem diz, ela ainda tinha ele, ele tava sempre ali pra ela, mas ele não tinha mais ninguém e ainda sofria preconceito por isso... Nossa cara, me colocar no lugar dos personagens e, embalado pela melodia que indicastes, me fez chorar, mesmo, eu senti toda a dor que aqueles dois passaram e que talvez, ainda venham a passar... Caramba Rodrigo, que episódio incrível, bonito e emocionante... Véi, pára de matar personagens cara, depois a gente tem de tá passando por essas choradeiras, tá loco, podia ter deixado os caras vivos e tal, mas não, teve de matar todo mundo e fazer a gente ver essas cenas que a Torry e Brian acabaram passando... Enfim, que maravilhoso cara, tô aplaudindo de pé, parabéns Rodrigo, fantástico cara! \0/
ResponderExcluirGrande Lanthis. Obrigado por seu comentário. Se você se emocionou com a descrição da Torry sobre como a vida dela se seguiu depois que os Rangers partiram para Aquitar, então eu cumpri meu papel. Trabalhar emocional é uma coisa que eu gosto bastante e ainda mais, quando envolve o "O que aconteceu depois", que nesse caso pra mim foi um desafio. Agradeço demais e espere grandes momentos na parte dois dessa saga!! Grande Abraço
ExcluirQue surpresa! Qual será essa nova ameaça??? Será que a garota vai ta pronta? teremos uma nova equipe? São tantas questões que não vejo a hora de tu continuar contando essa historia nobre Rodrigo. Curti demais rs
ResponderExcluirFala meu querido HR. Sim cara, são tantas questões, tanta coisa pra preparar, que nem eu mesmo posso dizer o que vem por ai, mas pode ter certeza de que seja o que for, valerá muito apena acompanhar. Obrigado por seu tempo e sua leitura. Grande abraço!!
ExcluirOlha... PRMS já foi um baita filme que os ranger mereciam. Porém esse spin off não deixa nada a desejar. Curti essa contextualização da personagem é realmente serve de prelúdio pra uma nova saga! Fora que é uma personagem original... sem palavras Rodrigo... Curti muito mesmo
ResponderExcluirGrande felipe. Bom, eu não considero isso um spnoff, e sim um episodio extra de PRMS, e a proxima parte da saga continuara a historia. Mas sim, a ideia era justamente essa, um preludio pra aproximar o leitor da Torry, que será a personagem principal da próxima saga. Muito, mas muito obrigado por acompanhar e pelo apoio desde o primeiro episodio. Grande Abraço!!
ExcluirExcelente episódio extra que retrata como uma batalha fria e.sombria pode assolar a alma de Torry.
ResponderExcluirEste é episódio não só encerra um ciclo, mas abre as portas para apresentar as novas aventuras que virão.
É possível notar que a personagem está sim pronta e com sangue nos olhos. Ao mesmo tempo, ela parece carregar mágoas em seu coração. Isto aponta para algo mais denso no que tange à relação que tinha com Brian e Alpha.
Aplausos.
Obrigado Artur. Realmente aqui a intenção foi explorar um pouco de "o que acontece depois", e com isso situar o leitor de em que momento a pesonagem está, para que quando chegue a hora dela voltar em suas aventuras proprias, já haja uma emnpatia com a garota que protagonizará toda a parte 2 dessa saga. Obrigado pela leitura!!
ExcluirGrande Rodrigo!
ResponderExcluirUm ciclo épico se fecha com este epílogo contando a vida da pequena Torry, apoia a morte dos pais , heróis da humanidade.
O sofrimento lancinante provocados em sua alma e na do Bryan , que se tornou a única referência de família, geraram traumas que difilmente serão esquecidos.
Mas, mesmo assim, com a ajuda de Alpha vinda do futuro, ela seguirá em frente e lutará para que a Terra não seja destruída no ano de 2030.
Uma nova Ranger aponta para uma nova saga.
Uma nova era!
Magnífico trabalho!
Obrigado pelo comentário e força de sempre Antonio. Grande abraço
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