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SPECTRUM-EX 1- "Gosto Bom"

 


Fala galera!!!

 

Eis que trago até vocês mais uma aventura de Miguel dos Anjos, o “Spectrum-EX”. Para quem não conhece esse personagem é criação minha sendo um tokusatsu brazuca estilo metal-heroe.

 

Sinopse:

 

Miguel dos Anjos tenta corrigir sua vida pessoal, duramente afetada pela sua vida secreta como combatente do Céu na luta contra o inferno. Não há paz para o nosso herói nem mesmo para levar a namorada para um simples jantar, pois uma antiga amiga de escola surge possuída por forças demoníacas levando-o a mais uma batalha.

 

Essa é uma história que se passa logo após os eventos de outra história “Obsessores – A origem de Spectrum-EX”.

 

Boa Leitura!!!

 

 

Gosto Bom...

Por Jeremias Alves Pires

 

Do diário de Caça de Miguel dos Anjos - Spectrum-EX

 

Fazem poucos meses que me tornei um combatente dos anjos na guerra entre céu e inferno. Sou um desses fãs de tokusatsu e anime, assim sendo, me tornar um tipo de super-herói foi a realização de um sonho, quem poderia imaginar que se tornaria um pesadelo… 

 

Meus poderes vem de um anel arcano, que me dá o dom de materializar uma armadura e qualquer arma que minha mente possa criar, além de ampliar meus sentidos espirituais. Posso ver o que ninguém mais pode. Aos meus olhos,nenhuma rua está vazia, os mortos estão por toda a parte, alguns ajudando, outros atormentando. No caso dos atormentadores, obsessores, meu trabalho é quebrar a cara deles. 

 

No começo era tudo muito divertido, até que minha vida como herói bateu de frente com a minha vida como pessoa. Tenho falhado com meus pais, com meus amigos e com a garota que amo. Não consigo explicar meus sumiços, menos ainda os ferimentos, que somem de um dia para o outro. Todos acham que estou louco, às vezes eu mesmo acho.

 

Semana passada, numa tentativa de corrigir as coisas, convidei Miriam, minha namorada, para um jantar no melhor restaurante que pude pagar, um self service na esquina de casa. As coisas iam bem. Miriam, a prova de que um coração, ainda que morto, pode amar uma segunda vez, intenso como não se imaginava mais ser possível, estava linda. O vermelho de seu vestido curto e decotado,misturado a pele marrom provocante que parecia arder em desejo, faziam promessas. Sorria e me olhava no fundo dos olhos, invadindo minha alma, tomando-me somente para ela. Naquela noite, no restaurante barato, sentados perto da janela, de modo que a luz da lua nos banhava, parecia que dias sombrios nunca tinham existido. Falávamos de séries antigas, que gostávamos e por tanto nos uniam.


-
Então… Kamen Rider Black, ou RX? - Miriam me perguntou.

 

- Eita… Difícil escolher… Amo muito as mudanças de forma do RX, que se tornaram referência para outras séries de riders… - Respondi sem conseguir tomar uma decisão.



- Eu também não consigo escolher, mas de uma coisa não tenho dúvidas. Você sempre vai poder contar comigo, Miguel, seja lá o que for que te atormenta… - Miriam segurou minhas mãos ternamente.

 

Como eu queria contar a ela a verdade, mas fazer isso podia trazê-la para o meu mundo, pondo sua vida em risco.  Ela poderia morrer, e perder meu grande amor dessa forma é uma dor que não queria sentir novamente. Tentei dizer alguma coisa, mas a voz não saia.



- Não tenha medo, seja o que for, vamos lutar juntos. Você sabe o quanto eu te amo… - Miriam estava quase me quebrando.



- Socorro…

 

Estávamos tão envoltos na emoção do momento, que não reparamos que uma garota, mal trapilha, esquelética se aproximava de nós. Os cabelos desgrenhados cobriam seu rosto. Imaginei que fosse um espírito vagante, às vezes tenho dificuldades para diferenciar vivos e mortos, mas Miriam também a estava vendo. Estávamos estáticos. Encaramos a garota por alguns segundos, até que pude reconhecê-la.



- Carlinha? - Perguntei à garota.



- Ela não existe mais… - A resposta foi dada com uma voz demoníaca, a garota estava possuída, não haviam dúvidas

 

A garota deu um tipo de urro, como se fosse uma fera, seus cabelos se levantaram, as luzes piscaram. Contorceu-se para trás batendo a cabeça no chão,num movimento totalmente anormal. Atirou-se então pela janela. Andando como uma criatura de quatro patas, sumiu na escuridão da noite. Pretendia persegui-la, mas o susto fez Miriam desmaiar. Foi o fim do jantar romântico…

 

- Miriam despertou nos meus braços. 



- Por favor, gente! Vamos dar espaço pra moça respirar! - Ordenou o dono do restaurante, que veio controlar a situação sinistra.

 

Todos que estavam no local aglomeraram  à nossa volta. Alguns por preocupação,outros por mera curiosidade. Lentamente Miriam abriu os olhos, estava confusa.



- Graças a Deus, a moça acordou! - Disse alguém.



- Miguel? - Miriam olhou em volta, tentando se localizar.



- Calma, meu amor! Foi apenas uma louca… Ela já foi embora.

 

Abracei Miriam com força. Minha alma estava gelada, totalmente em pânico. A mente viajou. Voltei para uma rua escura e abracei novamente um cadáver que ia esfriando aos poucos, enquanto o odor de sangue entrava no meu nariz. Veio o choro descontrolado, o mesmo daquela terrível noite em que o amor da minha vida deixava esse mundo nos meus braços.



- Calma, Mig… Eu estou bem - Miriam me disse carinhosa, livrando-me, como ela sempre faz, das trevas que me consomem dia após dia.

 

Eu estava grato, muito grato. Uma única perda, é tudo que minha alma podia suportar. Não sou mais um garoto ingênuo que acredita que o destino se curva à nossa vontade, a vida muitas vezes nos joga onde não queremos estar, mas se eu realmente pudesse escolher, queria envelhecer ao lado de Miriam. Eu tinha que protegê-la de tudo, até mesmo de mim, da vida cheia de criaturas demoníacas, como a garota possuída que havíamos acabado de encarar.



- Calma… - Miriam disse novamente, pondo a mão no meu peito, sentindo as batidas aceleradas do meu coração, tomado de pânico.

 

Gastamos algum tempo falando com as pessoas em volta, conseguindo nos desvencilhar somente quando todos tiveram certeza de que não fazíamos ideia do que tinha acontecido e que estávamos bem. O jantar acabou ficando por conta da casa. Pude ver o dono esculachando os seguranças do lado de fora antes de ir. O restaurante fica bem perto da casa de Miriam, por isso íamos a pé, como gostavamos de fazer. Normalmente era um caminhar divertido, onde tiramos o máximo proveito da presença um do outro, com conversas alegres, cheias de risadas e declarações de amor feitas por olhares discretos, que terminam em beijos ardentes. Não naquela noite.Segurava a mão de Miriam com força, na esperança de trazer segurança a sua alma, porém podia senti-la tremer, suar frio, enquanto olhava pra cada sombra, como se algo  fosse atacar e fazê-la em pedaços. Resolvi então quebrar o silêncio macabro que se fazia.



- Oxi, Tenha calma… Se a encapetada aparecer eu te protejo… Tiro o cão dela na base do tapa - Brinquei, fazendo-a sorrir.



- Você vai é sumir no mundo, todo cagado… E eu vou atraz… Toda mijada… - Ela respondeu gargalhando alto.

 

Rimos um pouco, afastando a obscuridade do que nos havia acontecido. Abracei Miriam bem forte.



- Eu sempre vou te proteger, meu amor, sempre… - Jurei a ela com tanta sinceridade que todos os seus tremores chegaram ao fim.

 

Nos beijamos e ela me perguntou:



- Miguel, que porra era aquela? Nunca tinha visto algo assim. Parece coisa de filme de terror…



 Era só uma garota doente, não mais que isso… - Respondi tentando lhe trazer conforto. 



- Não… Era mais do que isso… Tinha alguma coisa dentro dela. Espera um pouco… Você a reconheceu, não foi? Quem é ela?



- Não tenho certeza… Mas acho que você também a conhece. Você se lembra da Carlinha da sexta série?



- Carlinha… Carlinha… Não é possível… Aquela bonitona, linda e loira, que tinha uma irmã chata pra Cacete? - Miriam ficou boquiaberta ao se lembrar de Carlinha.



- Acho que era ela. Não chegamos a ter amizade, mas nos dávamos muito bem.



- Eu tinha amizade com ela, quase todo mundo tinha. Ela era muito simpática. Já a irmã dela… Era um nojo… Como pode? Uma garota tão incrível acabar assim?



- Ela tinha brilho demais, isso incomoda os que vivem na escuridão. Os demônios, cheios de inveja, fazem de tudo para destruir os melhores entre nós, gargalhando durante o processo…



- Credo, Miguel… Você acredita nessas coisas?

 

Miriam voltou a se encolher de medo. Só então notei que havia falado demais. Imediatamente tentei corrigir a situação.



- Não, claro que não. É só modo de falar, porém, se existem demônios, anjos também são reais, e eles fariam de tudo pra nos proteger, seria uma verdadeira guerra…

 

Miriam olhou para o céu em total devaneio.



- A guerra eterna entre o bem e o mal, com os humanos no meio… Será que alguma força do céu vai interceder pela coitada da Carlinha?



- Com certeza vai…

 

A conversa não durou muito mais tempo, havíamos chegado a casa dela. Dei-lhe um beijo e parti. Na época estava morando em um quartinho ali perto, sem muitos recursos. Diferente de outros jovens na minha idade, não era pelo sonho de liberdade, minha vida como herói do céu exigia uma certa dose de solidão, que se tornava maior a cada dia. Pensar nisso sempre me entristece e custa várias horas de sono, mas naquela noite eu não podia me afogar em autopiedade. Sentei na cama e comecei a mexer no celular, fuçando as redes sociais em busca de informações sobre Carlinha. Não demorou muito achei o perfil dela, repleto de fotos lindas, Carlinha parecia uma modelo profissional, cheia de seguidores. As fotos eram todas do ano passado, a única publicação recente era uma postagem sobre o desaparecimento de Carlinha, com um número para contato. Adicionei o número e dado o adiantado da hora, resolvi mandar uma mensagem ao invés de ligar. A mãe de Carlinha respondeu quase no mesmo instante. Estava tão ansiosa que ligou antes que eu pudesse digitar alguma coisa.



- Alô… - Ela disse sem conseguir esconder o nervosismo.



- Oi… Dona Roberta?



- Ela mesma, você tem notícias sobre a minha filha?



- Tenho sim. Vi ela hoje em um restaurante… Na verdade ela veio até mim. Não vou mentir, ela estava em péssimo estado…



- Ela machucou alguém? Você está bem?



- Estou sim…



- Graças a Deus, menino… Que bom que você está bem… Você tem sorte. - Dona Roberta começou a chorar.



- Tudo bem com a senhora? - Perguntei ativando meus poderes arcanos, fazendo um tipo de ligação psíquica com Dona Roberta.

 

Na minha mente pude ver uma imagem dela. Uma imagem diferente da que me lembrava. Alguns anos atrás fiz um trabalho de escola com Carlinha e outros amigos. Dona Roberta nos recebeu muito bem. Era tão bonita quanto a filha, gostava de se vestir bem. Vendo as duas juntas pareciam mais irmãs que mãe e filha. A mulher que vi através do elo mental era totalmente diferente. Tinha as feições típicas de alguém que abusa da bebida, parecendo muito mais velha do que era. Estava vestida de qualquer jeito, com a roupa toda amassada e usava uma luva preta na mão direita, o que chamava muito a atenção. Dona Roberta estava acabada.



- Olha só, menino… Fica longe da Carlinha! Se você encontrar com ela de novo, corre pra longe!

 

- A orientação dada por ela me pegou de surpresa. Imaginei encontrar uma mãe desesperada para encontrar a filha, não uma tomada de horror. Antes que a conversa continuasse, alguém tomou o telefone da mão de Roberta, muito agressivamente.



- Quem tá falando? - Quem havia tirado o telefone de Roberta perguntou de modo arrogante.

 

Levei um pouco para responder, a interrupção repentina perturbou um pouco o elo psíquico. Lentamente pude ver a imagem e ler os sentimentos da pessoa com quem falava. Quase não consegui reconhecer. Era Célia, irmã de Carlinha. Ao contrário da mãe, ela estava muito bem. Pele bem tratada, cabelos negros cedosos, parecia estar chegando de uma festa, usava um vestido preto muito curto e maquiagem pesada. As leituras de sua aura quase me fizeram vomitar, ela estava feliz com o sumiço da irmã e não ligava para o sofrimento da mãe. A repulsa me faria perder o elo mental, tratei então de, mesmo falando com Célia, me focar em dona Roberta.



- Você tá surdo? Quem tá falando? - Célia continuou com toda sua grosseria.



- Oi… Desculpa… A ligação está horrível… Não sei se você se lembra de mim… Sou o Miguel, estudamos juntos… - Continuei educadamente.



- Peraí… Miguel, aquele baianinho? Lembro de você sim… Você quer ajuda para voltar à sua terra? Compro a passagem só de ida e ainda faço as suas malas…



- Vi sua irmã hoje, só liguei para avisar…



- Já está avisado… Boa noite… Cuida da sua vida e vá a merda, com rapadura e tudo…

 

Célia bateu o telefone na minha cara. Fiquei puto, mas não podia me deixar levar pela raiva, não podia perder o elo psíquico com Roberta. Me concentrei ainda mais. Acabei me projetando astralmente até aquela casa. Foi uma viagem horrível. A casa estava impregnada de energias negativas, formadas pelo sofrimento de Roberta e a inveja de Célia. As duas estavam tendo uma briga muito feia.



- Sua grossa!!! Você não tinha que tratar o rapaz daquele jeito - Gritava Roberta.



- Ah… Você vai pesar na minha por causa de um baianinho de merda? Era só o que faltava…



- Ele viu sua irmã na rua…



- E tomara que tenha sido bem longe daqui, ou você quer que ela volte pra casa? Gosto bom…

 

Roberta começou a tremer, tomada por uma onda de horror.

 

- Foi o que eu pensei… Boa noite… Melhor trancar a porta do quarto… - Célia quase começou a rir da cara de medo da mãe.

 

Que terrível seria para algumas pessoas ver a própria imagem no mundo espiritual. Célia, tão linda, tão sexy, tinha a fisionomia de um réptil e sua aura exalava um mal cheiro insuportável de podridão, de modo que eu não conseguia olhar e nem chegar perto dela, sem ficar enjoado. Foi um alívio quando ela saiu da sala, deixando para trás a mãe, uma criatura desolada e apavorada.

 

- Apavorada? De que ela estava com tanto medo? O quê queria dizer aquele negócio de "gosto bom", que a deixou tão perturbada? Eu precisava saber pra poder ajudar aquela pobre alma, pra isso, eu tinha que fazer uma leitura aprofundada ou da mente de Roberta, ou de Célia. Claro que minha escolha foi Roberta. Me aproximei dela, fazendo uma prece e transmitindo-lhe energias positivas que foram deixando-a tranquila, até que ela pegou no sono. Um filme da vida de Roberta começou a passar diante dos meus olhos, revelando como a vida dela havia chegado naquele ponto 

 

Roberta havia chegado tarde do trabalho. Nada parecia fora do normal, no entanto havia algo pesado no ar, que apertava seu peito. Era o seu lar, a casa que havia comprado com muito esforço, dobrado depois da morte do marido, mas naquela noite um tipo diferente de escuridão, que não mais partiria, tinha tomado conta de tudo. Daquela noite em diante, olhos malignos observavam de cada sombra. Roberta riu de si mesma. "Uma mulher adulta, com medo do escuro?", reprovou o próprio comportamento, ainda assim teve que ligar a luz da sala pra poder desacelerar as batidas do coração, e olhar em cada canto, pra ter certeza que ninguém a estava espiando.



- Roberta, você está ficando louca! - Recriminou a si mais uma vez.

 

Um calafrio percorreu sua espinha, ao mesmo tempo em que teve uma impressão muito forte de ouvir uma gargalhada macabra. A essa altura, já estava totalmente horrorizada. Ia subir as escadas pra ver se as filhas estavam bem em seus quartos, quando um barulho de coisas sendo jogadas no chão vindo da cozinha chamou sua atenção. Foi logo ver, achando que se depararia com algum rato ou algo tipo. A respiração parou quando deu de cara com a própria filha, Carlinha, fuçando na lata de lixo, como se fosse um animal faminto. Ascendeu a luz e constatou a bagunça do ambiente. Geladeira e prateleiras estavam abertas, pratos e alimentos jogados por toda parte.



- Carlinha… Filha… - Roberta chamou, ainda se esforçando para entender o que estava acontecendo.

 

Carlinha levantou, tirando a cara da lata de lixo e olhou para mãe. Olhos anormalmente negros, confusos selvagens.



- Filha, o que você tem?

 

Ternamente Roberta abraçou a filha, como quem queria curá-la do que quer que a tinha dominado o juízo.



- ARGH!!! - Roberta gritou.

 

Carlinha havia abocanhando o ombro da mãe. Começou uma feroz luta de Roberta para fazer a filha soltar seu ombro esquerdo.



- Solta!!! Socorro!!! - Roberta gritava, enquanto rolava no chão com a filha, seu sangue espirrava por toda parte.

 

No impulso para se defender, Roberta acertou a cabeça da filha com um pote de vidro que a mão alcançou por acaso. Só então a garota fera a soltou. Um corte na testa misturava o sangue da enlouquecida, com sangue da própria mãe, formando o rosto de um demônio.



- Gosto bom… Gosto bom… HAHAHA! - O demônio gargalhou e lambeu os lábios, como se tivesse provado a mais saborosa iguaria.

 

Mais um ataque foi feito. Roberta levantou os braços para se defender e teve o dedo mindinho da mão direita decepado por uma dentada.



- Gosto bom!!! Gosto bom!!! - Demônio Gritava de prazer.

 

Antes que algo mais pudesse acontecer, Célia acertou a irmã enlouquecida com uma vassoura.



- Fora daqui! - Célia berrou.

 

Carlinha sumiu na escuridão da noite.

 

Não consegui mais manter o elo psíquico e voltei para o meu próprio quarto. Estava mal. Suado. Coração acelerado. Demorei uns minutos para me recompor. Tive uma crise de choro. Os sentimentos de Roberta estavam na minha alma e me machucavam. Aquele sofrimento ia acabar, jurei que ia. Sendo quem sou, tendo os poderes que tenho, como poderia deixar de ajudar? Se eu deixasse aquilo de lado, como poderia me olhar no espelho? Me acalmei pra poder pensar no que fazer. Tinha que caçar Carlinha, e seria naquela noite...



- Socorro!!! Você tem que ajudar!

 

Do nada surgiu um fantasma no meu quarto. Confesso que levei um baita susto. Tratava-se de um homem de uns quarenta anos.



- Oxi.. Vai assustar o cão.. Peste!!!



- Você tem que fazer alguma coisa…



- Quem é você?



- Sou o pai da Carlinha… Ela não consegue mais controlar a entidade. Logo ela vai chegar em casa e matar a Roberta.



- Valha-me Deus…

 

Não podia perder tempo, imediatamente ativei o poder do anel.



- Transformação!!!

 

Em uma fração de segundos, vesti minha armadura e passei pra dimensão fantasma. Restava bolar uma forma de chegar rapidamente até Roberta. Fiquei meio desesperado, não tinha ideia do que fazer. Um calendário do Jaspion na parede chamou minha atenção. Ele estava em sua "Alan Moto Space". Era a resposta que eu precisava. Comecei a imaginar minha própria super-moto, detalhe por detalhe. Fiquei empolgado e gritei o nome da minha criação.



- Moto-Spectrum!!!

 

Atendendo ao meu desejo a pedra dos anjos fez surgir de dentro de um redemoinho de luz um tipo de moto-foguete.  Mais tarde eu iria desenhá-la, marcando definitivamente sua imagem na minha mente.  Sou obrigado a admitir, gosto demais dos meus poderes. Admirei a "Moto-Spectrum" por um instante, montei e levantei voo. Como estava no meu "Modo Fantasma", passei através das paredes. Não levou nem cinco minutos, estava no portão de Roberta.

 

Mal desci da minha moto muito da hora, ouvi um grito de dentro da casa.



- Fora, sua louca!!!

 

Era a Célia, segurando uma faca, protegendo a mãe, escondida atrás dela. Estavam na sala. A possuída ria e gritava.



- Gosto bom! Gosto bom!

 

Eu havia chegado a tempo de impedir uma tragédia. Passei para o plano material, me transformei em uma bola de luz, lançando-me a seguir como uma bala de canhão, uma técnica que aprendi com o Jaspion. A possuída levou um choque, já Célia e Roberta foram envolvidas pela luz da esfera, dentro da qual as levei para fora casa, onde ficariam seguras. Ainda no formato de bola de luz, voltei ao local de combate, desfazendo enfim a forma de esfera encaixando uma voadora na fuça da possuída, que caiu longe. Estava me sentindo o máximo.



- Deixa eu me apresentar… Eu sou Spectrum-EX e vou banir você desse mundo… - Digo a criatura do inferno, fazendo pose de herói.

 

A resposta foi um rosnado. Saímos na porrada. A entidade maligna que possuiu Carlinha era do tipo “fera”, sendo muito forte e selvagem.A cada golpe que recebia era lançado contra as paredes que se rachavam. Eu me levantava e revidava com socos e chutes que liberavam descargas elétricas. 

 

Existem muitas formas de exorcismo. O meu consiste em enfraquecer o espírito maligno através do combate. Por mais forte que a criatura fosse, era uma briga de carne contra metal, a vantagem era minha. Assim eu pensava. Inexperiente tinha esquecido que fantasmas e demônios possuem poderes telecinéticos, poderes que ficam mais fortes quando eles estão prestes a perder, como um último recurso. Fui atingido por um tipo de rajada de onda de impacto, indo parar no meio da rua, atravessando uma parede e o portão. Antes mesmo de me levantar, fui atingido por outra rajada, indo parar dentro de um salão comercial, em frente a casa de Roberta, mais uma vez arrebentando tudo que estava no caminho. Tinha sido atingido duas vezes, três seria burrice até pra mim, seguindo apenas meus instintos, pulei para o lado, desviando de mais uma rajada, e depois de outra. Notei que estava em uma sala cheia de computadores, provavelmente a “sala do telemarketing”, ou algo do tipo. Devido ao horário, não havia ninguém no prédio. A endemoniada foi entrando disparando mais rajadas, dessa vez sem sucesso, vitimando apenas as mesas e os computadores. Estava na hora de virar o jogo novamente a meu favor.



- Spectrum Sword-Pistols! 

 

Atendendo a minha imaginação, surgem nas minhas mãos mais uma criação inspirada nos meus heróis, uma pistola laser com sabre de luz embutido, ideal para lutas tanto a distância, quanto corpo a corpo. Desvio de mais uma rajada destruidora, mas dessa vez eu revido com diversos disparos de pistola laser, sem errar nenhum. A energia da endemoniada chega ao estado crítico. Chega a hora do golpe final.



- Spectrum Final Justice!

 

Aplico dois golpes com os sabres de luz, um vertical e um horizontal. Um furacão telecinético se faz, destruindo ainda mais o escritório onde vim parar. Carlinha expele um tipo de fumaça negra. Ela está livre e os ferimentos do combate se vão com a entidade demoníaca.



- Acabou, você vai ficar bem! - Digo a Carlinha, que parece demorar um pouco para entender o que estava acontecendo.



- Filha… - Roberta vem correndo abraçar Carlinha, estava observando o combate de longe.



- Mãe… - As duas se abraçam e choram de alegria.

 

Fico olhando as duas muito feliz. Esse é o melhor lado do meu trabalho. Mas ainda não havia acabado.



- O que você pensa que fez, seu idiota!!! - Celinha chega gritando comigo.



- Acabo de salvar sua irmã, qual é o problema? - Fico indignado.



- Não era pra você fazer isso… Ela tinha que morrer hoje… Esse era o acordo…



- Que conversa é essa? Você enlouqueceu? - Perguntou Roberta, assim como eu tentando entender o que estava acontecendo.



- Você também é muito idiota! Fui eu…

 

- Como assim foi você? - Prevendo o pior, me ponho na frente de Carlinha e Roberta, que se encolhem de medo.



- Eu sempre fui a rejeitada, a menos interessante, a menos bonita. Eu não aguentava mais. Foi então que a escuridão falou comigo e eu… Eu… Invoquei o demônio pra tirar essa desgraçada do meu caminho…  



- Você não tem ideia da bobagem que fez… - Digo a Célia. 

 

Ouço o som de viaturas, a polícia está chegando, Célia olha para trás pela última vez como humana.



- Acabou… Vou pagar minha dívida, mas vou levar todo mundo comigo!!!



- Filha!!! - Roberta tenta ir em direção a Célia, mas eu não deixo.

 

A pele de Célia começa a se rasgar. “De dentro dela”, nasce um demônio de dois metros e meio. Pele negra, musculoso, olhos vermelhos. A faca se torna uma espada. Célia não existe mais.



- Vocês duas, corram!!! - Digo a Roberta e a Carlinha.

 

Assumo mais uma vez a forma de bola de luz. Acerto o monstro no meio do peito empurrando o mais longe possível. Acabamos voltando para rua, onde várias viaturas nos esperam. Recebo um golpe da espada muito forte, que quase quebra minha armadura. O impulso me joga em uma das viaturas e perco a consciência por alguns segundos.



- Que porra é essa!!!



- Atira nele, caralho!!!

 

O grito dos policiais me desperta. O demônio gargalha. Armas mortais não podem feri-lo. Só armas arcanas funcionam. Antes que o demônio machuque alguém, começo a disparar minhas armas laser, mirando a cara, só pra irritar. Preciso que ele se concentre em mim. Eu uso uma armadura, os outros não.



- Todo mundo longe dele!!! - Grito aos policiais.

 

Meus raios fazem queimaduras no rosto do demônio, que fica furioso e vem pra cima de mim, contudo. Não sei dizer qual, mas um dos policiais grita “Deixa o maluco de armadura cuidar disso”. Os tiros pararam, não sei se ficaram sem munição, ou se eles apenas foram prudentes. Pra minha sorte, o grandalhão é lento, o que é péssimo para uma luta de espadas. Consigo me esquivar dos golpes que ele desfere e contra atacar com os sabres de luz. Carros, o chão, um poste, são destruídos pela espada do demônio, mas ele ainda não me acerta. O problema é que por baixo da armadura eu sou um simples humano, mesmo tendo acertado diversos golpes, que fazem o bichão sangrar pra caramba, ele não cai. Fico cansado e acabo vacilando. Sou atingindo em cheio no rosto. Quando caio no chão, começo a ser massacrado. O demônio descarrega sua raiva em mim. Começo a sentir que a armadura vai quebrar. Estou prestes a morrer. Procuro me acalmar e tentar pensar. Como meus heróis sairiam dessa? Como? A moto… Preciso da moto. Mando um sinal mental e a moto atinge o demônio a toda velocidade, como se fosse um míssil, arrastando-o por alguns metros. Na série Bicrosser, os heróis transformavam  a moto em uma bazuca, eis a chave da minha vitória. Desfaço minhas Sword-Pistols e conjuro uma nova arma.



- Spectrum Hyper-Cannon!!!

 

Atendendo a meu comando, a Moto-Spectrum se encaixa no meu ombro direito e se transforma em um poderoso canhão laser. O demônio está ferido demais para se esquivar. Há uma grande explosão e no meio de um tipo de lama negra vejo Célia, totalmente nua. 



- Por favor, me ajuda!!! - Célia está em pânico.

 

Da lama surgem mãos de monstro que a puxam para o submundo, antes que eu possa fazer algo por ela.

 

Atrás de mim os polícias estão todos bem, Roberta e a filha estão abraçadas. Elas não podem ver, mas o finado marido de Roberta está ao lado delas, claramente ele é o guardião da família. Ele está muito triste e chora, assim como Roberta. Volto a dimensão fantasma para que ninguém mais me veja e poder ir pra casa. Estou feliz por um lado e péssimo por outro, queria ter salvo a Célia, mas no final ela foi vítima da própria inveja...

 

FIM!!!

5 Comentários

  1. Muito boa a história!
    Eu adoro a forma como você narra os acontecimentos, sem exageros de descrição, nem deuxando-os de lado, ajudabso a leitura ser mais ágil e nem um pouco cansativa! Meus parabéns.
    Sua construção de personagens tbm é excelente, Miguel e Miriam são extremamente tridimensionais, ajudando a se identificar e a se importar com eles.
    Toda a família da Roberta, a possuída, ficou também muito bem trabalhada, bem como esse final impactante com o triste destino da Célia.
    Destaco também os detalhes do Miguel que, a todo momento deixa claro o quanto os tokusatsus influenciam em suas ações e criações.
    Enfim, um conto muito, mas muito bom desse ler.
    Meus parabéns!

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  2. Excelente,Jeremias !

    Um conceito bem bacana de herói com poderes arcanos de acordo com a própria vontade.

    Se bem usado ,pide tornar Spectrum EX invencível.

    A narrativa em primeira pessoa ficou bem narrada.

    Parabéns !

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  3. Gostei muito Jeremias, achei em primeiro lugar uma excelente e bem trabalhada história de terror, daquelas que a gente fica sempre tenso com o que vem pela frente, já ganhou aí, pela trama, pelo suspense, pelo sobrenatural embutido na coisa além das tramas maquiavélicas de família que a gente sempre se impressiona no resultado final! Ainda temos a cena final com a Célia pedindo socorro mas estando impossibilitada de ser salva, sendo consumida, sabe-se lá por o que, o que foi outro momento incrível do episódio! Eu confesso que de início, achei a colocação do tokusatsu no meio, um tanto estranho, mas depois, confabulando com amigos, eu percebi que, da mesma forma que a gente homenageia o tokusatsu com nossas sagas, tu escreveu um roteiro que foge dos padrões tokusatsu, mas homenageou o estilo com as inspirações para fazer seus artefatos de energia, tal qual os Lanternas Verdes se inspiram em coisas que eles curtem pra materializar seus objetos de energia, então, à partir desse ponto, eu reconheci a genialidade da ideia e passei a achar uma das grandes sacadas do episódio com toda a certeza! Também o personagem principal, eu achei que seria alguém mais taciturno, mas tu soube construir um herói bastante versátil, porque tipo ele usa energia pura, sagrada, angelical, mas tem atitudes, palavras e ações que fogem da imagem que se faz de alguém que usa esse tipo de dom, tu imagina um santo andando pelas ruas, mas ele é um humano, com todos os nossos estilos, fazendo isso em nome do bem! Cara, sem palavras, ficou muito bom, muito bom mesmo, meus sinceros parabéns pelo trabalho cara! \0/

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