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A verdadeira história do trágico amor de Siegfried e Hilda (capítulo 4)

                                                       Capítulo IV - O herói e a rainha, parte III

Mas o pior para Siegfried ainda estava por vir. Havia algumas pessoas que tinha inveja da fama e do prestígio de Siegfried. Essas são as mesmas pessoas que recorreram aos serviços dos desafiantes de Siegfried para que lhe dessem cabo, lhes prometendo dividir o tesouro com eles. Essas pessoas se juntaram a conspiração encabeçada por Brunhilde, e uma delas é Hagen de Tronje[1], o irmão de Günther. Ele e mais algumas outras pessoas se juntaram a esse complô. “Mas, como vamos mata-lo se ele se tornou imortal depois de vencer Fafner? Nem mesmo Ali Babá e seu bando foram capazes de vencê-lo”, um dos conspiradores perguntou-se em uma das reuniões. “Não se isso é verdade, mas eu ouvi falar que Siegfried tem um ponto fraco. Quando ele se banhou no sangue do dragão, uma folha caiu em suas costas na altura do coração e tirou o sangue do local. Talvez se acertarmos naquele ponto...”, disse Gottorm. “Talvez assim ele morra”, completou Hagen, o qual ao término da reunião se prontificou a exercer o papel de carrasco do herói.

No fim das contas, o complô foi posto em ação ao final da reunião. Siegfried, que comeu a carne de um bisão que ele mesmo abateu horas antes, estava tomando água em um riacho próximo a nascente do rio Reno. Sem que o herói percebesse Gottorm o avistou e avisou Hagen da localização de Siegfried. Prontamente Hagen lá foi, portando uma lança. Siegfried estava tão ocupado em beber a água do rio que não notou a sorrateira aproximação da presença inimiga. Hagen, por seu turno, logo encontrou o ponto fraco de Siegfried e nele mirou. A lança acertou Siegfried em cheio. Siegfried sentiu uma grande e lancinante dor, que nunca sentira anteriormente.

“Mas o que é isso? Como isso é possível se eu me tornei imortal?”, se perguntava Siegfried, sentindo-se agonizante e com suas forças se esvaindo. “Isso é impossível!”, pensa Siegfried, que em seguida morre sem poder reagir à lança que lhe atingiu. Mas não morreu sem antes ver sua vida passar como se fosse um filme dentro de si. Ele se lembra dos dias em que esteve sob os cuidados de seus pais, de quando reforjou a espada Balmung, do momento em que matou Fafner, e nota um detalhe que na ocasião lhe passou batido: a morte de Fafner causou uma grande ventania, e essa ventania deslocou uma folha de uma árvore das cercanias, a qual caiu em suas costas na altura do coração. Tal folha tirou do local o sangue de Fafner e assim criou um ponto fraco fatal. E em seus derradeiros segundos de vida se lembrou da advertência de Alberich, da qual ele fez pouco caso na ocasião. Um grande arrependimento do fato de ter feito pouco caso do alerta do rei dos anões lhe bateu, mas já era tarde demais.

Assim o grande herói Siegfried morreu. A notícia pegou todos no reino burgúndio de surpresa. Afinal, quem em sã consciência imaginaria que um dia o formidável e imortal Siegfried, aquele que derrotou o terrível Fafner e tantos outros desafiantes que reivindicaram o tesouro do Reno, viria a falecer? E ainda dessa forma? Posteriormente, descobriu-se a respeito do complô que levou Siegfried a morte. Uma grande carnificina teve lugar no reino burgúndio. Antes de Siegfried ser enterrado, uma disputa pela posse do anel (o qual ainda estava na mão do herói) teve início. Primeiro Hagen e Günther o disputaram, com a vitória do primeiro. Em seguida Hagen tentou pegar o anel da mão de Siegfried, mas em seguida Gudrun e Brunhilde aparecem reivindicando a posse do item mágico. Gudrun disse que esse anel lhe pertencia porque Siegfried em vida fora seu marido. Mas em seguida Gudrun enfim se dá conta da verdade ao ouvir as palavras de Brunhilde. “Você nunca passou de uma concubina de Siegfried, renda-se aos fatos, Gudrun! Muito antes que você o desejasse, ele já havia sido meu, e prometeu se casar comigo antes de beber a poção mágica. Siegfried e eu uma só pessoa somos e na eternidade seremos, pois logo estaremos juntos!”, disse Brunhilde a Gudrun. Ante as palavras da antiga rainha da Islândia, Gudrun abandona suas pretensões sobre o anel e ao próprio morto, dando-se conta que mesmo sendo sua esposa de fato não passou de uma mera “concubina” de Siegfried e que o amor entre os dois só foi possível por causa da poção mágica de sua mãe. Em outras palavras, que não passou de uma estranha no ninho. Segue-se uma disputa pelo anel entre Hagen e Brunhilde. Após uma feroz luta, Hagen é vencido e o anel fica em posse de Brunhilde.

No fim das contas a rainha da Islândia se arrependeu de ter articulado a conspiração que levou a morte de seu amado. Ou seja, seu coração falou mais alto, e ante o peso de sua consciência resolveu se suicidar cravando um punhal em seu próprio coração. Mas antes de morrer, ela fez um desejo, falando do fundo do coração: que queria um dia renascer livre de toda a culpa do que ocorreu, poder reencontrar-se com Siegfried e assim poderem enfim ficar juntos. “Até breve, amado Siegfried!”, disse Brunhilde pouco antes de morrer, que também jogou o anel nas águas do Rio Reno. Ao final da tragédia os dois amantes mortos foram enterrados em uma grande pira funerária que foi jogada sobre as águas do rio Reno. E meses após a tragédia o reino burgúndio foi destruído e arrasado pelos hunos. Os mesmos hunos que tantos problemas causaram à China durante o período da Dinastia Han (206 a.C. – 221 d.C.), que expulsaram os ostrogodos das atuais Ucrânia e Moldávia nos anos 370 e que agora batem nas portas de Roma e de Constantinopla.

Mas mesmo que Brunhilde e Siegfried tenham deixado este mundo, isso não significou que seus nomes caíram no esquecimento com o passar dos anos. Os dois morreram sem poder consumar o amor que tinham um pelo outro e seus corpos incinerados. Também não deixaram descendência para a posteridade. Mas a lembrança de seus nomes se eternizou com o passar dos séculos por meio de histórias contadas por bardos (cada um a sua maneira), como também se difundiu por grande da Europa, em especial na Germânia e mais ao norte na Escandinávia. Posteriormente, tais histórias receberam versões escritas, a exemplo da Canção dos Nibelungos, a saga de Thidhrek, as Eddas do historiador islandês Snorri Sturluson e a saga dos Volsungs, escritas no século XIII, assim como as óperas do compositor germânico Richard Wagner no século XIX. Além disso, o fogo que consumiu seus corpos não fez o mesmo com seus espíritos, os quais na segunda metade do século XX reencarnaram e assim tornando realidade os dois primeiros desejos de Brunhilde.


NOTA:

[1] Leia-se “Tronie”. No alemão, assim como em idiomas como o holandês, o polonês, o húngaro, o servo-croata, os idiomas bálticos e escandinavos, o tcheco, o eslovaco e outros idiomas da Europa centro-oriental, a partícula j tem valor de i.

2 Comentários

  1. E assim, de modo trágico termina a saga de Siegfried e Brunhilde.

    Um amor que tinha tudo pra ser vivido na plenitude.

    Mas , as escolhas erradas mudaram o curso da história.

    Duas lições ficam aqui.


    A arrogância leva à ruína e a ira é inimiga da felicidade.

    Parabéns, Pistoleiro!

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  2. Brilhante episódio mostrando como a arrogância pode destruir um amor!

    Excelente mesmo!

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