MISSÃO 17 – HORIZONTE DE ESTRELAS
O espaço parecia calmo demais.
Depois de horas em silêncio, só o ruído surdo dos propulsores de manobra quebrava o vazio. A Estrela Perdida cortava a escuridão como um vulto ferido, mas livre.
Nenhum radar hostil. Nenhum eco de perseguição. Apenas o sussurro constante dos motores e o estalar distante do casco esfriando após a fuga.
Lúcia permanecia de pé no passadiço, mãos apoiadas na borda do painel. O reflexo das estrelas projetava seu rosto nas janelas — olhos cansados, mas ainda alertas.
Por um instante, acreditou que tinham vencido.
Mako, no assento de pilotagem, ajustava o controle de órbita com movimentos curtos, precisos. A cada comando, o painel emitia um chiado metálico.
Nyx, sentada no banco lateral, desmontava parte do antebraço — fios expostos e placas fumegantes.
Zurgo, mastigava uma barra energética e, como sempre, tentava disfarçar o nervosismo.
— Acha que eles já perceberam? — perguntou Mako, sem tirar os olhos do radar.
— Quem sabe? — Lúcia respondeu, exausta. — Só quero estar o mais longe possível quando perceberem.
Zurgo deu uma risada curta.
— Distância é bom. Mas dinheiro é melhor. Então... pra onde a chefe brilhante aqui vai mandar a gente agora?
— Primeiro, distância, — disse Lúcia, seca. — Depois, resposta.
Passou os dedos no painel e olhou para o horizonte estrelado. — Quando estivermos fora do alcance, entregamos a caixa. E depois... acabou.
O silêncio pesou. Todos sabiam que “acabou” não significava o mesmo para cada um.
Nyx ergueu o rosto. O tom de sua voz, metálico e rouco, trazia uma estranha serenidade:
— O artefato ainda pulsa. Vibração irregular. Recomendo isolamento total no compartimento de carga.
Zurgo arqueou as sobrancelhas.
— Isolamento? Depois de quase morrer por essa coisa, você quer trancar? Eu, no mínimo, gostaria de ver o que tem ai. Vai que é um prêmio.
Mako bufou. — Ou uma bomba.
Zurgo deu de ombros, fingindo despreocupação. — Cada um com suas apostas.
Lúcia voltou-se para a janela. As estrelas dançavam em silêncio, e a vastidão parecia observá-los.
Havia algo errado naquele silêncio — um rumor grave, um zumbido vindo do coração da nave.
Nyx notou primeiro. — Captação residual detectada. Frequência desconhecida.
Zurgo se levantou devagar.
— Deixa comigo. Coisa pequena. Deve ser interferência no receptor.
— Seja rápido. — Lúcia nem o olhou.
Zurgo caminhou pelo corredor estreito, e o eco de seus passos pareceu mais alto do que deveria.
Seu rosto sumiu na penumbra.
Sombras cortaram o brilho das luzes de emergência.
Na baía de manutenção, Zurgo trancou a porta. O ar ali tinha cheiro de ozônio e graxa quente.
Ligou um painel auxiliar, seus dedos tremiam sobre as teclas.
Um terminal piscou com luz vermelha. A tela projetou caracteres antigos, quase ilegíveis.
CANAL: ESPECTROS DE ORLOCK.
Zurgo hesitou por um segundo. Respirou fundo, olhou para certificar – se de que estava só O reflexo de seu rosto, ficou dividido pela luz vermelha, parecia o de um estranho.
E então digitou:
“Carga obtida. Coordenadas anexadas. Tudo conforme acordo.”
O cursor piscou.
E por um momento Zurgo hesitou para pressionar a tecla “ Enter “, respirou fundo mais uma vez e antes de pressionar pode – se ouvir algo que saiu como se ele estivesse tirando um fardo enorme de seus ombros.
— Ghizan…
Apertou.
Mensagem enviada.
A luz vermelha apagou-se.
Cinco minutos...
No passadiço, os sensores de Nyx alertaram.
— Detecto variações na curvatura local. Ecos de dobra próximos. Três assinaturas desconhecidas.
Mako endireitou-se. — Isso não é bom.
Lúcia virou-se, o corpo inteiro em alerta. — Como assim, “ecos”?
O painel acendeu em alarme. Três pontos vermelhos surgiram no radar, crescendo rápido.
— Isso não é uma rota civil. — Mako girou o manche. — São naves. Grandes.
O rádio crepitou. Uma voz rouca, distorcida, invadiu a ponte:
“Ora, ora, ora se não é a nossa querida Lúcia e sua Estrela Perdida.”
Lúcia sentiu o estômago afundar.
— Zack maldito! Como ele nos achou?
Nyx apertou o painel, os olhos brilhando em azul. — Coordenadas transmitidas de dentro da nave. Alguém que está a bordo...
O olhar dela cruzou o de Zurgo, que voltava da baía de carga.
O sorriso dele era largo demais.
— Que foi? — perguntou, com voz leve.
Mako se levantou bruscamente. — Traidor!
Zurgo ergueu as mãos, rindo sem graça. — Calma, gente... não é nada pessoal. São só negócios.
Lúcia sacou o blaster. — Você vendeu a gente.
Zurgo suspirou. — Vender é uma palavra feia. Prefiro “compensação justa”.
O dedo de Lúcia tremeu no gatilho.
Porém um impacto atravessou a nave. Alarmes e luzes luzes tremularam. A Estrela Perdida gemeu sob o cerco.
Três cruzadores piratas cercaram o cargueiro, seus cascos negros cobertos por inscrições tribais. Um raio trator pareceu travar as saídas. Painéis estouraram, soltando faísca e fumaça do leme.
O cheiro de fumaça e ozônio encheu o ar.
Nyx ativou o modo de combate. Correu em direção a Zurgo.
Zurgo apontou um disruptor positrônico e disparou um pulso elétro magnético, atingindo Nyx em cheio que caiu apagada aos pés dele.
As luzes morreram.
— Nada pessoal, chefe. — A voz de Zurgo ecoou entre faíscas. — Mas vocês nunca entenderiam o que essa caixa vale.
Mako desferiu um soco no rosto de Zurgo, ele revidou com outro e o agarrou pelo colarinho. O choque fez ambos caírem.
Eles rolavam no chão enquanto Lúcia tentava mirar em Zurgo sem sucesso.
— Merda Zurgo! Traidor!
Guardou seu blaster no coldre e decidiu ajudar na luta. Zurgo diferente do que parecia antes se mostrou hábil em combate, desferindo um cabeçada em Mako quando ficou por cima ao rolarem. Mako apagou no mesmo instante.
Rolou para trás desviando por centímetros do chute de Lúcia que já vinha em direção ao seu rosto.
Colocou – se de pé.
Montou a guarda.
— Ok chefe se é isso que você realmente quer.
Lúcia cerrou os dentes com raiva o primeiro soco Zurgo desviou, com facilidade, o segundo foi bloqueado com o antebraço.
Desferiu uma joelhada no estomago de Lúcia que a fez se afastar se curvando de dor.
Zurgo avançou desferindo três socos, o primeiro no lado esquerdo do rosto, o segundo pegou no queixo, o terceiro passou no vácuo enquanto Lúcia caía parecendo nocauteada.
— Zurgo! — Lúcia gritou. Seu sangue escorria pela boca — Solta a caixa!
— Nem pensar!
Ouve outro impacto. O teto da nave pareceu agora rachar.
O chão tremeu.
Zurgo foi para o compartimento de carga segurando o artefato.
Mako levantou – se ainda zonzo tentou ir atrás, mas uma explosão o lançou contra a parede.
Lúcia levantou, correu, tropeçando, tossindo, caindo.
Sangrando.
Nos corredores, alarmes gritavam. O ar cheirava a metal queimado e desespero.
Mako levantou – se e tentou ativar Nyx, sem sucesso.
— Prepara as cápsulas, — ordenou Lúcia. — Se tudo for pro inferno, a gente sai voando.
Ela se jogou pelo corredor, o coração disparando. O som dos passos de Zurgo ecoava adiante.
Chegou à escotilha de carga no momento em que ele ativava o painel
A nave já estava acoplada a um módulo dos orlocks.
Um feixe magnético azul ligava o módulo a Estrela Perdida. Zurgo atravessou o vazio levando consigo a caixa, olhou para cima — o reflexo carmesim dos cruzadores brilhando em seus olhos.
Lúcia apareceu na porta, arma em punho. — Zurgo!
Ele sorriu, cansado, sangrando pelo canto da boca. — Eu disse… nada pessoal.
Fechou a porta.
Partiu!
Ao chegar em uma distância segura, disparou contra a Estrela Perdida.
Houve uma explosão que quase arrancou Lúcia do chão. Foi arremessada vários metros para tras. O som virou um rugido surdo.
Mako inseriu Nyx ainda desativada numa das cápsulas, foi até o corredor onde Lúcia estava e a puxou pela gola da jaqueta. — Sem tempo!
Mako cambaleava, com sangue no rosto. — Os reatores estão derretendo!
Lúcia olhou para a tela lateral: a Estrela Perdida em chamas, as naves piratas afastando-se com a caixa. E Zurgo no módulo — visível por um segundo — indo para dentro do cruzador inimigo.
O coração dela partindo em silêncio.
— Lançar cápsulas!
As escotilhas abriram. Alarmes ecoaram como gritos metálicos.
A nave inteira tremia sob o peso da destruição.
E assim foram ejetados ao espaço em cápsulas de fuga, enquanto Lúcia via a sua companheira de anos, o seu lar, a única herança que restava de seus país.
A estrela Perdida.
Explodia, e junto com ela tudo que fazia parte de quem era Lúcia Vega.
Dentro das cápsulas, o caos virou silêncio.
O silêncio virou choro.
O choro virou uma promessa de vingança.
Lúcia fechou os olhos. — Mako? Nyx?
Som de estática. Nenhuma resposta.
O planeta abaixo crescia — uma esfera azul-esverdeada coberta de tempestades elétricas.
As cápsulas cortaram a atmosfera como meteoros. Calor. Tremores.
O som do ar rasgando o metal.
Houve o impacto.
Houve o silêncio.
Lúcia abriu os olhos. O teto da cápsula estava rachado, a luz filtrada em tons verdes.
Empurrou a escotilha e o mundo novo respirou sobre ela.
O ar era úmido, quente, vivo.
Florestas bioluminescentes se estendiam até o horizonte. Plantas pulsavam. Insetos cortavam o ar com zumbidos agudos.
O solo afundava sob os pés, misto de musgo e lama quente.
— Mako… Nyx… — a voz dela era quase um sussurro.
Seguiu cambaleante entre raízes choro, sangue e vapor.
Encontrou a cápsula de Mako partida ao meio, fumaça subindo das bordas.
— Vivo? — perguntou.
Mako tossiu, levantando o rosto coberto de sujeira e sangue. — Por enquanto.
Um som estranho preencheu a selva.
Passos. Não… arrastar de garras.
Do nevoeiro verde, olhos dourados se acenderam.
Eram altos, musculosos, pele coberta de escamas e símbolos tribais.
Homens-lagarto. Armaduras orgânicas. Lanças de energia vibrante.
Lúcia ergueu as mãos. — Não queremos conflito!
Um deles a golpeou, empurrando-a de joelhos. Outro segurou Mako pelo pescoço.
Um terceiro, maior, com olhos âmbar e dentes de afiados, inclinou-se diante dela.
Falou num idioma de estalos e chiados:
“Khar-Tall Kull Thall.”
Lúcia tentou reagir, mas uma descarga a atingiu. O mundo se apagou. Mako logo após.
Quando voltaram a si, estava acorrentada sobre pedra viva.
O som de tambores vibrava pelas paredes.
O ar tinha gosto de resina e cinzas.
Mako estava inconsciente ao lado.
Ao redor, dezenas de Xha’Ruun observavam, imóveis, como estátuas vivas.
No centro da sala, um trono feito de ossos e cristal. Sobre ele, um guerreiro colossal, adornado com chifres bioluminescentes, fitava-a com olhos que refletiam chamas.
Ergueu uma lança e falou em sua língua gutural:
“Vaaarrrakkk nahull Omag Ketter.
Lúcia tentou responder, mas o tradutor estava morto.
O líder fez sinal. Dois guardas a arrastaram para fora.
A selva rugia lá fora — viva, atenta, como se o próprio planeta respirasse.
Khar-Tal.
Um mundo esquecido, onde até o vento parecia observar.
Acima das nuvens, fragmentos da Estrela Perdida riscavam o céu como brasas moribundas.
E muito além dali, em uma nave pirata mergulhada em luz vermelha, Zurgo observava a caixa sobre a mesa.
Ela pulsava.
Um som grave, quase um batimento, enchia o ar.
— Vamos ver, — murmurou, — o que valeu tudo isso.
A tampa se abriu com um suspiro de energia.
Luz azul inundou a cabine.
Dentro, algo vivo, girando.
Pulsante.
Brilhante.
Poderoso.
Uma matriz da criação, um artefato perdido no universo, não o artefato inteiro, mas uma de suas partes que estão perdidas...
no Horizonte de Estrelas…
FIM...










2 Comentários
Rapá! Fiquei aqui impactado com a traição do Zurgo, eu realmente não tinha visto essa chegando.
ResponderExcluirE, caceta, senti um aperto no coração com o fim da Estrela Perdida, a narrativa ficou extremamente emocional, afinal de contas você contruiu a história tornando a nave um outro membro da equipe.
E os dois ganchos para o futuro ficaram perfeitos, tanto o destino da Lúcia, quanto a revelação do que havia dentro da caixa.
Mal posso esperar para ver o que vem por aí.
Parabéns!
A traição de Zurgo foi algo inesperado e agora a coisa deu ruim para Lúcia, que caiu num planeta e foi capturada por selvagens pronta para vira alimento.
ResponderExcluirVejamos se ela vai se safar.
E vejamos qual será conteúdo da caixa.
Meus parabéns!