Caçador Escarlate.
Episódio #00.
Chuva de Sangue.
Praia Odaiba, Tóquio, o passado recente.
Um casal de jovens passeava pela areia, curtindo um romântico pôr do sol, enquanto faziam planos, sem saber que, a partir daquele dia, o futuro de todo um país seria transformado em algo terrível.
Um tipo de mancha escura parecia flutuar pelas águas do mar, que iam ficando turbulentas enquanto ela serpenteava em direção da areia, o que chamou a atenção das pessoas que passavam por ali.
O maior erro de suas vidas foi que resolveram se render à curiosidade e começaram a se aproximar, no mesmo instante que, assim que finalmente alcançou a praia, um jorro de matéria escura se lançou aos céus, se expandindo para os lados.
Naquele momento as primeiras testemunhas não faziam ideia de que, horas depois, todo o Japão estaria envolto por uma cortina de escuridão, pois logo uma pessoa veio através dela, parando a poucos metros do grupo de curiosos que agora sentiam-se paralisadas, ao fixar o olhar naqueles estranhos olhos.
Os globos oculares eram negros, enquanto as íris apresentavam um contorno avermelhado e brilhante, a pele extremamente pálida, vestindo apenas restos do que outrora fora uma calça vermelha.
— O senhor está bem?
Goto Shima, um velho pescador, foi o primeiro a se aproximar, estendendo a mão direita em sinal de solidariedade para com o estranho que, após alguns instantes de sincera confusão, sem entender o que estava acontecendo, agarrou com violência a mão que lhe era estendida.
O som de ossos estalando e quebrando ressoou pelo local, assustando e fazendo a maioria as pessoas presentes começar a correr, mas, ainda assim, algumas continuaram ali, quase todas pegando seus celulares para gravar o que estava acontecendo.
O pânico só se espalhou mesmo quando o estranho puxou o senhor Shima para perto e, ao abrir a boca de uma maneira totalmente impossível para humanos, se destacaram entre seus dentes duas imensas presas, que logo foram enterradas no pescoço do pescador.
O estranho passou alguns instantes debruçado sobre sua primeira vítima, cuja carne do corpo parecia ir secando, assumindo uma palidez igual à do monstro e a aparência de uma ameixa seca, antes de ser largado para o lado, ficando com a cara enterrada na areia.
A aparência do homem que viera do mar ia se transformando diante de todos, ficando muito mais musculoso, parecendo mais saudável, apesar de continuar com a pele acinzentada.
— Erga-se e me traga comida…
O velho Shima se levantou de imediato ao ouvir a ordem, cobrindo a distância entre ele e uma moça com apenas um salto, a arrastando para seu mestre.
Só então até mesmo os curiosos que gravavam a tudo, perceberam a gravidade do que estava acontecendo, além do óbvio perigo de permanecer ali, iniciando uma tentativa de fuga desesperada.
Mal sabiam eles que não haveria mais lugar seguro no Japão.
Horas depois do país inteiro estar coberto pela escuridão, o que causou um alvoroço no restante do planeta, enquanto os líderes dos demais países tentavam delinear um plano para lidar com o inexplicável fenômeno, em todos os aparelhos de comunicação do planeta a imagem de um homem pálido, com globos oculares escuros e brilhantes íris vermelhas, surgiu com um ultimato.
“Esse é o único aviso que o restante do planeta Terra receberá.
Escolhi o nome Gaki ao aportar nesse país, cuja posse estou tomando para mim e minha espécie. Nesse momento o Japão está envolto por uma extensa cortina de trevas eternas, que pode ser atravessada normalmente de fora para dentro e vice-versa.
Eu prometo manter meu povo dentro da cortina, mas se algum tipo de ataque vier de fora, então minha resposta será imediata.
Por isso, deixem em paz minha terra e eu deixarei a de vocês livre.
Assim falou Gaki, lorde de Drakul, a Nação vampírica."
O anúncio terminou assim e o mundo nunca mais foi o mesmo.
E o tempo passou, com muitos incidentes de nações que, por sentirem-se ameaçadas, tentaram várias incursões no país que outrora foi o Japão, procurando localizar e derrubar Gaki.
Nenhuma obteve sucesso, com muitas tendo como resultado apenas a devolução das cabeças de cada soldado ou mercenário, que fora enviado até Drakul, com objetivos que variavam em simples observação e obtenção de informação, até tentativas de matar o senhor dos Vampiros.
Um aviso deveras eficaz, diminuindo em muito futuras tentativas de invasão, até praticamente cessarem, por causa do medo de represálias.
Para o povo japonês a situação ficou, obviamente, ainda pior.
E o tempo passou ainda mais rápido.
Bairro de Asakusa, próximo do centro da cidade de Tóquio, dias atuais.
— A gente não devia ter saído de casa Satoshi, tô com medo…
— Eu não aguentava nem mais um dia sem comida Rika.
— Eu sei, mas…
— E eu tava ficando doido com aqueles malditos raspando as portas e as janelas…
— Pelo menos, sem dar permissão prá eles entrarem, a gente ia estar a salvo…
— A salvo e mortos… Do que isso ajudaria?
Rika percebeu que não conseguiria vencer a discussão com o marido, mesmo com eles tendo a sorte de ter conseguido invadir uma casa, a três meses atrás, uma hora a comida e água acabariam totalmente, por isso resolveram sair numa arriscadíssima missão em busca de suprimentos.
O casal conseguiu chegar a um mercado abandonado, mas que, mesmo em meio a prateleiras derrubadas, durante os primeiros dias da invasão vampírica, havia alimentos não perecíveis e alguns galões de água, que eles conseguiram carregar e que os ajudaria a sobreviver mais algum tempo.
Enquanto voltavam para sua atual casa, nem Satoshi nem Rika falavam, em seus íntimos cada um perdido em pensamentos, ele se dava por satisfeito por estar certo, por terem conseguido o que haviam ido buscar, já ela rezava para que, de fato, conseguissem chegar vivos.
Quando faltavam poucos metros para alcançar o portão que lhes traria esperança, uma gota vermelha caiu na mão da garota, que imediatamente largou tudo o que estava segurando, se abaixando até ficar de cócoras, levando os braços acima da cabeça e começando a gritar de forma histérica.
— Mas que mer…
A frase morreu na garganta de Satoshi, uma vez que repentinamente, uma verdadeira chuva de sangue caiu sobre eles, anunciando a chegada daquilo que eles mais temiam.
Um grupo de vampiros.
Aquele era o primeiro sinal que os sobreviventes haviam descoberto de quando um vampiro, sozinho ou em grupo, se preparava para atacar suas vítimas.
Primeiro vinham as gotas de sangue do céu, depois os monstros.
Os poucos que escaparam, na verdade, que foram soltos para que o medo se espalhasse, batizaram aquele bizarro fenômeno como a Chuva Escarlate.
O rapaz mal alcançou sua companheira para abraçá-la e, em instantes, estavam cercados por dezenas de "Rasteiros", como ficaram conhecidos os vampiros que estavam na base da pirâmide social dos novos senhores do país.
Um grupo tão grande dos vampiros mais selvagens significava que, ao menos, um "Mestre" estava por perto e, de fato, logo um casal formado pela mais linda mulher e o mais belo homem, que os humanos já haviam visto na vida, desceram com graça dos céus.
— Não falei minha amada? É só importuná-los por alguns dias e logo o gado sai de seus buracos, caindo nas nossas lindas presas.
— Difícil de acreditar que essa espécie tão limitada dominou o mundo por tantos séculos, mas isso acabou, finalmente.
A vampira então abriu sua boca, muito mais do que poderia um ser humano comum, deixando à mostra dois caninos pontiagudos, agarrando Rika pelo pescoço, depois de afastar Satoshi com um safanão, fazendo com que ele caísse sobre alguns Rasteiros, que o mantiveram contido, apenas podendo observar o que aconteceria com sua esposa.
Antes do casal de vampiros conseguir encostar suas presas na carne da jovem, sons abafados, como estouros de rolhas de champanhe, chegaram até a rua onde se desenrolava aquele momento de horror.
No instante seguinte, as cabeças de vários dos Rastejantes explodiram, com seus corpos se incendiando e se tornando pó antes mesmo de caírem no chão.
— O que é isso?
Para responder seu companheiro, a bela vampira largou sua vítima e se abaixou até o pedaço de algo que parecia metal e que reluzia por causa da fraca luz dos postes, mas logo afastou sua mão, onde era possível perceber a vermelhidão da pele.
— Ai! Balas de prata!
No alto de uma casa, a mais de um quilômetro de distância, um atirador levava a mão direita até um comunicador em seu capacete.
— Alguns já foram Red. Cuida dos Mestres e deixa os cachorros comigo.
Mais alguns Rastejantes encontraram seu fim, fazendo com que o casal de vampiros jogasse Rika na direção de Satoshi, enquanto eles ficavam de costas um para outro, temendo quem poderia estar tão pronto e disposto para enfrentá-los.
— Não pode ser ele, não é?
— E quem mais seria minha querida?
Dizendo isso, o vampiro agarrou sua companheira e a atirou contra um recém-chegado, que apenas ele havia percebido a aproximação e, em meio à decepção e incredulidade, a vampira teve seu tronco atravessado por um punho, o que fez as bordas do buraco aberto incendiarem, com o fogo a se espalhar, conforme a criatura da noite ia se desfazendo numa nuvem de cinzas.
Com um movimento do braço, as cinzas terminaram de ser levadas pelo vento, fazendo com que finalmente Satoshi e Rika vissem quem era seu salvador, cuja identidade acabou sendo confirmada pelo Mestre vampiro.
— Quem mais seria… Senão o odioso Metalder
Red?
Apenas o início.
5 Comentários
Se Metalder , considerado por muitis tokufãs brasileiros como um dos melhores Tokusatsus exibidos no Brasil, já rende grande expectativa, o que dizer de uma boa dose de gore?
ResponderExcluirEssa união deu liga, num primeiro capítulo de tirar o fôlego!
Atacado por uma horda de vampiros sanguinários, o imponentes Japão, que se oegulga de sua capacidade tecnológica de responder às tragédias, sucumbe com relativa facilidade.
Uma ironia...
E o resto das nações se mostra impotente para restaurar as coisas aos padrão até então estabelecido.
Nesse cenário apocalíptico em que os japoneses foram abandonados à própria sorte, eis que surge o Metalder Vermelho.
Mas, será que nosso herói, conseguirá ser páreo paracessa ameaça?
Eis a grande pergunta que, desde já norteia esse novo projeto.
Meus parabéns!
Caçador Escarlate chegou chegando !
Valeu pela leitura e comentário!
ExcluirEu pensei muito em quem iria estrelar essa série e acabei optando pel opersonagem que pouco apareceu aqui no Mindstorm e que, depois de pensar quem seriam as criaturas antagonistas (cheguei a cogitar Zumbis, lobisomens ou múmias) Lembrei de imagens do Metalder todo vermelho e achei que ficaria legal usá-lo dessa forma nesse título.
Eu tbm tentei mostrar que mesmo os japoneses não conseguiriam fazer frente a uma ameaça mística como esses vampiros, mas nos próximos capítulos tentarei ir "desenhando" como foi essa invasão.
Valeu mesmo!
Salve meu amigo, antes de mais nada, parabéns pelo trabalho, Metalder merece! Achei muito legal a forma como a história está sendo narrada, esse tipo de situação, de pessoas suprimidas em esconderijos, sem poderem sair sem se tornarem caça das criaturas que as aprisionam, sem dúvida alguma é muito bem vindo e prende a gente na leitura! A forma como os vampiros também dominaram tudo e se mantiveram senhores daquele local, foi bem poderosa e faz, se colocarmos isso na vida real, com que se tenha bastante receio de mexer com quem está lá dentro! Eu creio que o Gaki aí não é tão fodão assim, apenas intimidou o mundo, senão ele não ficaria caçando só no Japão, mas, posso estar redondamente enganado, vamos ver como tudo continua, ansioso pelo próximo episódio, parabéns uma vez mais meu amigo! \0/
ResponderExcluirNorberto realmente acertou em cheio na criação de Caçador Escarlate. Esse prólogo poderoso mistura terror e ação com uma destreza notável. Bem, vamos pontuar algumas coisas...
ResponderExcluir1. Construção de Atmosfera: Logo nas primeiras linhas, Norberto cria um ambiente de suspense e horror. A escolha de uma "mancha escura" que serpenteia pelo mar em direção à praia é brilhante; isso evoca curiosidade e medo simultaneamente. A sequência crescente de eventos - da curiosidade dos transeuntes ao terror revelado - é feita com uma precisão que prende o leitor e o prepara para o impacto.
2. Desenvolvimento de Personagens: Norberto apresenta os personagens com sutileza, de forma a deixá-los vívidos e conectados ao contexto sombrio. O pescador Goto Shima é o primeiro a interagir com o estranho ser, o que humaniza a narrativa. E a interação entre Satoshi e Rika acrescenta um toque de humanidade ao caos, mostrando que, mesmo em meio a um apocalipse, a luta por sobrevivência e o vínculo entre eles continuam fortes.
3. Técnica de Descrição Visual e Sensorial: A descrição de vampiros com globos oculares negros e íris avermelhadas, ao lado de detalhes como "ossos estalando" e a "chuva escarlate", constrói cenas quase cinematográficas. O uso de palavras como "cortina de trevas" e "presas enormes" mantém o leitor visualmente imerso no horror, criando uma narrativa visceral.
4. Diálogos: Os diálogos entre o casal de sobreviventes e entre os vampiros são dinâmicos e servem para pontuar a narrativa com a tensão necessária. A troca entre os vampiros, destacando a arrogância deles e a frieza com que tratam os humanos como “gado”, adiciona camadas à construção dos antagonistas e deixa claro que essa nova ordem não tem compaixão.
5. Estrutura e Ritmo Narrativo: A história mantém um ritmo consistente que mistura calmaria e ação, prendendo o leitor a cada transição. As pausas para reflexão dos personagens em meio à ação dão fôlego à narrativa e reforçam o impacto das cenas mais intensas.
6. Final Revelador: A introdução do “Metalder Red” no fim do episódio, ao lado da reação dos vampiros, entrega uma revelação poderosa e instiga a continuação, criando uma expectativa para o que está por vir. Essa escolha é habilidosa, pois deixa o leitor sedento pelo próximo capítulo e pelo confronto iminente.
Norberto, Caçador Escarlate é uma obra que redefine o horror sobrenatural com uma profundidade que apenas um mestre no gênero poderia alcançar! Sua escrita é vívida, com uma atmosfera que nos suga para dentro de um Japão mergulhado nas trevas. As descrições de cenários e personagens não só capturam a essência do terror como também elevam a qualidade literária do gênero. Cada palavra é carregada de tensão e expectativa, fazendo o leitor caminhar na linha tênue entre medo e fascínio. A introdução de "Metalder Red" é uma jogada de mestre, uma promessa de batalhas épicas que estão por vir. Grande Norberto, você entregou uma obra de arte do sobrenatural – mal posso esperar para ver até onde essa trama grandiosa nos levará!
Valeu mesmo pela leitura e pela verdadeira análise, ponto a ponto da história.
ExcluirFiquei até sem palavras. Estou extremamente contente e surpreso por um texto tão curto e sem grandes pretenções ter gerado um comentário tão detalhado e preciso.
Você acertou em tudo o que eu queria passar e, puxa, espero que os próximos capítulos consigam ser tão bons quanto esse comentário.
Valeu!