Pessoal, obrigado por aguardarem.
Este capítulo foi um dos que eu mais amei escrever, e um dos que eu mais imergi na história.
Espero que gostem.
4. 15 dias
Saindo do salão de julgamento, as duas encontraram uma multidão, que esperava ansiosa por elas. Tão logo elas foram vistas, uma onda maciça de aplausos pôde ser ouvida de muito, muito longe. As duas enrubesceram quando puderam ver todas aquelas pessoas batendo palmas para elas.
Ao ponto em que elas foram andando, foram encontrando todas as pessoas que elas ajudaram, uma a uma, que fizeram alguns serviços, inclusive alguns a preço de custo. Todos naquele lugar torciam por elas e vibravam com sua vitória.
Lars era levado para a prisão saindo pelos fundos, mas havia pessoas ali para comemorar sua queda, e alguns fizeram questão de jogar ovos podres na viatura em que ele estava, mesmo correndo o risco de serem presos.
A sensação de vingança estava se estendendo, partindo das duas para a cidade inteira. Ninguém ali gostava dele, todos queriam vê-lo cair mas não tinham coragem de começar o que as duas seguiram até o fim, então todos teriam que pagar. E aquilo lentamente se transformaria para algo mais catastrófico.
Arisa e Nanako estavam extremamente felizes, mas também muito cansadas, era hora de elas deixarem o palco daquilo que tinha sido realmente um circo. Aquele tempo que elas tinham passado juntas havia sido uma bênção, e não era só para elas.
Ao voltarem para casa, fizeram o mínimo apenas para dormir e acordar no dia seguinte.
Arisa teve um sonho estranho nessa noite. Ela era levada para outro lugar, um desconhecido, cujas cores predominantes eram tons vermelhos e cinzas, e do outro lado de uma parede de cristal estava o final de seu caminho, barrado por algo místico que ela, por mais que se esforçasse, não conseguia transpor.
As imagens começaram a borrar, e Arisa acordou assustada no meio da madrugada. O berro que a menina deu assustou Nanako que estava em seu quarto, dormindo tranquila.
A jovem Hisami sentou-se na cama – trêmula, suada e com tons de pavor em seu rosto, mas ao dar-se conta de que era um pesadelo, acalmou-se ao menos um pouco. Olhou para os lados, reconheceu o quarto que Nanako tinha montado para ela – uma cama simples, um armário e um criado-mudo.
As paredes eram brancas, sem adornos, sem decorações. E Arisa não tinha alterado nada, afinal de contas, em breve ela sairia daquele lugar e seguiria em frente, não deixando nada para trás naquele mundo.
Mas algo mudou dentro dela. Ela já não tinha mais a urgência de voltar para seu mundo, acostumava-se com a situação, sentia que tinha mais daquele mundo do que tinha de seu mundo natal, onde em um lugar, ela era apenas uma estudante que gostava de tecnologia e mal tinha idade para conseguir trabalhos de meio-período que pagavam mal...
E em outro, ela era necessária, seus projetos alcançavam níveis inimagináveis, ela já era querida e odiada em mesmo nível, já havia conhecido mais pessoas do que havia conhecido em seu mundo natal...
Só havia uma coisa que não havia neste mundo e que havia em sua terra natal...
Seus pais.
Ela sentia muito, mas muito mesmo, a falta deles. Afinal de contas, leitores, estamos falando de uma adolescente que havia sido trazida para aquele mundo contra sua vontade, e por mais que houvesse gostado muito dali, ainda não havia criado asas independentes para voar sozinha.
Enquanto ela ficava sentada à beira de sua cama, Nanako apareceu, assustada, querendo entender o que havia feito com que sua amiga estivesse em tal estado... Porém, o que ela encontrou quando entrou no quarto dela, foi uma menina com um olhar perdido no passado. Antes de entrar, ela bateu na porta.
- Arisa?
- Oi, Nanako. Pode entrar.
- Está tudo bem com você?
- Está sim, desculpe ter te assustado, tive um sonho ruim.
- Não te culpo, hoje o dia foi muito forte, dificilmente escaparíamos sem algum problema. Não sei como eu estava dormindo tão tranquila.
- Acontece que o meu sonho não teve nada a ver com o dia de hoje. Teve a ver com a minha meta, chegar a Shining Future e encontrar a Doutora Orinori.
- Isso você não me contou! O que te faz querer encontrá-la?
- Segundo o que eu soube por alto no dia em que eu fui trazida para cá, foi uma das muitas experiências da Doutora que fez com que eu atravessasse um portal do meu mundo para cá, sem eu querer e sem eu sequer sentir direito. Em um momento, eu estava na rua perto de casa, no outro, já estava aqui, perto do prédio da Guilda.
- Faz até sentido que possa ter sido uma das experiências dela, só ela teria poder o suficiente para fazer com que o tecido do espaço-tempo mudasse. Só que você não tem certeza se foi isso mesmo, não é?
- Sim, não sei. Mas se tem uma pessoa que pode saber é ela, já que a fama de ela ser poderosa, mesmo vinda de você, é enorme.
- Isso é verdade.
- Isso só valida mais ainda a missão que eu tenho, ir para Shining Future e encontrá-la, e mesmo que não tenha sido ela, ela pode saber quem foi.
- É, não tenho contra-argumentos. Mas a viagem para Shining Future é muito longa... Agora eu entendo o tanto que você já andou vindo do lugar do lado da Guilda, e passando por Old Complex, New Pier era a cidade mais óbvia para se chegar depois daquele vilarejo. Infelizmente, por mais que tenha pessoas boas por lá, não tem tecnologia muito avançada.
- Isso é. Mas eu comecei por lá, e foi bom ter começado por lá, afinal de contas, eu comecei pelo lugar que tinha a tecnologia mais próxima do meu mundo, e assim, quando eu cheguei aqui, pude aprender mais e chegar em um nível bom. Mas imagino que eu ainda terei muito o que aprender até chegar em Shining Future.
As duas conversaram por horas a fio, parecia que o sono das duas havia acabado a partir daquele momento, e juntas, assistiram ao sol nascer. Haviam conhecido muito mais uma da outra, e se aproximado mais. Se antes se tratavam como irmãs, agora se tratavam ainda mais como iguais.
Porém, o mês que Arisa tinha estipulado para concluir os reparos em seu novo veículo estava terminando... E era chegada a hora de as duas se despedirem.
No último dia, Nanako se deu conta assim que acordou, e Arisa estava na sacada da casa, olhando o horizonte matutino de New Pier, com o olhar perdido. Ela não queria admitir, mas tinha se afeiçoado ao lugar, às pessoas e principalmente à irmã de coração.
- Hoje é o último dia, não é, Arisa? – Perguntou Nanako já com os olhos úmidos, de tanto chorar antes de se levantar da cama.
- É. Eu não queria que o fim chegasse tão rápido. Mas chegou. Amei todo esse tempo que passei com você, Nanako. Mas eu tenho que ir. Tenho que conseguir voltar para casa, reencontrar meus pais... Mas claro que eu vou ver se consigo trazer eles de volta comigo. Gostei de New Pier, ficou muito melhor depois que aquele homem deixou a cidade.
- Espero que você consiga, de coração, Arisa.
E as duas se abraçaram.
No momento seguinte, Arisa começou a arrumar suas coisas e a colocar na nave. Era hora de partir, de deixar New Pier, ela sentiria falta daquele vento cheio de salinidade do litoral, e pensar que ela nunca tinha ido à praia naquela cidade, mesmo depois de tanto tempo que havia passado por lá.
Não demorou muito para terminar, afinal de contas, ela só tinha as ferramentas que usara na evolução da nave e algumas mudas de roupa. Colocou suas coisas no compartimento de bagagem da nave, virou-se em direção à saída da casa de Nanako, olhou demoradamente para a paisagem e, novamente, para Nanako.
- Um dia eu volto. É uma promessa. – Disse Arisa.
- Não demora muito, tá? – Pediu Nanako com grossas lágrimas em seu rosto.
- Vou fazer o possível. – Prometeu Arisa.
Assim a menina entrou em sua nave e começou a manusear os controles. Já tinha feito alguns testes de voo, e sentiu que com os testes havia aprendido algo de novo...
Quando olhou em sua ficha de aventureira, viu que tinha ganhado uma nova perícia, “pilotagem de aeronaves: iniciante”. Aquilo lhe seria muito útil. Claro que aquilo melhoraria rápido, ela precisaria pilotar para chegar à próxima cidade a caminho de Shining Future.
Depois de consultar o caminho, viu que passaria por mais cinco cidades a caminho de seu destino, e que, segundo o mapa que havia conseguido, havia um impedimento na terceira cidade, uma imensa tempestade de areia.
Aquilo a assustou, parecia muito com seu sonho.
Mas, após afastar os pensamentos ruins da cabeça, viu que a próxima cidade era uma cidade acima das nuvens, Aerial. Seguiu em direção a ela, começando a subir, a sobrevoar New Pier.
Arisa ficou maravilhada com a visão da cidade portuária de cima, carros, motos e aeronaves pequenos como grãos de feijão, o horizonte azul com o sol acima, a salinidade deixada um pouco de lado por causa da altura.
A piloto, empolgada, começou a fazer a nave adquirir velocidade e subir acima das nuvens. Ao passo que a nave entrou nelas, Arisa ficou em suspense para ver como seria acima das nuvens, nunca tinha visto isso em sua vida. Envolta em escuridão, ela foi subindo, e não se importou com a falta de luz. O cockpit era iluminado com os instrumentos brilhantes...
E não demorou muito para que ela saísse das nuvens, em um céu limpo, azul real lindíssimo. A nave espalhou parte das nuvens para o lado assim que as atravessou, e logo seguiu em frente, rumo ao horizonte. Acima das nuvens era possível ver Aerial... Pequena, muito longe. Mas ela ficava mesmo acima das nuvens.
Girando dentro do próprio eixo, Arisa comandou a nave para seguir em frente, aproveitando o vento favorável para seguir para fazer algumas acrobacias. Ela estava adorando a sensação de ser livre, poder voar, e a ferramenta era algo que ela mesma havia construído. Sua felicidade não podia ser medida em palavras.
No momento seguinte, ela viu sua ficha de aventureira brilhar em dourado, e enquanto ela pegava, o brilho iluminou todo o cockpit, mostrando onde antes estava “pilotagem de aeronaves: iniciante” “pilotagem de aeronaves: iniciado”. Ela tinha conseguido ganhar mais experiência ainda.
Ela voava de um lado para outro, encostando a ponta da asa esquerda nas nuvens, gerando um rastro quando reequilibrou a linha de voo, acontecendo a mesma coisa com a ponta da asa direita. Girou mais uma vez em seu próprio eixo e fez um loop na sequência. Voar para ela era tão natural, tão fácil, ela se sentia como um pássaro que havia acabado de aprender a voar.
Fez a aeronave gingar de um lado para outro, e desceu em parafuso, estabilizando o voo e pairando ao lado de algumas aves que voavam despreocupadamente para o norte e que não sentiram perigo por parte daquela aeronave no meio deles.
Arisa circundou por cima e por baixo as aves que voavam junto com ela. Aquele sentimento de liberdade ela não esqueceria jamais. Uma sensação maravilhosa de liberdade com a nave que ela mesma havia construído.
Depois de mais alguns momentos voando, ela viu mais algumas vezes sua ficha de aventureira brilhar, mas não olhou mais. Ela estava tão absorta em seu momento de voo que ela não sabia o quanto tinha evoluído. Quanto mais ela voava, mais fácil ficava para ela voar, e aquilo tinha sido maravilhoso.
Foi também quando ela percebeu que estava chegando próximo à Aerial, a cidade tinha ficado gigantesca. Nã0 havia pilares para sustentá-la, Arisa não fazia ideia do quanto aquela cidade tinha de tecnologia, mas de longe não era fácil manter uma cidade daquele tamanho no ar daquele jeito.
Aos poucos era possível ver que a cidade possuía vários aeroportos pequenos, e alguns grandes, a maioria dos pequenos era para as pessoas que conseguiam chegar ali com suas naves pouco tripuladas. Foi para alguns desses poucos aeroportos que ela foi aterrissando, e quando a pista foi liberada, ela, com a graça de um pássaro, pousou tranquilamente.
Quando finalmente Arisa olhou para sua ficha de aventureira, ela tomou um susto. No lugar do que ela tinha visto antes como “Pilotagem de Aeronaves: Iniciado”, agora ela via “Maestria Aérea”. Não tinha sido à toa que a luz emitida por sua ficha fez com que, por muito tempo, o cockpit brilhou em dourado de tempos em tempos, mas depois parou e ela sequer tinha percebido.
Arisa guardou sua ficha no bolso de sempre e preparou-se para ser abordada pela recepção do aeroporto, como tinha sido abordada pelo policial em New Pier. E isso não tardaria a acontecer.
8 Comentários
Gostei desse capítulo.
ResponderExcluirAo contrário do demais, achei bacana que não houve sensação de pressa e urgência, de que se passaram meses em questão de dias.
Gostei da lembrança dos pais, da despedida da boa amiga que Arisa fez... tudo sem enrolação, mas tbm feita sem pressa...
O pesadelo ajudou a compor tbm um clima bacana para que a personagem decidisse seguir seu rumo de forma mais efetiva e com um objetivo ais claro.
Parabéns!
Obrigado, Norberto. Tuas dicas ajudaram bastante como um todo para o texto.
ExcluirUm capítulo mais detalhado ,ao mesmo tempo que fluído.
ResponderExcluirA despedida de Árida e Nanako tocou lá no fundo do coração .
Mas,Arisa tem um objetivo: chegar a Shining Future.
A questão do pesadelo foi muito bem narrada, dando a certeza que Arisa encontrará muitos percalços em sua jornada, antes de voltar ao seu mundo.
Por fim, a liberdade e a gostosa sensação de voar pelas nuvens.
Curti bastante.
O melhor capítulo até aqui!
Parabéns meu caro Falcão de Fogo!
Eu diria que esse capítulo é do que eu sou capaz de fazer quando estou empolgado e com uma trilha sonora correta.
ExcluirObrigado por ler.
Mais um episódio muito gostoso de se ler, tudo muito bem narrado, tudo muito bem trabalhado, eu consegui me sentir tanto na cidade quanto viajando pelas nuvens e fazendo as manobras feitas pela Arisa! Muito bom o incentivo para ela continuar sua jornada, uma meta bem trabalhada está feita que é descobrir como ela veio parar nesse mundo e como voltar para o seu, tudo a impelindo às novas aventuras que virão! Nesse caso em específico, me senti dentro da Strahl chegando na cidade de Bhujerba, outra cidade das nuvens que me fez brilhar os olhos com as cenas, e eis que transferi isso pra tua narrativa e conseguia ver a cidade da mesma forma! Mandou muito bem cara, parabéns pelo episódio, muito bom mesmo!!
ResponderExcluirObrigado por ter lido, Lanthys. Mas eu meio que me perdi na referência do lugar chamado "Strahl" e da "cidade de Bhujerba", mas fico feliz que tenha curtido. Abraço!!
ExcluirMais um episódio maravilhoso. Uma pegada leve e até dramática e romântica. Você ousou e rompeu nossa bolha Tokusatsu!
ResponderExcluirAmei toda a saga da Arisa e seu rumo ao lar ou ao desconhecido. Vamos ver.
O choro de Nanako foi tocante. Cara, você arrasou!
Meus mais sinceros parabéns!
Fico contente que você tenha curtido o episódio, Artur. De verdade. Obrigado por ter lido. Se você quiser ver (quando você tiver tempo) algo no que eu me baseei, procura pelo anime Kino no Tabi. É muito bom.
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