Fala galera!
Penúltimo episódio de “Vila da Morte”, assim que estiver finalizado vou relançar como um conto inteiro.
Obrigado @todos
O Autor:
Jeremias Alves Pires
Sinopse:
Apesar da escuridão que permeava a vila da morte, um breve momento de paz se fez presente para Reinaldo e Ângela. Em meio à crueldade do ambiente, encontraram um refúgio de felicidade, onde a aceitação mútua e o amor floresceram. Como uma delicada rosa brotando no concreto, sua história de amor desafiou as trevas, mostrando que até mesmo nas almas mais sombrias há espaço para a luz.
No entanto, essa frágil paz foi abalada quando a verdade sobre um acordo sombrio veio à tona, revelando as manipulações de Barra Pesada para manter Reinaldo sob seu controle. Em um confronto brutal, Reinaldo se viu dilacerado não apenas fisicamente, mas emocionalmente, ao descobrir a traição de Ângela, que agiu em nome da sobrevivência. Agora, como o novo líder da vila, Reinaldo é forçado a tomar medidas drásticas, enquanto a pequena luz de esperança se extingue, dando lugar a uma nova era de escuridão.
V - Luzes que se apagam
Há que se entender que desse ponto em diante, pelo breve momento que aquele lugar de pura maldade permitiu, foi possível para Reinaldo e Ângela viver um pouco de felicidade. Aquela felicidade rara que encontramos quando podemos repousar nos ombros de quem nos acolhe sem julgamentos e acolhemos de volta. Talvez, quando somos moldados, mesmo que feitos de dureza e rancor, fica em algum lugar um espaço vazio para que possamos nos encaixar em alguém, muitas vezes, ou quase sempre, tão imperfeito quanto nós mesmos. Qual uma delicada rosa que milagrosamente nasce no concreto, nasceu na vila da morte uma história de amor, provando que pode haver luz na mais sombria das almas.
Reinaldo ficou embriagado com aquele sentimento quente que iluminava sua alma. Nunca tinha sido amado. Sabia que Ângela era louca, quebrada, talvez mais do que ele. Não ligava. Vivia em um barraco simples, com quase nada, somente com o básico para sobreviver. Até aquele momento estava de bom grado, não precisava de muito, mas ficou envergonhado quando Ângela cruzou a porta.
- Essa aqui é nossa casa? Que legal… - Disse a garota pulando sobre um colchão velho jogado no chão - Ali eu vou por um quadro… Ali uma mesa pra jantarmos a luz de velas…
A felicidade da moça contagiou Reinaldo que não disse nada, sorriu e timidamente sentou ao lado dela, como se fosse um menino carente. Olhou para baixo, meio sem jeito, as bochechas avermelhadas, os lábios esboçaram um sorriso doce, quase infantil.
A mente louca de Ângela também se confundiu por um instante ao deitar os olhos sobre aquela criatura tão contraditória. Um ser enorme, forte, muito forte, mas ali, ao lado dela… Era indefeso, prestes a se desmanchar ao toque dela. Até ali tudo em sua vida tinha sido irreal, tinha que ser para sobreviver. Sabia que pra Reinaldo também tinha sido assim. O coração dela queimou pela primeira vez.
- Por hoje, chega de pesadelos… - Disse beijando suavemente a testa de Reinaldo.
Não nos importa o que houve depois disso, pode-se dizer somente que alguém amou e foi amado, nada mais.
Principalmente para Ângela as coisas mudaram. Nada mais de surras e abusos ... Estava feliz por demais, como nunca imaginou que era possível. Amava a noite e dançava todas as manhãs. Tanta alegria se derramou naquele pequeno barraco que virou então ao maior que um palácio.
Do lado de Reinaldo, era inteligente o suficiente para saber que o senhor das trevas do inferno em que vivia devia estar sempre satisfeito, ou perderia a única benção que já havia recebido. Passou a trabalhar ainda com mais vontade, espalhando ainda mais medo. Quando diante de seu mestre se curvava, nunca mais o encarando no fundo dos olhos.
Barra Pesada por sua vez estava contente. Havia afundado ainda mais Reinaldo na escravidão, tornando-o sua fera ainda mais perfeita.
Aquele não era no entanto o lugar onde qualquer tipo de ordem pudesse ser mantida. Ângela começou a acompanhar Reinaldo em suas rondas.
- Tadinho desse aqui, Rei… Ele está doente…
Ângela sentiu pena do homem velho e doente jogado no chão.
- Você… Você é um anjo…
O homem que já não tinha mais uma mente lúcida por conta dos anos abusando de drogas disse com os olhos arregalados.
- Que fofo… Vou dar um jeito de trazer um remedinho pra vc…
Ângela cumpriu a promessa. Levou remédio ao pobre coitado. Reinaldo ficou enciumado, quis matar o velho. Ângela interveio. - Não, meu amor… Afinal, você não é o rei? Um rei não pode existir sem súditos, pode? Não dá pra matar todo mundo. Você por acaso quer ficar sozinho no mundo… Eu nunca vou deixar… Eu juro…
Ângela beijou Reinaldo como quem joga um feitiço, tornando-o serviu e tranquilo.
- Por favor, diga a este coitado que vai ficar tudo bem… - Ângela suplicou.
- Tuudo… Beem… - Reinaldo disse com imensa dificuldade.
- Que voz linda, meu amor. Vamos treiná-la para que não somente eu, mas todos os seus súditos possam ouvi-lá melhor - Ângela levou Reinaldo pelo braço carinhosamente.
Não se pode dizer com certeza quanto tempo passou, na vila da morte o passar das horas era algo que pouco importava, quem lá morava mesmo e esquecer até da própria existência. Reinaldo tornou-se ainda mais forte, Ângela ainda mais bela.
- Não me faça voltar… - O Rei da morte disse ao devedor, que por um segundo achou que teria alguma chance contra a montanha de músculos e crueldade diante, a mão esquerda esmagada seria uma recordação eterna de que o melhor a fazer era obedecer para poder viver.
A frente dos dois Ângela corria nua, com um cesto em mãos da onde tirava as mais belas flores, jogando-as ao ar.
- Sorriam todos, é primavera… - Dizia envolvida completamente em algum tipo de alucinação.
- Viva… É primavera!!! - Uma multidão de outros alucinados, tão ou mais loucos que Ângela gritavam e dançavam.
- Essa aí está cada dia mais doida…- Um tolo proferiu.
O Rei da Morte rapidamente apanhou o infrator e suas mão perversamente treinadas arrancaram os olhos daquele miserável, um após o outro, rapidamente.
A verdade era que Reinaldo também se preocupava com a saúde mental de sua amada, que ficava pior a cada dia. Não houve mais gritaria, todos se ajoelharam em respeito ao Rei.
-Terminem pra mim, façam devagar, bem devagar! - Ordenou o Rei.
Uma multidão se juntou ao redor do homem de olhos arrancados e sua pele começou a ser rasgada. O Rei ficou contente. Olhou para o alto. Viu as estrelas, a posição da Lua. Já era hora de repousar. A escuridão que dominava toda vila por muitas vezes tornava difícil diferenciar dia e noite. - Vamos, Ângela!!!
- Ah… Mas logo agora? Eu também queria despedaçar o moço… Estão todos se divertindo tanto…
- Não! Vamos pra casa agora!
- Ah… Seu chato… Eu queria muito… - Ângela começou a chorar feito criança.
- Amanhã arranjo um só pra você, mas agora está tarde…
- Obaaa!!! Mas sou eu quem vai arrancar os olhos está bem?
- Por mim tudo bem…
Já estavam a uma boa distância de onde como um grupo de zumbis em total frenesi, os súditos de Reinaldo massacravam quem o havia desafiado. Rotina, simples rotina. No caminho encontrou Barra Pesada e a gangue.
- Olha só… As coisas vão bem, não é mesmo? - Barra Pesada encarou Reinaldo. - Boa noite, senhor! - Reinaldo se curvou respeitoso e continuou - Estou terminando minha ronda, mas estou a disposição da sua vontade…
- Que eloquência… Como fala bonito… e está bem vestido, apesar de todo sujo de sangue… Cinco anos atrás grunia e se vestia como um desses miseráveis… E parece que todo te respeita muito… Você e a pirazinha doida… Rei e Rainha, não é mesmo? Será que respeitam mais do que respeitam a mim? Isso não dá pra ser, você não concorda?
Reinaldo se levantou, Barra Pesada emanava uma pura inveja.
- Não precisa se preocupar… Eu sempre fui leal a você…- Reinaldo tentou acalmar o chefe.
- Em você eu acredito… Mas a vadia… Ela é mais esperta que nós dois juntos… Ela tem ambição… Felizmente eu tenho a solução… Pode vir!
Barra Pesada estalou os dedos e uma garota linda e loira, com um vestido e salto vermelhos apareceu de um canto de onde se escondia.
- Boa noite, gostosão! Hoje vou te dar um prazer que essa nojentinha jamais deu…
- Eu vou sangrar essa vagabunda!!! - Ângela tirou uma faca de dentro do cesto de flores, o qual ela jogou longe e se preparou para matar sua recém surgida rival, sendo impedida por Reinaldo, que tentou argumentar com Barra Pesada.
- Agradeço, mas estou bem de mulher…
- Está mesmo? Ela te ama tanto… Por acaso já falou do acordo?
- Qual acordo?
- Reinaldo mudou a expressão do rosto. - Dei essa vaca pra você, pra ela te mandar calmo, resignado. Sob controle… Você acha mesmo que essa biscate insana é capaz de amar… Tudo não passa de um teatro criado por mim pra manter você no cabresto…
Reinaldo deu um passo para trás, perdeu o ar, perdeu a voz, olhou para Ângela implorando que ela negasse.
- Sinto muito… - Ângela somente derramou uma lágrima.
A dor mais excruciante que Reinaldo já sentiu na vida o tomou. Colocou as duas mãos na cabeça e gritou…
- Ninguém se mete… - Barra Pesada ordenou.
Todos entenderam o que estava acontecendo ali. Barra queria mais do que dar uma lição em Reinaldo provar que ela ainda era o maioral por ali. Precisa provar isso para todos e para si mesmo. Os cabelos já estavam começando a branquear. Quanto tempo ia demorar para sua criação perceber e tomar o poder? Não podia arriscar, ainda mais com Ângela ao lado dele.
Foi Reinaldo que acertou o primeiro soco, quem arrancou o primeiro sangue. Barra revidou com três socos e um chute no peito do gigante que foi ao chão.”Eu ainda aguento, eu ainda posso”, pensou Barra Pesada.
Reinaldo levantou rapidamente, babava de tanto ódio. Começou então a troca soco franca entre os brutamontes. Enquanto isso, Ângela se esgueirou até sua rival e a arrastou até um barraco.
- Licença, moço! Vai ser rapidinho - disse ao dono do barraco tão drogado que fez um joinha e riu.
- Me solta, piranha! - A rival protestou.
- Me prometeram um par de olhos e pele pra amanhã, mas eu quero hoje. - Por favor… - A rival implorando já sabendo o porvir.
A faca de ângela começou a trabalhar, enquanto do lado de fora Barra e Reinaldo continuavam a duelar. Barra não era um adversário a ser subestimado e aguentava bem os golpes que recebia, revidando-os com força. Reinaldo, por sua vez, não sentia nada… Apenas o coração despedaçado. A mente estava em uma viagem aos anos felizes que tinha vivido até ali. Ouviu a voz doce de Ângela sussurrando em seu ouvidos, “te amo, grandalhão”. Lembrou do dia em que voltou para sua moradia que antes dela era simples, e encontrou um lar, bem arrumado e limpo. Lembrou da paciência que ela teve para ajudá-lo com seu problema de fala, de quando ela jogou todas as roupas velhas dele fora e lhe deu novas, limpas e belas. Com Ângela ela havia se sentido pela primeira vez na vida uma pessoa, e não somente uma coisa maligna, feita para causar dor aos seus semelhantes. Tudo isso doía. Doía mais que os golpes que seu oponente estava lhe dando. Fizesse o que fizesse, o miserável já o havia ferido na alma da forma mais covarde que se pode ferir alguém.
Barra pesada caiu de joelhos. Rosto desfigurado. Pelo menos duas costelas quebradas.Vários dentes estavam quebrados e haviam cortado o interior da boca. Reinaldo não estava menos ferido, mas estava de pé, encarando seu adversário como se fosse um demônio. Barra Pesada riu.
- Que coisa… Você é mesmo muito foda… Eu também matei meu pai… Acaba logo com isso…
Por um breve segundo Reinaldo exitou.
- Não ouse ter pena de mim… Seu merda!!! - Barra partiu pra cima de Reinaldo.
Sem muita dificuldade, Reinaldo derrubou Barra Pesada. Pisoteou suas pernas quebrando seus ossos, fazendo-o gritar. Barra gargalhava, iria ter o mesmo fim deu ao próprio pai um dia. Reinaldo pisoteou o rosto com um cuidado demoníaco, pra machucar muito e não matar logo. Quando deu o pisão definitivo que espalhou miolos por toda parte, não havia mais o que ser quebrado.
Ângela estava toda suja de sangue e usando o vestido de sua rival, enquanto a esquartejava. Tomou um pequeno susto quando Reinaldo entrou no recinto.
- Só um minuto, meu amor… Você acredita que essa desgraçada morreu rápido, quase não me diverti, acho que infartou.. - Ângela disse a seu amado, golpeando a rival sem vida.
- Por que? - Reinaldo perguntou em dúvida sobre o que iria fazer.
- Por que? Pra sobreviver nesse inferno… No final, eu acabei mesmo gostando de você… eu gosto de você.. Mas você não vai mais acreditar, não é? - Ângela respondeu friamente, arrumando o vestido, ajeitando os cabelos, se preparando para partir.
- Tirem ela da minha frente, tratamento VIP e depois matagal, cova funda… - Reinaldo, agora o novo imperador, ordenou…
E a pequena luz que se acendeu naquele lugar maldito, se apagou para outra coisa nascer…
Continua…
No próximo episódio:
Finalmente as forças sobrenaturais do inferno se manifestam na vila…
2 Comentários
Mais um conto arrebatador de verdades absurdamente jogadas em nossa cara.
ResponderExcluirAqui , você deixou de lado a sua reconhecida veia de terror e lançou uma carga dramática que impacta que lê.
Disputa de poder...
Ego inflado...
Covardia....
O fim de Barra Pesada não poderia ser outro...
Com a ascenção de Reinaldo, dilacerado pela traição de Angela, que só queria sobreviver naquela terra sem lei , temos início a uma nova fase na sombria Vila da Morte, onde quaisquer vestígios de sanidade, se perdeu....
Novamente estou em choque!
Parabéns pela sua grande capacidade. Nós impactar!
Texto primoroso!
Muito obrigado, meu amigo. Fico realmente sem palavras. Meu eu mais conhecido volta com tudo na próxima parte.... kkkk... Cérebro... Cérebro
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