Capítulo III - As várias faces de um ser maligno.
A morte de
Flavius não significou o fim da linha para a alma de Bison. Pelo contrário, ela
ainda possuiria muitos outros corpos ao longo da história, como veremos abaixo.
Depois de
Flavius, ela teve como hospedeiro um poderoso feiticeiro da atual Indonésia. Um
homem que entrou para a história como Arman Radžaputi.
Tal homem
viveu na ilha de Java entre o fim do século V e a metade do século VI, e depois
de morrer tornou-se uma lenda. Ele tinha conexões com importantes senhores
tribais das regiões centrais da ilha, e de tempos em tempos estes recorriam à
ajuda dele, para diversas funções. Cura (geralmente espiritual) de algum
familiar doente, proteção de colheitas contra pragas e ataques de animais de
grande porte como elefantes e rinocerontes, entre outras coisas.
Mas o que
eles não sabiam é que ele também era um lincantropo. Dessa forma, poderia se
transformar em diversos animais, desde elefantes, cavalos e búfalos até tigres
e leopardos. Mas o animal no qual ele mais se transformava era em um tigre.
Era esse
licantropo que, se passando por um tigre devorador de pessoas, causou grande
morticínio por onde passava. Um morticínio tão grande que fazia com que as
pessoas sentissem um pavor muito grande só de ouvir falar a respeito do tigre
em questão, como também evitassem as regiões de acesso mais difícil de Java,
situadas próximas a florestas densas e montanhas.
Certa vez,
requisitaram a ajuda dele para poder apanhar o tigre e nele aplicar a devida
lição. E ele atendeu ao pedido. Ajudou a armar uma armadilha e a abençoou com
seu poder espiritual. Um tigre chegou a ser pego pela armadilha, mas o tigre em
questão não era o procurado. E, para piorar ainda mais a situação, foi questão
de tempo novos casos envolvendo o tigre em questão aparecerem, cada vez mais
mortais. Outras armadilhas também foram montadas, algumas delas contendo carne
envenenada, que igualmente revelaram-se inúteis. Pelo visto, para os habitantes
da ilha, eles estão diante de um tigre esperto demais, capaz de evitar até
mesmo armadilhas.
E depois de
tanto espalhar e causar terror entre os habitantes de Java se passando por um
tigre, Arman Radžaputi decidiu que chegou a hora de dar um passo ainda maior e
bem mais ousado e macabro, no ano de 535: ir à ilha de Krakatoa e atiçar uma
terrível explosão vulcânica por meio de seu poder mágico das trevas.
De longe, ele
sentiu que era questão de tempo uma grande explosão vulcânica ocorrer em
Krakatoa. E que essa explosão não seria uma explosão qualquer. Seria uma
explosão de grande magnitude, que despejaria na atmosfera milhares de quilos de
fuligem e gases como enxofre e dióxido de carbono, além de muita lava.
Ao chegar ao
vulcão da ilha de Krakatoa, inativo desde 416, ele fez uma espécie de ritual de
invocação. Proferiu uma série de mantras. E, por meio de seu poder mágico fez
com que o vulcão enfim explodisse. Não apenas explodisse como também
potencializasse ainda mais a explosão.
E enquanto o
vulcão explodia a imagem dele aparecia sobre os céus, rindo diabolicamente. Em
outras palavras, ele foi a força por trás dos eventos climáticos que afetaram o
hemisfério norte entre 535 e 537. Na mesma época, também houve explosões
vulcânicas de grande escala na Islândia.
Os efeitos da
vilania dele foram sentidos em várias partes do globo à época, até mesmo em
locais dali muito distantes como a Europa, a China e a Pérsia. O historiador
bizantino Procópio de Cesareia (c. 500 – 565) registrou que em 536 o sol emitiu
uma luz sem brilho e com raios que não eram claros. Dois anos depois, o
escritor e estadista romano Cassiodoro (c. 490 – 581), afirmou que a luz do sol
era fraca e que as colheitas haviam falhado. No século XII, o patriarca da
Igreja Ortodoxa Siríaca Miguel o Sírio (1126 – 1199) registrou que à época que
o sol brilhou fraco por um ano e meio.
A situação
foi tão feia, mas tão feia que colheitas em várias partes do globo falharam. No
que gerou muita fome e morticínio. Também foram relatadas várias anomalias
climáticas, tais como baixas temperaturas e neve até mesmo no verão (chegou a
cair neve na China em agosto, em pleno verão), seca no Peru, uma névoa densa e
seca no Oriente Médio, China e Europa, entre outras coisas. Acredita-se também
que na mesma época, por conta de uma seca, a cidade de Teotihuacán, no México
central, entrou em decadência. E tudo isso por conta de uma vilania cometida
por uma encarnação anterior do líder supremo da Shadaloo.
Depois dos
dramáticos eventos climáticos dos anos 530, a alma de Bison voltou a aparecer
um bom tempo depois, entre o fim do século VIII e o começo do século IX. Em
789, a costa inglesa foi atacada por piratas vindos da distante Escandinávia,
os chamados vikings. Eles atacaram o assentamento de Portland em Dorset, e
quatro anos mais tarde, em 793, voltaram novamente a atacar a costa britânica,
dessa vez tendo como alvo o monastério de Lindsfarne. Segundo a história, estes
eventos deram início à chamada Era Viking (789 – 1066). O líder desses ataques
foi um viking chamado Harald Ingvarsen, também conhecido como o Chapéu Marrom
(Brown Hat, em inglês).
E, de forma
ironicamente, uma encarnação pregressa do senhor da Shadaloo também esteve
presente no episódio que marcou o ocaso da Era Viking, a batalha de Hastings,
ocorrida em 1066. Antes de Guilherme o conquistador enfrentar o rei anglo-saxão
Harold Godwinson, ele teve um enfrentamento com um tirânico senhor feudal do
sul da Inglaterra chamado. Que por sua vez foi rapidamente vencido e morto
pelos invasores vindos do sul. Essa batalha terminou com a vitória do soberano
normando, Guilherme o conquistador, que dali em diante estabeleceu sua dinastia
na Inglaterra.
Entre essas
duas encarnações, houve ainda uma encarnação dos tempos do Japão feudal, mais
precisamente Masakado do clã Taira (c. 900 – 940). Um samurai que viveu no
Japão do período Heian (794 – 1185) que se notabilizou por sua revolta contra o
poder estabelecido em Kyoto. Em 940 ele foi vencido em batalha e morto
decapitado.
A cabeça
decepada de Masakado foi levada a Kyoto para exibição pública. Mas algo
extraordinário ocorreu: a cabeça voou pelos céus e retornou para a região de
Kanto (onde hoje se encontra Tóquio), em uma busca pelo resto do corpo. Mas
nunca o encontrou, e hoje se encontra em um lugar chamado Kubizuka. Desde
então, Masakado se tornou uma lenda no leste do Japão, e maldições associadas a
ele e sua cabeça surgiram desde então.
Um terrível
pirata sarraceno que viveu no norte da África durante o século IX e que
participou de terríveis ataques às costas italiana e francesa também serviu de
hospedeiro para a alma de Bison. Seu nome Musa ibn al-Malik.
Avançando um
pouco mais na história, como não poderia deixar de ser, ela volta a aparecer no
século XIII, durante as invasões mongóis sobre a Eurásia. Uma marcha
conquistadora colossal, cujas hordas deixaram um rastro de destruição que se
alargou desde as proximidades de Novgorod no norte da Rússia até a ilha de Java
na Indonésia e das proximidades de Viena e Veneza até o Japão. Há quem acredite
que tanto Čingis Khan (c. 1162 – 1227) quanto Tamerlão (1336 – 1406) tenham
sido hospedeiros da alma de Bison em vida.
No século
XIV, vemos essa mesma figura por trás da Peste Negra, a grande pandemia que
varreu a Eurásia à época, trazendo um morticínio que se alastrou desde a
Islândia até a China. Um homem chamado, de forma sorrateira, espalhou ratos e
outros roedores pelas caravanas que atravessavam a Rota da Seda. De lá, foi questão
de tempo uma peste explodir.
Depois disso, piratas e corsários ativos em locais como o Mar do Caribe e o Mar Mediterrâneo, assim como senhores da droga na China, mafiosos italianos e outros também serviram de receptáculo para a alma de Bison.
1 Comentários
ResponderExcluirComeço a pensar que Bison é o Satanás kkkk!