Olá, pessoal. Colaborando para o projeto de final de ano, Mindstorm 3000, este é um conto que realizei baseado no mesmo universo do conto de Norberto Silva, postado ainda este semana, antes deste.
Espero que gostem.
Explosões múltiplas. Muitas pessoas achando que o mal tinha
acabado por causa delas. Pouco antes delas explodirem, Noah estava fraco, preso
e ligado a um suporte de vida precário. Mas, para sua sorte, ele tinha um comando
mental que ele poderia mandar para sua casa também... Trazendo consigo o
suporte do qual precisava tanto naquele momento.
Desamarrou-se rapidamente e correu para a entrada secreta na
parte de baixo da casa, que era feita de uma cela de titânio, herança da guerra
que havia recebido da Nova Alemanha e do novo Reich. Mas disso ninguém sabia
ainda. A nova doença fez com que antigas reaparecessem, mas não necessariamente
uma doença... Crenças.
Para quem quisesse ver ali, a casa havia explodido, se tornado
menos que pó. Mas Noah havia escapado. Havia sobrevivido. Poderia ir atrás de
crianças novamente. Mas não naquele lugar. Aqueles moradores já deviam estar
cientes dele, então daria um jeito de fugir...
Mas ele estava a pé.
Seguiu pelo túnel que ele havia construído uns 20 metros
abaixo da parte mais baixa da casa, para emergências, e esta foi uma delas.
Andou calmamente, certamente isso daria tempo para que todos saíssem dali e lhe
dessem tempo para escapar pela superfície mesmo, já que a sua rota de fuga
principal foi destruída com o restante da casa.
Andou pelo que pareceram horas, até que ele chegou ao final
do corredor e encontrou a escadaria que lhe levaria para a superfície. Fugiria
dali, dado como morto. Sabia o quanto aquela explosão tinha sido forte. Mais um
pouco ela teria destruído a sua proteção. O baque lhe fez ter medo.
Mas sua mente viajava enquanto ele caminhava, deixava as
suas pernas fazerem o trabalho automático, e por mais que tivesse também suas
próteses cibernéticas, era o seu cérebro humano que fazia todo o trabalho. Não havia
implementado nenhum chip positrônico para ampliar as capacidades cerebrais,
queria se manter apenas um humano melhorado, não um ciborgue.
Não queria perder as suas velhas manias. Queria ir atrás das
crianças novamente, queria poder se divertir novamente.
Noah deixou seu corpo trabalhar automaticamente, fazendo com
que ele subisse lentamente a escadaria em formato de cilindro, indo cada vez
mais para o alto, para a superfície. Levou mais algum tempo, afinal de contas,
a escadaria era alta de propósito, sua ‘base subterrânea’ era profunda e tinha
uma razão para isso.
Porém a escadaria era mais alta. E tinha um propósito.
Quando Noah terminou de subir, a luz do sol começava a
reaparecer... Ele levara mais tempo do que imaginara para andar todo o túnel na
horizontal e na vertical, ele sairia na parte mais alta de um planalto na
entrada da cidade. Ele se irritava em pensar que aquele velho modificado o
tinha pego, ele tinha se dado conta que tinha feito coisa errada.
Mas teria bastante tempo para pensar nisso.
Ao lado da saída, que era composta de uma porta disfarçada
de pedra. Parecia uma, mas era tão leve quanto um portão de casa, só não era
vazado. Assim que a abriu, olhou para os lados – cima, esquerda, direita,
frente, trás... E viu que não havia ninguém.
Ao lado havia um pequeno carro e sua chave estava no
porta-malas. Ninguém procuraria as chaves de um carro que parecia quebrado. Sua
mente brincava consigo, trazia sua história de guerra para que se lembrasse de
como havia chegado ali, como as explosões fizeram com que ele perdesse uma das pernas,
e tivesse que substituí-la...
Ele era um dos antiquados que só utilizou melhoramentos a
partir da perda de seus membros naturais, e a guerra lhe deu este presente.
O carro foi se afastando da cidade de Tybaia. Ele se
fortaleceria e voltaria? Ou viveria uma vida em outro lugar, fazendo as mesmas
coisas? Ou se redimiria? Isso ficaria a cargo do destino.
Mas o que era o destino? Conjunto de reações das ações
tomadas ou um acaso ditado por um deus qualquer das religiões antigas que
voltaram no lugar das que haviam antes da Terceira Guerra Mundial? Noah pensava
em coisas que normalmente não pensava naquele momento, dava à sua mente um
descanso das coisas que eram realmente importantes.
A 300 metros, vire à esquerda na Rodovia Presidente
Dutra.
A voz era feminina, gravada havia anos por causa da grande
empresa que havia tomado conta do mundo, que Noah queria se ver longe. Não
gostava de usar a tecnologia daqueles caras, por mais que fosse muito boa.
Sua maneira de dirigir o levava longe de maneira bastante
automática, e quando viu, já estava passando pela divisa entre San Paolo e Rio
Olympus. Seu destino era uma pequena cidade chamada Terra dos Reis. Tinha um
amigo que morava ali e que poderia lhe dar guarida até que ele conseguisse se
restabelecer e voltar a buscar as suas ‘vítimas’.
Porém, a vida é uma caixinha de surpresas... Andando na
entrada da cidade antes de encontrar seu amigo, Noah encontrou uma mulher,
Catherine. Cabelos vermelhos, como se beijados pelo fogo, formas curvilíneas,
rosto que denotava uma inteligência imensa e uma feição ardilosa. Ela lhe
chamou a atenção quase imediatamente porque ela não tinha quaisquer implantes
cibernéticos. Pele alva, sardenta, intocada pela tecnologia, ao menos parecia
que era.
Ela estava na praça da cidade, prestando atenção em algo que
Noah ignorou solenemente por ter prestado atenção apenas nela. Nunca houve
alguém que lhe chamasse a atenção daquela maneira.
Mas não era hora de se envolver com quem quer que fosse...
Era hora de se reconstruir, não fisicamente, mas mentalmente.
Noah seguiu seu caminho e seu amigo estava à espera.
- Finalmente, mas Noah, sinceramente... Eu achei que você
tinha morrido!
- Foi quase, mas não, Richard. Foi quase.
- Mas o que aconteceu? Não me diga que...
- É, eu fui pego de novo.
- Você não aprende, não é mesmo? Por que você simplesmente
não deixa isso de lado e resolve arrumar a sua vida?
- Porque eu quero viver da maneira que eu julgo merecer.
Esse povo moralista acha que pode me calar, isso me deixa com tanta raiva! Isso
faz de mim alguém do mal? Não! Aliás, bem e mal, essas coisas não existem, são
só pontos de vista diferentes...
Richard não quis responder. Sabia que seu amigo tinha um pé
no sinistro, e que só algo muito forte aconteceria para mudá-lo. A única coisa
que ele iria fazer naquele momento era dar guarida ao amigo, como havia
prometido.
Noah deitou-se na cama e deixou sua mente vagar, viajar nas
memórias. O sono veio rapidamente, e ele se viu em um pesadelo. Neste, sentiu
sua pele derreter, seus ossos se desintegrarem, sua alma ir para outro lugar
que não o seu corpo...
Sonhou que havia morrido na explosão.
O sonho foi lívido ao ponto de acordar assustado, empapado
em seu próprio suor. Olhou para todos os lados, com o coração ribombando no
peito, pensando que havia sido pego de novo.
Mas estava no lugar em que adormecera, a casa de seu amigo.
Soturno, voltou a dormir, mas foi um sono agitado, que ele
não conseguiu descansar direito.
Acordou no dia seguinte empapado com o próprio suor,
assustado com o que a sua mente cansada poderia produzir...
E aquilo poderia ser muito bem a realidade.
O que ele poderia fazer a respeito da vida que ele vinha
tomando? Em um momento, ele tinha tudo o que queria. No outro, não muito
distante, tudo havia acabado, e ele estava sozinho dormindo em uma cama que não
era sua, em um lugar que não lhe pertencia.
Aqueles minutos logo após acordar assustado lhe fizeram
pensar. Noah viu a realidade diante de seus olhos e ele não queria repetir os
mesmos erros. Seria tão errado fazer o que fazia? Seria tão errado ser quem ele
era?
Experimentaria mudar. Afinal de contas, continuar fazendo o
que estava fazendo só o manteria na mesma situação, ou até mesmo em uma pior.
Com isso, resolveu usar o conhecimento que tinha em tecnologia para consertar
alguns eletrodomésticos, algumas próteses biomecânicas. Depois que tivesse o
dinheiro para tanto, pensaria o que poderia fazer.
Foi quando ele conversou com Richard depois de ir tomar o café
da manhã. Andou até a cozinha e seu amigo estava lá, com o café pronto. Contou
tudo o que pretendia, e o amigo ficou feliz.
- Então esse sonho não foi um pesadelo. Foi um presságio. É
bom que você o escute.
Saindo para trabalhar, Noah foi oferecer seus serviços aos
vizinhos, e no meio do dia, ele já tinha alguns serviços para fazer.
Foi quando sua redenção resolveu aparecer.
Catherine andava em direção ao centro de Terra dos Reis, quando
um furgão desgovernado veio em direção dela. Noah viu aquilo e correu... Como nunca
fizera na vida.
Se atirou à frente do carro e fez com que ela se salvasse,
mas no lugar dela, ele foi atropelado. Antes mesmo que seu corpo caísse no
chão, ele foi atingido pelo carro, que continuou correndo, e quando o corpo do
cientista caiu no chão, o veículo passou por cima, esmagando os ossos de seu
corpo e reduzindo a metal amassado suas próteses metálicas.
Seu sangue foi acumulando-se ao redor de seu corpo, saindo
pelas inúmeras fendas abertas em sua pele, pelas fraturas expostas e pelo impacto
que as próprias próteses metálicas tiveram em relação ao seu corpo de carne e
osso.
Catherine correu em direção ao seu salvador, ajoelhou ao seu
lado e fez apenas uma pergunta...
- Por quê?
Noah sorriu. Aquela seria sua última frase, e não seria de
todo ruim.
- Porque não mandamos no coração.
E foi quando Noah sentiu a vida esvair-se de seu corpo, foi
ficando mais e mais difícil respirar, os ossos de sua clavícula haviam
perfurado seus pulmões, e ele sentia seu sangue brotar de sua garganta.
E assim ele havia partido.
Richard correu na direção do amigo, mas não havia mais nada
o que fazer a respeito. Ele tinha desencarnado.
- Richard! É verdade o que este seu amigo disse a meu respeito?
- Sim, Catherine. Eu vi como ele te olhou. Eu não sabia que
o sentimento era tão profundo, mas acho que algo em você mudou ele. O resto foi
o sonho que ele teve hoje de manhã. Ao menos acho que ele se despediu deste
mundo em paz.
A ruiva desabou em lágrimas. Nunca teve ninguém que sentisse
um sentimento tão forte por ela... Não sabia o que falar, como agir, aquele
acontecimento que, em apenas alguns segundos, havia tirado o seu raciocínio.
Como ela poderia reverter algo tão forte?
Conversando um pouco mais com Richard, Catherine descobriu
que ele era igual a ela, um cientista de tecnologia protética.
Correu, tomou o corpo de Noah e correu para sua casa. O que
ela poderia fazer?
- Não vou deixar você morrer. Quero entender mais esse seu
sentimento por mim.
Isto era um fim? Redenção? Ou um recomeço? Um renascimento?
10 Comentários
E eis que o universo Mindstorm 3.000 começa sua expansão!
ResponderExcluirE começou muito bem.
Muito interessante como você pegou um vilão e deu-lhe um arco interessante de começo de redenção... E interrompeu bruscamente. Foi uma surpresa e das boas.
E me deixou cheio de vontade de ver mais de Catherine, do Richard e, claro, do Noah!
Parabéns Jorge! mandou muito bem!
Obrigado mesmo. Eu interrompi porque eu não queria fazer uma continuação... Mas deixei o gancho pra caso possa retomar.
ExcluirAbraço
George Firefalcon!
ResponderExcluirUma história maravilhosa dentro desse universo proposto pelo Norberto .
Noah, Catherine e Richard.
A vida de Noah , o seu sentimento por Catherine .
O sonho e a suposta remissão de Noah.
Tudo feito de maneira dinâmica e muito bem escrita .
Agora é saber se Catherine o reconstruirá e que ser ressurgirá.
Um Noah mais vilanesco ou voltado para o bem ?
Muito bom , mesmo !
Cito Tupangers em Contos, que nsontiveste a oportunidade de ver .
Se me puder ajudar com ideias sobre os seis personagens peço que entre em contato comigo.
Estou homenageando os fictors do Mindstorm e queria fazer algo mais denso em relação à uma de suas obras.
Parabéns!
Antonio, muito obrigado pelo comentário, fico feliz que curtiu.
ExcluirLerei os seus contos! Abraço
Aim eu curti a pegada do seu texto. Deu pra entender claramente o personagem que provavelmente não tinha uma vida correta, buscando a possibilidade de redenção, e quando o mesmo tentou isso, perdeu sua vida(ou não), caso Catherine o traga de volta, na ansia de entender os sentimentos dele por ela, isso pode dar vasão a muitas situações.
ResponderExcluirO universo compartilhado ficou lindo, todas as referencias usadas aqui, demonstram que tudo que acontece, acontece exatamente no universo que o Norberto criou. Deu pra ver que você captou muito bem o cenário. A técnoligia, implantes, etc... me fizeram compreender o unvierso cyber punk e a proposta do Norberto de maneira mais profundo, me preparando ainda mais para o que pretendo escrever.
Ótimo texto George!! Parabéns e em nome de todos os envolvidos, obrigado por participar dessa dinâmica!!
Muito obrigado, Rodrigo. Fico feliz mesmo por ter gostado.
ExcluirQuem sabe se continua? A proposta era ser uma oneshot, mas quem sabe depois de Tupangers ou Kyurangers?
Abraço.
Muito bom, eu curti e vou dizer os motivos:
ResponderExcluir- Primeiro, achei que teríamos algo acontecendo na vida do Noah e que ele iria iniciar uma nova vida, mas tu que o coitado conseguiu foi a morte de uma forma brutal e repentina... Isso impactou, chocou e surpreendeu, meus parabéns!
- Segundo, a estrutura que ele tinha para fuga foi incrível, imagina cavar um túnel do tamanho que ele descreveu? O_O A altura da saída da escada foi outro susto, quer dizer, ele era alguém extremamente preocupado com sua fuga e deve ter investido bons anos fazendo tais rotas de fuga, isso demonstra um cara obstinado e até obcecado!
- Terceiro, a parte mais controversa pra mim, a morte dele foi a melhor parte... Eu explico porque, eu li outro dia uma matéria sobre o cara que deu origem ao "bicho-papão", era um criminoso e doente mental chamado Hamilton Fish que segundo ele mesmo contou, devorava crianças porque aprendeu com um amigo que ficou preso na China na época da fome e o comércio negro ofertava barata, carne de crianças para sobreviverem já que comprar algo normal era praticamente inviável pra quem não tinha boas finanças. Esse "amigo" veio à morar do lado de Hamilton que já era doido da cuca e "ensinou" Hamilton à gostar de carne de crianças e com isso ele matou e comeu (arrancava orelhas também) de diversas crianças. Foi eletrocutado em 1936 pelo que lembro e não demonstrou sequer um remorso que fosse... Porque contei tudo isso? Porque eu não creio, nem um pouco, numa redença do Noah, quem comete esse tipo de crime, jamais deixa de o fazer, é um vício, uma "fome" doentia que nunca é apagada e para a sorte de muitas crianças, ele morreu como morreu!
Excelente trabalho Jorge, gostei muito, como pode ver me surpreendeu e agradou, e principalmente o final dele foi o melhor, pois Noah é o típico ser que não tem condições de viver em sociedade, no meu conceito ele deveria ter prisão perpétua, mas, tu usou um fim mais "provincial" que eu usaria e por isso ganha palmas pela criatividade e ação bem feita! Meus parabéns cara! \0/
Fico contente que tenha curtido, Lanthys. Eu meio que me inspirei na hora de escrever, e eu matei ele de forma abrupta porque senão entraria naquele velho ditado, mas ao avesso:
Excluir"Ou você morre sendo o maior vilão, ou vive o suficiente para se tornar herói também".
Abraço!
Admiro muito a sua habilidade e coragem de topar esse desafio do
ResponderExcluirMindstorm 3000. É para poucos.
O marcante desse texto para mim é atuação do noah. Ele merecia toda punição do mundo. Ele não merece viver em sociedade como disse o Rodrigo. Mas, você praticamente o redimiu.
Lindo texto.
Obrigado, Artur. Eu nem o redimi, muito pelo contrário... Mas quem sabe eu tome coragem?
ExcluirAbraço.