Sinopse:
Penélope, uma jovem humilde, ganha de seu namorado Henrique um celular caro e aparentemente inofensivo. Mas, o presente logo se revela assombrado por uma entidade vingativa, ligada a um passado sombrio de violência e morte. Estranhos acontecimentos começam a atormentá-la, culminando em visões aterradoras e uma verdade horrível envolvendo Henrique e seus amigos. Enquanto tenta sobreviver ao terror crescente, Penélope descobre que o celular guarda os últimos ecos de uma alma em busca de justiça.
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Era uma tarde dourada, onde os raios de sol se entrelaçavam com a brisa suave que dançava entre as folhas das árvores. Penélope, uma jovem de beleza singela e alma sonhadora, se perdia em seus pensamentos enquanto servia mesas no pequeno café da esquina. Seu coração pulsava em ritmo acelerado, aquecido pela presença de Henrique, o rapaz mais bonito do bairro, que desfilava com suas roupas impecáveis e perfume importado, como um rei em seu domínio.
Ele era o desejo de muitas, uma visão quase etérea que flutuava entre as conversas e sorrisos dos frequentadores. Mas, para Penélope, era um sonho distante, um conto de fadas que jamais imaginou viver. Era como se as estrelas houvessem alinhado seus destinos, fazendo com que aquele príncipe encantado olhasse para ela e, mais surpreendente ainda, a escolhesse como sua namorada.
As tardes eram repletas de promessas não ditas e sussurros de felicidade. Penélope, com seus cabelos soltos e sorriso tímido, sentia-se como uma flor silvestre que brotava entre as fendas de um concreto indiferente. Ela mal podia acreditar que, ao seu lado, estava aquele homem que parecia ter saído de um sonho, um sonho que, por muito tempo, acreditara ser impossível.
As mãos dela tremiam ao pensar nos momentos compartilhados. O toque suave de suas mãos, o jeito como Henrique a olhava com um brilho intenso nos olhos, como se ela fosse a única mulher no mundo. E assim, envolta em sua própria fantasia, Penélope não notava o sussurro sinistro que começava a se formar nas sombras, como uma tempestade prestes a eclodir.
Naquele dia, o sol se despedia, tingindo o céu de laranja e púrpura, como um quadro impressionista em constante transformação. A atmosfera vibrava com a expectativa do encontro, e o coração de Penélope pulsava em sintonia com o movimento da cidade. Quando Henrique apareceu à porta do café, uma onda de alegria a invadiu, ofuscando a razão. Ao seu lado, três amigos o acompanhavam, sombras que, embora lhe parecessem estranhas, foram rapidamente esquecidas quando ela se concentrou no sorriso de Henrique.
— Olá, meu amor! — ele disse, seu tom suave como o canto de um pássaro ao amanhecer. — Estava com saudades.
Aquelas palavras, simples, mas carregadas de carinho, foram suficientes para que seu coração explodisse em um misto de felicidade e insegurança. Ela sorriu, seus olhos brilhando como estrelas em uma noite sem lua.
E então, como se a própria realidade quisesse recompensá-la por seus anseios, Henrique estendeu a mão, revelando um presente cuidadosamente embrulhado, um mistério que fez seu coração disparar.
— Para você, Penélope — ele disse, os olhos transbordando de uma ternura que fazia seu peito aquecer.
Ela desembrulhou com mãos trêmulas, e lá estava: um celular novíssimo, reluzente, ainda na embalagem não violada. A modernidade e o luxo se materializavam na palma de sua mão, uma porta aberta para um mundo que sempre lhe pareceu inalcançável.
— É lindo! — exclamou, a admiração inundando seu ser. E, num impulso, ela o puxou para um beijo suave, um gesto que selava a alegria daquele momento.
Mas no fundo, uma pequena voz a advertia: que preço teria esse presente? Que sombras poderiam se esconder na luz daquele objeto reluzente? Penélope não conseguia ver, perdida em sua felicidade, enquanto as risadas dos amigos de Henrique pareciam ecoar como advertências distantes.
A noite caía suavemente, e as estrelas começavam a despontar no céu como joias preciosas, mas a alegria que preenchia o coração de Penélope rapidamente se esvaía à medida que a verdade se revelava. Enquanto os dois caminhavam pela calçada mal iluminada, Henrique segurou a mão dela, mas havia uma sombra de hesitação em seus olhos, um toque de melancolia que perturbou a atmosfera que antes era de pura felicidade.
— Eu preciso te contar uma coisa — ele disse, a voz baixa como um segredo sussurrado. — Amanhã à noite não poderei te ver. Tenho um compromisso com minha família.
As palavras pairaram no ar como uma nuvem pesada, obscurecendo o brilho que antes iluminava seu rosto. Penélope sentiu um vazio crescendo dentro de si, como um eco que reverberava nas paredes de seu coração.
— Mas… — ela hesitou, a tristeza brotando em seu peito. — Eu… Eu queria passar mais tempo com você.
Henrique suspirou, os olhos distantes, como se estivesse lutando contra uma maré de sentimentos. — Eu sei. Mas minha família… eles não têm a melhor opinião sobre pessoas como você. E eu não quero que você passe por isso. Não quero que se sinta mal.
Aquelas palavras eram uma lâmina afiada, cortando o tecido de sua alegria. O contraste entre o que sentia e o que Henrique parecia querer proteger a deixou desorientada. Era um amor que lhe fazia bem, mas que também a mantinha à margem de um mundo que a rejeitava. Com um toque de tristeza, ela concordou, mas em seu coração, a insegurança se plantava como uma semente.
— Tudo bem, Henrique — ela disse, forçando um sorriso que não alcançava seus olhos. — Eu entendo.
O olhar de Henrique parecia pesar, um tumulto de emoções que ele não conseguia expressar. Penélope se despediu dele naquela noite com um beijo suave, mas a sensação de que algo não estava certo a acompanhou, como uma sombra que se recusa a se desvincular da luz.
Na solidão do seu pequeno quarto, Penélope encarou o novo celular sobre a mesa. Ele reluzia sob a luz suave da lâmpada, um objeto de desejo que parecia conter promessas e segredos. No entanto, a insegurança daquelas palavras ainda ressoava em sua mente, como um lamento distante.
Com um toque hesitante, ela desbloqueou a tela, mergulhando em um mundo que agora parecia mais vazio do que antes.
A noite avançava lentamente, cada segundo se arrastando como uma sombra inquieta, enquanto Penélope se via presa em uma teia de incertezas. O celular novo, que antes era um símbolo de felicidade, agora parecia um objeto estranho e ameaçador, pulsando com uma energia que ela não conseguia entender.
Sentada na beirada da cama, Penélope pegou o aparelho, seus dedos acariciando a superfície fria e reluzente. O brilho da tela iluminou seu rosto, e uma nova expectativa a invadiu. O que aquele pequeno objeto poderia oferecer? Mensagens, chamadas, conexões. Um mundo inteiro à sua disposição, um mundo que, até então, sempre lhe pareceria distante.
Mas enquanto tentava explorar as funcionalidades, uma inquietação começou a brotar em seu coração. As horas se arrastavam, e a escuridão do quarto parecia se intensificar. Tentou ligar para Henrique várias vezes, mas suas tentativas eram em vão, cada chamada indo direto para a caixa de mensagens. A solidão a envolveu como um cobertor pesado, e o eco de sua voz se tornava uma companhia triste.
Às 10 horas da noite, um som agudo cortou o silêncio do quarto, como um grito que rasgava a noite. O celular vibrava em sua mão, e um frio percorreu sua espinha ao perceber que era uma chamada. Pressionou o botão para atender, o coração pulsando em um frenesi de esperança.
— Henrique? — chamou, mas a única resposta foi o silêncio ensurdecedor, uma estática estranha que parecia vibrar em seu ouvido. A voz de uma mulher começou a ecoar, chorando, uma melodia de desespero que arrepiou sua pele.
— Por favor… — a mulher implorava, a voz embargada e angustiada. Penélope sentiu o pânico crescer dentro de si. O celular escorregou de suas mãos, caindo no chão, e a estática se transformou em gritos, em tiros, um barulho ensurdecedor que a fez estacar. O sangue começou a escorrer da tela, uma visão que desafiava a lógica, enquanto as luzes do quarto piscavam freneticamente, como se a casa estivesse sob um feitiço maligno.
Penélope gritou, um gritar que ecoou nas paredes, mas ao olhar para o chão, tudo parecia normal. O celular estava ali, inerte, como se nada tivesse acontecido. As luzes pararam de piscar, e o silêncio voltou a reinar, pesado e ameaçador.
Atormentada pelo que acabara de vivenciar, Penélope se encolheu na cama, o coração ainda batendo descontrolado. O que tinha sido aquilo? Um pesadelo? Ou um aviso sombrio de que algo terrível estava prestes a acontecer?
Assim, cercada por suas incertezas, Penélope se permitiu um momento de fraqueza, o medo apertando seu peito enquanto a escuridão da noite a envolvia. E ali, naquele quarto, o novo celular a observava, um símbolo de amor e de terror, entrelaçando seus destinos de uma forma que ela ainda não compreendia.
O sol da manhã despontava no horizonte, espalhando sua luz morna sobre a cidade, mas Penélope não sentia o calor. Suas mãos ainda estavam trêmulas, os pensamentos nublados pelo que havia acontecido na noite anterior. A memória do som estático, dos gritos e do sangue que escorria da tela do celular estava gravada em sua mente como uma cicatriz que não se curaria jamais. Ela tentou, com todas as forças, apagar aquela imagem perturbadora de seus pensamentos, mas a cada tentativa, parecia que o terror apenas se intensificava.
No caminho para o trabalho, cada passo que dava parecia ser acompanhado por um ruído indistinto, um eco sussurrante que a fazia olhar constantemente por sobre o ombro. O medo havia se instalado como uma sombra insistente, e Penélope não conseguia escapar. Era como se uma presença invisível estivesse sempre ao seu lado, observando, sufocando-a. O coração dela disparava com cada som, com cada movimento na rua.
No trabalho, o familiar cheiro de café fresco e o burburinho dos clientes costumavam acalmá-la, mas hoje, tudo parecia diferente. Aquele lugar seguro agora estava impregnado de uma atmosfera pesada, e Penélope mal conseguia manter as mãos firmes enquanto servia as mesas. Cada barulho de prato ou de passos a fazia saltar, como se algo terrível estivesse prestes a acontecer.
— Com licença? — disse um cliente, sua voz soando distante, como se Penélope estivesse imersa em um mar de ruídos estranhos. Quando se deu conta, suas mãos haviam tremido tanto que o pedido de café e torradas caiu sobre a mesa, espalhando o conteúdo sobre o cliente. Ele riu de nervoso e a xingou, um som cruel e zombeteiro que a atingiu como uma facada.
Seu rosto ficou vermelho de vergonha, mas o pavor logo a dominou. Ela olhou ao redor, sentindo-se exposta, vulnerável, como se o mundo inteiro estivesse zombando de seu medo. Tremendo visivelmente, Penélope começou a recolher os pedaços do que derrubara, mas suas mãos pareciam não obedecer, e o desespero crescia dentro dela.
Foi então que seu chefe, um homem de meia-idade com olhos gentis, se aproximou, percebendo o estado em que ela se encontrava.
— Penélope — ele disse, a voz suave, mas firme —, acho que é melhor você ir para casa hoje. Está visivelmente abalada.
Ela tentou protestar, mas as palavras não saíam. Sabia que ele tinha razão. Algo em seu interior estava despedaçado, e ela não conseguia disfarçar. Com um aceno tímido, ela pegou suas coisas e saiu pela porta, o peso de sua própria mente tornando cada passo mais difícil. E mesmo ali, na rua movimentada, a sensação continuava, insistente: alguém estava ao seu lado, sempre ao seu lado.
Ainda sentindo o peso da noite anterior, Penélope mal conseguia pensar com clareza. Em casa, o silêncio parecia tão opressor quanto a sensação de estar sendo observada. Ela decidiu ligar para Henrique, a única pessoa que acreditava ser capaz de trazer algum alívio para o que estava sentindo. Com as mãos trêmulas, discou o número, e, para sua surpresa, ele atendeu quase que imediatamente.
— Estou indo te buscar, amor. — A voz de Henrique era firme, mas havia uma urgência nela que Penélope não conseguiu entender.
Minutos depois, ele chegou em seu carro, os olhos preocupados ao encontrá-la. Penélope se deixou conduzir até o parque próximo, onde o som das folhas ao vento e o canto distante dos pássaros criavam uma atmosfera que deveria ser reconfortante. Eles se sentaram no banco sob uma árvore imponente, e o calor dos braços de Henrique ao redor dela começou a dissipar parte da angústia que a envolvia.
Penélope, no entanto, não conseguiu evitar. O relato da noite anterior fluiu de seus lábios, cada palavra tingida de medo e confusão. Ela descreveu a voz estática no telefone, o choro da mulher, os gritos e o sangue que havia escorrido da tela. Henrique ouvia em silêncio, mas à medida que a história avançava, ela percebeu uma mudança em sua expressão.
— Isso... isso é impossível, Penélope. — Sua voz estava tensa, quase ríspida, enquanto seus olhos vagavam pelo parque como se procurassem uma explicação invisível. — Você deve ter imaginado isso, foi só um sonho ruim, não tem outra explicação.
Penélope sentiu algo se apertar em seu peito. A forma como ele falava, a inquietação que crescia nele, parecia exagerada, desproporcional. Henrique estava nervoso, muito mais do que ela esperava. Mas, apesar da estranheza que aquilo lhe causava, ela decidiu não insistir. Não queria afastá-lo naquele momento, não queria manchar a única parte boa que restava de seu dia.
Ela repousou a cabeça em seu ombro, tentando esquecer. Deixou o calor de seu abraço envolvê-la, como se assim pudesse afastar a escuridão que a perseguia. Por alguns instantes, parecia que tudo voltaria ao normal.
Mas então, o silêncio do parque foi interrompido. O celular de Penélope, guardado em seu bolso, começou a vibrar violentamente. A tela acendeu sozinha, e, com um brilho ofuscante, a voz estridente ecoou pelos arredores. Era uma voz furiosa, carregada de ódio, que Penélope jamais ouvira antes.
— Desgraçado… Canalha... — as palavras saíam com uma raiva palpável, como se viessem das profundezas de um ressentimento antigo.
Penélope congelou. Seus olhos se arregalaram, incrédulos, enquanto olhava para o aparelho que parecia ganhar vida própria. Henrique se levantou abruptamente, o rosto contorcido de fúria.
— O que é isso?! — Ele gritou, a voz cheia de incredulidade e raiva.
Antes que Penélope pudesse responder, o celular repetiu os insultos, agora mais intensos, quase como se estivesse gritando diretamente para ele.
— Desgraçado! Canalha!
Henrique não aguentou. Seus olhos faiscavam de cólera, e ele se afastou dela com passos rápidos e furiosos.
— Eu não sei o que está acontecendo, mas não vou ficar aqui para ouvir isso! — ele disparou, virando-se para ir embora, deixando Penélope sozinha, atordoada pelo que acabara de acontecer.
O celular ainda vibrava em sua mão, um peso agora insuportável. Com um gesto desesperado, ela o lançou no meio do mato, ouvindo o impacto abafado contra as folhas. Sem olhar para trás, Penélope se levantou e caminhou de volta para casa, o eco das palavras raivosas ainda martelando sua mente.
Naquele momento, mais do que nunca, ela sentiu que algo muito mais profundo e sinistro estava em jogo.
A noite chegou e envolveu a casa de Penélope em um manto pesado de silêncio. Ela estava sentada no sofá, o coração pesado de tristeza pela briga com Henrique. As palavras cruéis ditas pelo celular ainda ecoavam em sua mente, e a imagem do namorado partindo enfurecido só aumentava sua dor. Nada fazia sentido. Como algo tão surreal poderia ter acontecido? O que estava se passando?
Penélope se sentia sozinha, perdida entre o medo e a confusão. Tentou, inutilmente, afastar os pensamentos que a consumiam, mas a mente insistia em voltar ao mesmo ponto, como uma agulha presa em um disco arranhado. Horas se passaram, e seus olhos se fechavam de cansaço enquanto a televisão murmurava baixinho no fundo, as imagens na tela se tornando borrões indistintos.
Finalmente, Penélope decidiu que precisava descansar. Desligou a televisão e, no instante em que a tela se apagou, algo a fez congelar de horror. No reflexo escuro da tela, ela viu claramente a imagem de uma mulher, pálida, com olhos vazios e um olhar de agonia, parada bem atrás dela. O corpo de Penélope ficou rígido, o sangue gelou em suas veias. Ela se virou rapidamente, os olhos arregalados, mas não havia ninguém ali.
Seu coração batia tão forte que parecia ecoar pela casa. Tentando controlar a respiração, Penélope balançou a cabeça, convencendo-se de que aquilo não passava de mais um truque de sua mente, uma manifestação de seu cansaço e do estado emocional abalado. Ela passou a mão pelo rosto, tentando espantar a sensação de pavor crescente.
Mas o alívio durou pouco. Um vento gélido atravessou a sala, fazendo as cortinas balançarem levemente. Penélope sentiu algo ao seu redor mudar, uma presença densa e pesada, e antes que pudesse reagir, ela a viu de novo — a mulher fantasmagórica, agora mais próxima, colocando lentamente as mãos sobre o rosto dela.
O toque era frio como o gelo, e Penélope não conseguiu gritar. O terror tomou conta de seu corpo, mas, em um piscar de olhos, a mulher desapareceu novamente. O mundo ao redor de Penélope mudou. A sala que antes conhecia se desfez, mergulhada em uma neblina cinza e vermelha, como se o ar fosse feito de fumaça e sangue. Penélope tentou mover-se, mas seu corpo estava paralisado, incapaz de reagir, seus músculos enrijecidos pelo medo.
Então, um grito cortou o silêncio. Um grito de puro desespero.
Ela olhou ao redor, tentando localizar de onde vinha aquele som, e então os vultos começaram a surgir diante dela, materializando-se lentamente. Eram os amigos de Henrique, os mesmos que haviam estado com ele no dia anterior. Eles estavam parados diante dela, seus rostos contorcidos de pavor. Penélope quis chamar por eles, mas as palavras ficaram presas em sua garganta. Algo horrível estava prestes a acontecer, ela podia sentir.
Em um instante grotesco, os corpos dos rapazes começaram a se comprimir, como se estivessem sendo esmagados por uma força invisível. Seus gritos de dor foram sufocados pelo som da carne e ossos se rompendo, e logo suas figuras começaram a pegar fogo, as chamas consumindo-os em agonia enquanto suas expressões de horror permaneciam gravadas em seus rostos.
Penélope queria fechar os olhos, mas não conseguia. Ela estava presa naquele pesadelo, seu corpo enraizado ao chão, observando aquela cena infernal.
De repente, uma risada fria e sinistra ecoou pelo ambiente, uma risada que a fez estremecer até os ossos. No momento seguinte, tudo desapareceu.
Ela acordou bruscamente, sentada no sofá, o corpo coberto de suor frio. Seu peito arfava, e ela tentou se acalmar, convencendo-se de que tudo aquilo tinha sido apenas um pesadelo terrível. Mas, quando olhou para suas mãos, o sangue fugiu de seu rosto.
O celular que ela havia jogado fora horas antes estava de volta em suas mãos. Sua tela brilhava com um brilho macabro, e quando Penélope olhou para o que estava sendo exibido, o terror a consumiu novamente. Imagens do carro em que Henrique e seus amigos haviam estado desfilavam lentamente na tela, como uma macabra coleção de memórias que ela nunca tirou.
Penélope estava à beira do desespero. O terror que sentia era indescritível, seu corpo tremendo incontrolavelmente enquanto seus olhos permaneciam fixos no celular em suas mãos. O pânico a dominava quando, de repente, a campainha tocou. Por um breve instante, seu coração se acalmou, preenchido pela esperança de que a normalidade pudesse retornar.
Ela correu até a porta e, ao ver Henrique do outro lado, sentiu um alívio tão intenso que seus olhos se encheram de lágrimas. Sem pensar, ela o abraçou com força, buscando em seus braços a segurança que tanto ansiava. Henrique, embora claramente perturbado, tentou acalmá-la. Seus olhos, por um breve momento, refletiam o amor genuíno que ele sentia por ela, apesar de tudo.
— O que está acontecendo, Henrique? — Penélope perguntou, a voz trêmula e repleta de dor.
Henrique, tentando manter a compostura, ouviu o relato de Penélope sobre o celular, sobre a visão horrível que tivera, sobre o fato de o aparelho ter reaparecido em suas mãos como se fosse um fantasma. Ele, no entanto, tentou tranquilizá-la.
— Está tudo bem, Penélope. Eu... eu emprestei o carro para meus amigos, como sempre faço. — Sua voz era vacilante, mas ele tentou soar firme. — Eles ficaram com o carro, e eu voltei para ficar com você.
Penélope, ainda abalada, não podia ignorar o pressentimento que corroía seu interior. Algo estava errado, e ela sabia disso. Ela convenceu Henrique a ligar para seus amigos, para ter certeza de que eles estavam bem. Ele hesitou, o rosto se transformando em uma máscara de incerteza e medo. Com as mãos trêmulas, Henrique pegou o telefone e fez a ligação.
Quando a voz do outro lado da linha atendeu, Henrique caiu de joelhos, sufocado por um choro profundo. A pessoa ao telefone lhe contou o que ele temia ouvir: seus amigos haviam acabado de morrer em um terrível acidente de carro. O veículo capotara várias vezes e, logo após o impacto, pegara fogo. Todos morreram antes que qualquer socorro pudesse chegar.
Penélope, atordoada com a revelação, tentou consolar Henrique, mas algo mudou nele. A dor em seus olhos se transformou em uma raiva fervente. Ele se afastou de Penélope abruptamente, as mãos tremendo de fúria.
— O que você sabe? — Ele gritou, os olhos injetados de ódio. — O que você sabe sobre isso, Penélope?!
Antes que ela pudesse responder, Henrique a agarrou pelos braços e a arrastou pela casa. Penélope tentou se soltar, mas ele estava consumido por uma violência que ela nunca vira antes. Ele a empurrou para dentro da cozinha, o olhar desvairado. Penélope gritou, implorando para que ele parasse, mas era como se Henrique já não estivesse mais ali.
Ele abriu uma gaveta com um movimento brusco e apanhou uma faca, erguendo-a acima da cabeça de Penélope. Ela sentiu o frio do metal se aproximando, seu corpo paralisado pelo terror, enquanto ele gritava, enlouquecido.
— Isso tem que acabar! — Ele vociferou, com a faca prestes a descer.
Foi nesse instante que algo perturbador aconteceu. O celular que Penélope havia jogado fora horas antes reapareceu misteriosamente sobre a pia da cozinha e começou a vibrar, chamando a atenção de Henrique. Ele parou, o olhar fixo no aparelho como se fosse um objeto amaldiçoado.
— Que brincadeira é essa? — Henrique gritou, pegando o celular com fúria. Mas, antes que pudesse fazer mais alguma coisa, o aparelho explodiu em sua mão.
A explosão foi sobrenatural, queimando gravemente o rosto e a mão de Henrique. Ele gritou de dor, caindo no chão, contorcendo-se. Das cinzas e da fumaça que restavam do celular, a figura da garota fantasma emergiu, seu olhar preenchido por uma ira antiga e vingativa.
Com um movimento rápido e inescapável, o espírito da garota entrou no corpo de Henrique, possuindo-o por completo. Ele se levantou, agora com os olhos vidrados e uma expressão sombria. Penélope, ainda no chão, observava horrorizada enquanto Henrique, agora possuído, se aproximava lentamente.
Os olhos dele, agora dominados pela presença da garota morta, encontraram os de Penélope, e, naquele instante, toda a verdade se desvelou diante dela. Henrique e seus amigos haviam assaltado uma garota, a mesma que levava o celular que ele lhe dera de presente. A garota reagiu, e Henrique, tomado pelo desespero e pelo egoísmo, a assassinou a tiros. O celular que Penélope recebera estava destinado a ser um presente, mas foi transformado em um símbolo de morte e vingança.
Ainda possuído, Henrique ergueu a faca em um gesto brutal e cortou a própria garganta, o sangue esguichando como um rio de arrependimento e fúria. Seu corpo tombou no chão, a vida deixando-o rapidamente. Penélope, imóvel, observou a cena, sem conseguir entender como tudo havia chegado àquele ponto.
A garota fantasma, agora em paz, olhou uma última vez para Penélope. Ela não estava ali para feri-la, apenas para garantir que mais uma alma inocente não fosse tirada por aqueles que lhe causaram tanto sofrimento. Com sua vingança cumprida, a garota desapareceu em meio à escuridão, deixando Penélope sozinha, envolta em um silêncio que parecia eterno.
Jeremias Alves Pires 🖋️
5 Comentários
Um excelente conto de terror.
ResponderExcluirMuito bom como você inicia com um clima de romance deveras açucarado parado, de repente entrar no horror que a presença de um simples celular poderia evocar.
O final também foi muito bom e deu um ótimo ar de resolução.
Parabéns
Muito, obrigado! Fazia tempo que tinha essa história na cabeça.
ResponderExcluirTal como Penélope, a angústia tomava conta de mim a cada frase.
ResponderExcluirTexto muito denso e sombrio, primorosamente escrito numa narrativa crescente que, conseguiu me envolver e me assustar.
Parabéns!
Ficou maravilhoso!
Obrigado. Tentei pegar leve nesse texto, mas acho que meu lado terror é bem mais forte... kkkk
ResponderExcluirValeu, meu amigo. É sempre um prazer escrever para esse blog.
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