Capítulo XI - O caminho ao poder (parte II)
O caso do
rapto das crianças perpetrado por Ahames e seus comparsas teve grande
repercussão em Épsilon, assim como no Planeta Terra o caso das crianças
raptadas por Kaura e seu bando. Mas, tanto na Terra quanto em Épsilon, aqueles
que afirmam que tiveram crianças raptadas pela rainha de Amazo-Giraz muitas
vezes são tratados como loucos que não falam coisa com coisa e querem ter seus
15 minutos de fama. Dessa forma, poucos acreditam nas palavras deles quando
tocam nesse assunto. Algo que, obviamente, incomoda profundamente a Gori e que com
o tempo ajudou a aumentar ainda mais sua insatisfação com o sistema político
epsiloniano.
Atualmente, o
sistema político do Planeta Épsilon consiste de uma república senatorial, em
que há uma bipartição de poderes. De um lado, temos um Presidente que é eleito
a cada cinco anos, podendo se reeleger para um mandato. E de outro, temos um
Senado composto por 250 integrantes. E nessa bipartição de poder o Presidente
da República é uma figura decorativa, que exerce uma função cerimonial e
representativa (similar à da rainha da Inglaterra no nosso mundo), ao passo que
o Primeiro Senador é quem tem a função executiva nas mãos. Dessa forma, ele é o
chefe daquilo que no Planeta Terra se convêm chamar de Poder Executivo.
Para você
entrar na política de Épsilon, até que é fácil você ocupar cargos menores como
Vereador ou Deputado, ainda mais se for do baixo clero. O problema se encontra
quando você ousa subir para posições mais elevadas, como ser Governador de
Província, ou mesmo subir ao alto clero. Para ser Senador, as coisas se
complicam ainda mais: você precisa não apenas ser um homem muito rico, como
também ter importantes relações de compadrio com importantes políticos.
Relações essas que serão de grande ajuda caso queira alçar altos voos na
política de Épsilon.
E qual será a
função de todo esse fechamento do sistema político do Planeta Épsilon? Muito
simples, ajudar na perpetuação do poder e do status quo das elites que governam Épsilon faz alguns séculos.
Entretanto,
todas essas barreiras de forma alguma impediram Gori de alcançar influência e
poder. Pelo contrário. Com o tempo ele foi construindo uma base de apoio ampla
e sólida, conquistando apoio em setores da população insatisfeitos com o
pacifismo vigente em Épsilon. Pode-se dizer inclusive que o incidente
envolvendo a Rainha Ahames, muito embora tenha sido para ele uma horrenda tragédia
a nível pessoal, foi providencial para Gori politicamente falando, já que em
boa parte da população do Planeta são visíveis sinais de descontentamento e
temores de que incidentes como esse voltem a se repetir.
Com tamanha
base de apoio, foi questão de tempo Gori tornar-se um político influente em
Épsilon, dotado de uma força que os velhos senadores de Épsilon já não podem
mais ignorar. E um dos que mais se animaram com os discursos do Doutor Gori foi
um general do exército chamado Karas.
Karas é um
oficial do Exército de Épsilon que desde criança sentiu na própria pele todas
as mazelas da sociedade do Planeta Épsilon. O que obviamente com o tempo foi
deixando-o cada vez mais ressentido e desiludido não só com o sistema vigente
em seu planeta natal, como também com o pacifismo nele vigente. Para piorar
ainda mais a situação, ele é um gorila, um dos grupos mais oprimidos de seu
planeta natal, que para a elite de Épsilon é tido como se fosse a escória de lá
e que comumente vivem nas mais precárias residências do planeta.
E para piorar
ainda mais as coisas para o lado do gorilão, ele como general sente na pele os
efeitos do pacifismo exacerbado vigente em Épsilon: não apenas por conta dos
anos de descaso das autoridades para com as forças armadas, como também a
hostilidade de ativistas pacifistas que o chamam de carrasco, assassino, que é
uma vergonha ser militar e outros adjetivos similares. Não é de surpreender que
os discursos inflamados de Gori o atraiam.
E, de forma
concomitante, a pregação política de Gori já começou a ser notada pelos
senhores da política de Épsilon, assim como pela imprensa do planeta dos
simióides. Não raro, ele é taxado de louco por tais figurões.
Belo dia,
Gori, em mais uma das reuniões com seus partidários, soube de uma reportagem no
qual ele é chamado de louco. O que o deixou nem um pouco feliz. “Mas, por que,
por que eles me chamam de louco? E de senhor da morte? Não entendo essa gente.
Eu não quero me tornar o senhor de Épsilon, por poder, ou por maldade. É pelo
bem! Pelo bem de todos os que vivem em Épsilon! E pela glória de nosso Planeta,
que desperdiça inutilmente todo o seu potencial tecnológico em projetos inúteis
que levam a nada! Porque se as coisas continuarem como estão, se um dia Bazoo,
Satan Goss ou Jark nos invadirem, seremos presas fáceis para eles. Isso me
enraivece profundamente!”, diz o doutor Gori, inevitavelmente lembrando-se do
fato de que Ahames matou sua esposa e ainda raptou seus dois gêmeos filhos
(cujo destino é desconhecido para ele).
“Um dia, os
exércitos de Épsilon, armados das armas e dos veículos mais poderosos, levarão
o estandarte de nosso Planeta a todos os quatros do Universo, e ninguém,
ninguém ousará mexer conosco!”, assim conclui o discurso.
Gori também é
questionado por muitos pelo fato de que eles acham que ele está fazendo isso
por uma questão pessoal, e que essa questão pessoal poderá levar Épsilon à
ruína. Mas Gori nega categoricamente tais afirmações. Visto essa conversa que
teve com um jornalista que o interrogou a respeito de seu programa político.
Jornalista: “Mas
Gori, não acha que você está levando muito a sério a tua questão pessoal? Não
acha melhor deixar isso para trás?”.
Gori: “Então
me diga, eu tive a minha esposa morta e meus filhos sequestros pela Ahames.
Quem sabe daqui um tempo não será a vez de você ter a tua esposa morta ou
sequestrada pelo Kaura ou pela bruxa Kilza?”.
O jornalista
em questão não sabe como responder à indagação de Gori.
Gori: “Você vê, isso não é um problema particular que diz apenas a mim. Diz respeito a todos nós, habitantes de todas as partes do Planeta Épsilon. Diz respeito a eu, você, a todos nós para ser mais exato. Na verdade, diz respeito ao destino de nosso Planeta e que futuro queremos legar a nossos filhos e netos. Precisamos abandonar esse pacifismo vigente na nossa sociedade, do contrário, casos como o meu se repetirão mais e mais com o passar do tempo”.
1 Comentários
Momentos de crise extrema e descrença nas autoridades levam a duas possibilidades, uma consequência da outra:
ResponderExcluirRevolta e revolução, somada a perda de representatividade dos governantes, cenário propício para o surgimento de líderes populistas que aparentemente tem ideais nobres mas que, uma vez no poder, cometem erros tão ou mais sérios que os inimigos de outrora.
É o ciclo do poder.
Aparentemente , Gori, até pelos dramas, pessoais, tem razão...
Mas, sabemos que una vez lá, o buraco é mais embaixo.
Essa história é o retrato do que vi nos na Segunda Guerra, na Revolução Francesa e Russa entre outras e até mesmo nos processos de impeachment ocorridos por aqui...
"É preciso que tudo mude para que tudo permaneça como está", diz o ditado...