Capítulo 4: Abra a Mente e o Coração |
“Quintessência... quais serão seus princípios ”
Escuridão absoluta, plenamente densa. Nenhum som, nenhuma visão, absolutamente nada. Afinal, o que era aquilo? Se perguntava uma energia ali presente, como em estado de inércia. Ao mesmo tempo que nenhum de seus sentidos reagia ao vazio, de alguma maneira estava consciente daquele mistério, uma vez que era apenas a consciência que lhe restava.
Tentou mover sua mão direita, sem êxito; assim como a
esquerda. Tentou abrir os olhos, também sem êxito. Tentou abrir a boca, com o
mesmo resultado. De repente, era como se entrasse em desespero, simplesmente
por não compreender o que afinal acontecia. Aquela energia inerte parecia pedir
socorro, de alguma maneira.
E também, de alguma maneira, uma pequena chama surgiu
em meio àquela escuridão, podendo revelar nitidamente a forma da energia: um
corpo completamente desfigurado, privado de todos os sentidos. A chama então se
expandiu subitamente, iluminando toda aquela escuridão, transmutando-a em luz.
Tal chama envolveu aquela energia, como uma flor ardente.
VOZ – Vim em teu auxílio, criança. Tu
rogaste e aqui estou.
A energia podia de alguma forma ouvir, e
consequentemente se comunicar. Apesar de não possuir os sentidos, ainda lhe
restava a consciência.
ENERGIA – Socorro... Por favor, socorro!
VOZ – Tua dor é intensa, e teu desespero também.
Vim por ti, pois antes de tudo eu te escolhi, criança. Mas saibas que, a partir
daqui terás muito o que desvendar. Afinal, tu sabes quem és?
ENERGIA – Eu sou...
Rotina típica de um hospital, geralmente vista no
térreo. Recepcionistas, seguranças, médicos, enfermeiros, pacientes,
acompanhantes, visitantes, e vez por outra um policial para apurar alguma
ocorrência... a movimentação era constante.
A professora Kaname Baba já estava ansiosa para
voltar para casa e para suas crianças, pois ela sequer imaginava como seria um
dia sem ela: eles não poderiam ficar sem aula. As irmãs Mizushima nada
entendiam de lecionar, eram boas auxiliares nos cuidados com as crianças e nos
demais afazeres; então ela nem imaginava em como elas lidariam com a sua
ausência.
O médico auxiliar, um estagiário de sobrenome
Igarashi, já havia prescrito os cuidados mediante autorização de seu superior.
Kaname iria se recuperar bem, mesmo o golpe tendo sido violento. Lá no hospital
ela soube do resgate de Kokoro, e que a pequena estava na ala infantil. Foi um
alívio saber também que a menina havia saído praticamente ilesa do ocorrido,
apesar de ter chegado desacordada ao hospital. Ela havia solicitado qualquer
informações sobre o estado da menina.
Então, o tal médico auxiliar adentra a sala. Era um
rapaz alto, jovem, de porte, com os cabelos iluminados e usava óculos, assim
como ela. E logo em seguida, entra uma policial: Oficial Risa Ota.
KANAME – Doutor, bom dia. (para a policial) Bom dia, oficial. Já tem algum retorno sobre a
pequena Kokoro Ito?
DOUTOR – Sim, senhorita. A menina já acordou,
conversou com a psicóloga e aparentemente está tudo bem. Ela falou algumas coisas
sobre um farol, e sobre a “tia Hotaru.” Ela sofreu um choque, mas se tiver o
apoio de vocês, tudo ficará bem.
KANAME – Sim, doutor. Até agora, não se sabe nada
da Hotaru? Ela não deu entrada no hospital?
DOUTOR – Não tivemos nenhuma paciente com as
características dela até agora. A senhora pode ir para casa, mas a menina
precisa ficar aqui pelo menos até amanhã, por diversas questões.
OFICIAL RISA – Bem, doutor, professora Kaname...
Estou aqui porque preciso esclarecer alguns fatos. Kokoro Ito, a menina
resgatada que se encontra agora na ala infantil deste hospital, ela não tem
pais? Qual é a origem dela, afinal?
KANAME – Bem, oficial... eu cuido dela desde que
era um bebê. Quem me trouxe ela, recém-nascida, foi meu amigo de infância, Joji
Sasaki. Não sei muito sobre a mãe dela, apenas que o Joji a conhecia bem; mas
ele me disse que a moça faleceu. E quanto ao pai, também não conheço. Joji
sempre deu todo o suporte que ela precisava, mesmo de longe.
OFICIAL RISA – Compreendo. Você sequer sabe o nome
da mãe dela?
KANAME – Bom, na certidão que temos da Kokoro, o
nome consta como Ai Ito.
OFICIAL RISA
– Ai Ito?! Bem...
KANAME – Que mal lhe pergunte, oficial, por que
está me fazendo essas perguntas sobre a Kokoro e a origem dela?
OFICIAL RISA – Bem, professora, é que estamos
tentando ligar alguns pontos para esclarecer o motivo do sequestro. Você sabe
bem que eu conheço Joji Sasaki de longa data, fomos colegas enquanto ele ainda
era policial. Só queremos conhecer melhor a refém...
KANAME – E a Hotaru? Vocês a encontraram?
OFICIAL RISA – Bem, professora Kaname, agora mesmo
há uma equipe revirando os escombros do farol...
Neste momento, o celular da oficial toca. Ela então
olha a tela e vê o nome: Tetsuo Harada, e atende sem pensar duas vezes.
OFICIAL RISA – Alô?
OFICIAL TETSUO – Alô, Risa, a ocorrência é a
seguinte: os escombros foram revirados e, só um corpo foi encontrado embaixo
deles. O corpo está bem carbonizado, mas não há dúvidas que é o Kido.
OFICIAL RISA – Tem certeza, Tetsuo? Não há mais
nenhum outro corpo aí? Tudo foi bem averiguado?
OFICIAL TETSUO – Sem dúvida alguma, Risa. Não há
mais nada a não ser destroços. Se a moça realmente estava aqui, desapareceu
como poeira; sem deixar quaisquer vestígios.
OFICIAL RISA – Está bem, eu te encontro no local. (desliga o celular) Bem, professora
Kaname, sinto informar, mas não temos ideia do paradeiro da Hotaru. O corpo
dela não está nos escombros do farol, e é mais um caso para nossa conta. Agora,
com licença, eu preciso ir até lá. Provavelmente, voltaremos a nos falar;
inclusive sobre a situação legal de Kokoro Ito. Com licença!
A Oficial Risa então sai, sem sequer dar tempo de
resposta. Kaname fica assustada, e só então nota que o Doutor ainda está na
sala.
KANAME – Doutor, pode me emprestar um telefone? O
meu celular deve ter ficado na escola.
DOUTOR – Se for rápida, eu posso.
Então, ele emprestou seu celular para que a mulher
fizesse a ligação. Mas, nada de a chamada completar; ela havia ligado para
Joji. Em seguida, resolveu ligar para o próprio celular e assim obteve sucesso.
Sakura atendeu a ligação. A mesma foi informada,
resumidamente, de todo o ocorrido, sobre o estado de Kaname e de Kokoro, e do
desaparecimento de Hotaru. Porém, Kaname não contou da sua mais nova
preocupação: o interesse das autoridades acerca da situação legal de Kokoro.
Então, depois de concluída a ligação, ela devolveu o aparelho.
KANAME – Obrigada, doutor. Pelo menos eu sei que
elas estão conseguindo cuidar das coisas por lá sem mim.
DOUTOR – Tudo bem, Srta. Kaname. Notei que ficou
preocupada quando a policial perguntou sobre a pequena Kokoro, certo? Há algo
de errado a respeito disso?
KANAME – Não, doutor, na verdade não há nada de
errado. Eu cuido da Kokoro desde bebê a pedido desse meu amigo, Joji Sasaki.
DOUTOR – O que lhe preocupa é: nem você, nem o seu
amigo possuem a tutela legal da menina, correto?
KANAME – Doutor, não tenho nenhum documento oficial
a respeito da tutela dela. Mal sei de onde ela veio: eu sempre gostei muito de
lidar com crianças, por isso escolhi ser professora. Abri a minha escolinha com
muito esforço, e o Joji me ajudou bastante no início. Até hoje ele me ajuda.
Todo o suporte referente a Kokoro vem dele.
DOUTOR – Bom, realmente o caso não é tão simples
quanto parece. É melhor que conversem e procurem uma maneira de resolver a
situação legal da menina. Aqui no hospital não vamos mantê-la após ter alta;
mas a polícia vai querer entender as questões e, caso as autoridades julguem
necessário, podem acabar retirando a Kokoro do convívio de vocês. Eu estou
avisando isso porque, por mais que eu seja médico, tive uma irmã advogada; por
isso, tenho esse pouco conhecimento.
KANAME – Sim, doutor...
DOUTOR – Shizuka. Shizuka Igarashi. Agora, com sua
licença, preciso ver alguns prontuários. Dentro de algumas horas, devo estar de
volta assim que o médico-chefe der a sua alta.
Então, o Dr. Shizuka Igarashi deixou o quarto.
Kaname ficou ainda mais aflita, preocupada com o bem-estar da pequena Kokoro;
só Joji poderia pensar em alguma maneira concisa de resolver essa questão, mas
ele estava incomunicável.
Naquele fim de tarde o
tempo já começava a mudar, visto o tempo ensolarado no decorrer do dia. Porém,
as irmãs Mizushima haviam tido a melhor notícia em muito tempo: seu irmão mais
novo, Ken, havia voltado para junto delas. Joji e Yuna ficaram felizes pelo
reencontro dos três, já que de certa forma estavam todos familiarizados com
aquela história. Os cinco estavam acomodados dentro do cômodo, enquanto Sakura
preparava uma sopa quente para o jantar.
SAKURA –
Se você tivesse aparecido em uma ocasião melhor, com certeza prepararia uma
tigela de lamen para você.
KEN – Não se preocupem, manas. Eu
cheguei de surpresa; claro que adoraria o lamen, mas, eu sei que qualquer coisa
que você faça é uma delícia. Não é bem o forte da mana Tomoe....
TOMOE –
Me poupe dos seus comentários, Ken.... Você acabou de chegar, mas se ficar me
irritando eu te bato com a vassoura. Ainda sou sua irmã mais velha. Mas me
diga, Ken, o que fez depois que nos separamos no pé daquela montanha?
Ken encostou a mochila na parede,
retirou a jaqueta e ficou pensativo.
KEN – Sabem, eu fui seguir a dica
daquela tabuleta. Pedi que vocês seguissem pelo pé da montanha até que
encontrassem uma saída; lá eu fiquei esses dois anos treinando, fiz o meu
melhor para melhorar e ser tão bom quanto nosso pai. E lá eu também conheci a
Yuna, ela resolveu me seguir. Se apresente, Yuna!
YUNA – Boa tarde, eu sou Yuna e esta
aqui é a Mima. É um prazer!
As irmãs assentiram com a cabeça, mas
estavam mais interessadas em saber sobre o irmão.
SAKURA (com a bandeja nas mãos) – E você conseguiu chegar? Mas já são quase
2 anos desde que nos despedimos lá. Ficamos apavoradas com a ideia de nunca
mais voltarmos a ver você, embora algo sempre nos dissesse que você estava por
aí.
TOMOE – Temos a sorte de Kaname ter nos
arranjado este cômodo para nos alojarmos; em troca, nós ajudamos a cuidar da
escola aqui. Mas antes disso, foi difícil: não tínhamos muito dinheiro,
comprávamos pão com alguns trocados e acabávamos por dormir na rua.
KEN – Em pensar que a nossa família
chegaria a passar por tais necessidades. De onde viemos, nunca nada nos faltou.
O problema é saber que não podemos voltar para lá.
SAKURA (após sentar-se e servir as tigelas) – Tudo o que fomos ficou lá. E
mesmo assim, nada lá mais nos resta. Aqui é o nosso lugar agora. Mas, Ken, e
quanto ao santuário? O que você encontrou lá?
De repente, lágrimas desceram dos olhos
de Ken. Ele então contou sobre o encontro com os espíritos dos pais e de Kaoru,
a sintonia com Genbu, e por fim, contou também sobre como encontrou Joji no
meio da floresta.
TOMOE – Sim, é claro. Senhor Joji, a
Kaname deve estar voltando em breve, ela ficou de ter alta hoje. A Kokoro está
bem, só está em observação por conta do choque emocional. Quanto a Hotaru...
SAKURA – ...infelizmente, nada. Ela não
está no hospital, e a polícia deve começar as buscas por ela amanhã. Mas
afinal, o que aconteceu, Sr. Joji?
Joji então, explicou o ocorrido dentro
do farol, omitindo o despertar dos poderes de Seiryu, já que ele não sabia se
as irmãs compreenderiam algo.
KEN – Sabem, irmãs... o Joji também é
um guardião escolhido, assim como o Mestre Genbu me escolheu! Eu senti o poder
dele duas vezes: no dia em que cheguei ao templo e hoje pela manhã. Eu e o Joji
nos transformamos!
Joji e as irmãs se assustaram, não
esperavam que Ken fosse falar isso tão abertamente.
KEN – Ora, está tudo bem! Minhas irmãs
conhecem muito bem o Mestre Genbu, e o Joji também é um guardião; porém, a
divindade que o rege é Seiryu. Estamos todos em família, aqui!
TOMOE – Não exatamente, Ken. Kaname não
sabe nada dessas coisas. Você vai conhece-la quando ela chegar; mas, por favor,
não fale nada referente a isso diante dela.
SAKURA – Kaname é muito inteligente,
mas esse assunto é algo que ela provavelmente não vai entender.
Logo, se voltaram para Yuna, que apenas
observava a conversa dos adultos. Sakura sempre acolhedora, sorriu para ela.
Tomoe a observou enquanto Joji mexia no celular.
SAKURA – Bom, Yuna, nos conte sobre
você. De onde você veio?
YUNA – Eu nem sei direito. Só lembro
mesmo de ficar andando junto com a Mima, e ter chegado ao santuário onde o tio
Ken treinava. Aprendi muita coisa com ele, sabem. Mas ainda não tenho idade
para empunhar uma espada.
TOMOE – E você gosta de espadas?
YUNA – Claro! Aprendi a gostar vendo o
tio Ken treinar! E ele sabe muita coisa sobre isso, tanto que eu aprendi só
observando. Se quiserem, eu mostro a vocês!
KEN – Yuna, não se esqueça da
disciplina. Alguém que maneja uma espada não deve ficar se exibindo apenas para
satisfazer o seu ego, embora a perícia faça parte do orgulho de um espadachim.
Yuna assentiu, e nada mais disse, então, as irmãs começaram
a falar sobre a escolinha, que tinha vários alunos da idade dela e que ela se
daria muito bem com todos. Logo em seguida, o celular de Joji tocou, era do
hospital, avisando que Kaname teria alta.
JOJI – Bem, acho melhor eu ir buscar a
Kaname no hospital. Aproveito e pergunto sobre a Kokoro diretamente, e se
alguém com as características da Hotaru deu entrada. Talvez eu demore um pouco,
não sei.
KEN – Posso ir com você, Joji?
SAKURA – Ken, não seja tão atrevido!
JOJI – Não sei se é necessário, mas se quiser, pode
vir comigo.
TOMOE – Talvez seja bom. Yuna fica conosco e
descansa um pouco, precisa de um banho e já vamos arranjar um canto para que
vocês possam dormir. Temos de conversar com Kaname sobre a permanência dos dois
aqui.
Então, os dois saíram. Sakura recolheu as tigelas e
foi lavar, enquanto Tomoe instruiu Yuna a ir tomar banho; assim, podendo
recolher o macacão da menina e colocando junto com as roupas sujas. Sakura foi
buscar uma roupa de Kokoro na casa de Kaname para Yuna vestir logo após terminar
de lavar a louça. Quanto a Mima, ficou em um canto da casa, estranhando todo
aquele ambiente o qual era novidade para ela.
No quarto do hospital no qual Kaname está alojada,
se encontram a mesma e o Dr. Igarashi.
DR. IGARASHI – Bem, Srta. Kaname, o Sr. Joji Sasaki
já foi informado de sua alta e está a caminho para lhe buscar. Basta seguir as
recomendações e, caso aconteça algo atípico, não hesite em retornar.
KANAME – Obrigado, Dr. Igarashi, mas... e a Kokoro?
Ela não vai voltar conosco?
DR. IGARASHI – Hoje ela conversou com a psicóloga e
aparentemente está bem; no momento, só deseja retornar para casa. Mas não deixe
de conversar com o Sr. Sasaki referente a situação dela. Agora, vou busca-la na
ala infantil.
Kaname assentiu que sim e o doutor saiu; porém a
insegurança era nítida, ela sequer sabia o que fazer. Estava preocupada com a
pequena Kokoro, eram oito anos de convivência: a pequena cresceu sendo cuidada
por Kaname e era muito ligada aos colegas da escolinha. Havia aprendido a
gostar das irmãs Mizushima desde a chegada delas, assim como de Hotaru. E
Hotaru? Qual terá sido afinal o destino de Hotaru? O que ela diria a Kokoro
sobre a professora?
Em seguida, Joji chega, acompanhado de Ken no
aposento.
JOJI – Como está, Kaname? Eu vim buscar você e a Kokoro.
Sim, este é o Ken, o irmão das moças que estão lá contigo.
KEN – É um prazer, Srta. Kaname.
KANAME – O prazer é meu, Ken. Você é um rapaz
bonito, sabe?! Realmente, tem suas semelhanças com suas irmãs... mas, por que
seu cabelo é ruivo?
KEN – Mamãe sempre dizia que eu era uma bola de
fogo.
Ambos sorriram, e logo em seguida a porta se abriu
e a pequena Kokoro adentrou o quarto. Ao ver Kaname, a menina correu para os
braços dela.
KOKORO – Senti sua falta, tia Kaname.
KANAME – Agora já passou, pequena. E você, como
está?
KOKORO – Tia, não estou machucada. O homem mau não
vai voltar, não é?
JOJI – Não, Kokoro. Ele não vai mais fazer mal a
você nem a ninguém.
KOKORO – E cadê a tia Hotaru?
Um silêncio tomou conta do quarto. Em seguida, o
Dr. Igarashi adentrou o quarto com os prontuários. Era fato que até aquele
momento ele não conhecia Joji e menos ainda Ken. O silêncio perdurou por alguns
segundos e os três se entreolharam.
KANAME – Está tudo bem?
JOJI – Pois não, doutor?
DR. IGARASHI – Eu vim entregar os receituários...
KEN – Você...
Eles sequer sabiam como reagir, mas aquela situação
era totalmente inesperada. Joji, pela primeira vez em muito tempo, ficou sem
reação; talvez porque ali na sala houvessem pessoas demais e aquela sensação
não lhe era de fato estranha, mas a presença de Ken ali fazia as coisas soarem
mais intensas.
KANAME – Gente, o que está acontecendo? Por que
vocês estão assim?
Num estalo, Joji voltou a si; mas Ken e o doutor
continuaram se encarando. Kaname, vendo aquela situação anormal perdurar, se
ergueu do leito e se aproximou do médico, tomando posse dos papéis nas mãos do
mesmo.
KANAME – Obrigada, doutor. Agora, podemos partir,
certo?!
DR. IGARASHI (voltando
a si) – É claro, senhorita. Basta seguir as orientações...
JOJI – Então, vamos. Foi um dia longo e eu vou
deixar vocês na escolinha... Com licença, doutor...
O grupo se retirou, cumprimentando o médico que
permaneceu na sala por alguns instantes. Então, ele saiu logo em seguida, para
que pudesse retirar sua mochila e ir embora, já que seu plantão tinha
encerrado. Seu pensamento estava distante e ele fazia tudo automaticamente, de
acordo com sua rotina desde que havia entrado para o quadro daquele hospital.
Em seguida, ele pegou um cordão em formato de crucifixo e pôs no pescoço. Logo
estaria em casa, pegaria o ônibus e mais uma vez estaria sozinho.
Do lado de fora, após conversarem mais um pouco,
Joji e os demais começaram a se acomodar no carro. Kaname e Kokoro entraram
para os bancos traseiros, de modo que podiam ficar juntas. Ken se preparava
para entrar no banco ao lado do motorista, quando avistou o jovem médico saindo
do hospital. Pediu um momento a Joji e aos demais, e foi até o médico.
KEN – Boa tarde novamente, doutor.
DR. IGARASHI – Boa tarde. Pois não?
KEN – Meu nome é Ken, Ken Mizushima. Acabei de
chegar à cidade, e aquele cara ali é meu amigo. (Ken então começou a observar o crucifixo no peito do médico).
DR. IGARASHI – Não compreendo muito bem a sua
atitude, mas eu sou Shizuka Igarashi. Isso aqui é um crucifixo, apenas uma
lembrança de família. Eu sou nipo-brasileiro: nasci no Brasil, mas vim para cá
ainda pequeno. Para falar a verdade, nem sei porque estou contando isso a você.
KEN – Não é como se já nos conhecêssemos?!
Joji então foi se aproximando, para poder
compreender melhor a atitude de Ken de mais uma vez se aproximar do doutor.
JOJI – Vamos, Ken. Sei que quer fazer amizades
aqui, mas teremos muito tempo ainda.
VOZ MISTERIOSA – Na verdade, todo o tempo é
precioso.
DR. IGARASHI – Mas o que... quem disse isso?
KEN – Você ouviu, Joji?
JOJI – Sim, eu ouvi. Mas o que é isso?
Porém, no mesmo instante, se ouviu um estrondo
acima das escadas e uma gritaria teve início. Logo, muitos civis começaram a
evadir o hospital o mais depressa possível. Uma enfermeira foi na direção deles
em pleno desespero.
ENFERMEIRA (aos gritos) – Fogo! O hospital está em
chamas!
JOJI – O que aconteceu?
ENFERMEIRA – Não sei! Foi de repente, foi muito
rápido! Ainda há muita gente lá dentro!
Por instinto, Ken avançou pelas escadas, seguido de
Joji que não sabia exatamente o que fazer.
DR. IGARASHI – O que vocês vão fazer? Não ouviram o
que ela disse?
KEN – Tem pessoas lá dentro, crianças também! Eu
não vou ficar olhando nem esperando socorro!
JOJI (próximo
a Ken) – Se alguém pode agir agora, somos nós, Ken.
E ambos seguiram adiante. Ao entrarem, o saguão
estava praticamente vazio, com algumas pessoas desacordadas e o fogo já estava
próximo dali. Ainda não tinha chegado nos andares superiores, mas era questão
de tempo.
JOJI – Não dá para subir desse jeito.
KEN – Nós precisamos agir, Joji.
DR. IGARASHI – O que vocês pretendem fazer?
Foi no momento em que ambos se deram conta da
presença do jovem médico ali.
JOJI – Mas o que você pensa que está fazendo,
doutor? Veio aqui só para correr perigo?
DR. IGARASHI – Eu jurei salvar vidas também. Aqui é
o meu lugar de trabalho, e aqui tenho muitos pacientes; se eu puder fazer algo
para salvá-los das chamas, eu farei.
Nesse momento de desespero, tanto Ken quanto Joji
foram segurá-los pelos braços como se o quisessem convencer de ficar afastado;
porém algo incomum aconteceu. Naquele momento, o tal mantra efêmero ressoou
novamente.
VOZ MISTERIOSA – Encontraste teus companheiros de
jornada, meu jovem rapaz. Siga junto a eles.
DR. IGARASHI – De novo?!
KEN – Doutor...
DR. IGARASHI – Pode me chamar de Shizuka...
JOJI – Agora eu estou entendendo tudo...
Então, uma forte labareda avançou contra o trio.
Quando ela cessou, a visão de Ken e Joji vestidos com suas armaduras
reluzentes, enquanto o outro também trajava uma armadura branca e azul.
KEN – Então, você é um de nós!
SHIZUKA – Não compreendo... o que é isso?
JOJI – Te explicamos depois. Agora, precisamos
agir.
KEN – Creio que devo criar uma barreira e impedir
que essas chamas avancem.
JOJI – Isso não vai resolver. O calor pode
comprometer a estrutura. Precisamos descobrir de onde isso vem.
SHIZUKA – Estou perdido. O que houve comigo? O que
eu faço com isso?
JOJI – Concentre-se.
Shizuka, debaixo daquela armadura, se concentrou.
Repentinamente ouviu um tigre rugir em seu íntimo, e notou que o crucifixo que
antes estava em seu pescoço agora estava em sua mão. Ele reluziu e emitiu uma
energia que fluiu para dentro do corpo do jovem.
SHIZUKA – Lou!
O crucifixo se estendeu como uma espécie de laço
mágico no corredor adiante até a origem daquelas chamas, e trouxe algo preso ao
mesmo. Qual não foi a surpresa ao notar que o item trazido era nada mais, nada
menos que uma rosa. Porém, era uma rosa em chamas que começava a manifestar seu
poder e rapidamente lançaria a labareda adiante.
SHIZUKA – Isso é loucura! Uma rosa?
A tal rosa emitiu uma labareda tão forte que
arremessou os três, estilhaçando a portaria de vidro blindado e assim caindo do
lado de fora do hospital. Eles não se feriram, porém estavam atordoados com
aquele ocorrido de proporções totalmente absurdas para a compreensão de
qualquer ser humano, do mais são ao mais louco.
VOZ MISTERIOSA – Não vaciles e não recues, meu
jovem. Eu conheço teu valor desde o ventre de tua mãe.
SHIZUKA – O quê, essa voz de novo? Quem é você?
VOZ MISTERIOSA – Sou o teu mestre, o dono das
garras e das presas que te guardam desde sempre. Sou Byakko, aquele que troa o
rugido afim de dissipar o mal.
SHIZUKA – Byakko, da lenda?! Então, eles...
BYAKKO – São teus companheiros, jovem. Escolhidos
por outros mestres para o mesmo fim. Passaste a tua vida inteira sozinho, e sempre
te queixaste. Agora, é com eles que deves estar. Não apenas porque são
escolhidos, mas também porque são almas afins, criadas há eras pelo mesmo
propósito de evolução; sem nunca terem desviado o rumo apesar das adversidades.
SHIZUKA – Ainda estou perdido... isso é tudo tão
novo para mim!
BYAKKO – Apenas deves confiar em mim! Lute!
Shizuka se ergueu e sentiu o poder de Byakko cada
vez mais forte.
SHIZUKA – Sr. Joji, Sr. Ken... (ajudando-os a se erguerem) ainda não entendo muita coisa, mas eu
sei o que preciso fazer. Vocês são meus companheiros, e agora sinto uma
tremenda emoção em meu interior.
Ken e Joji ouviram, e ficaram tocados com aquelas
palavras. Sentiam sinceridade e a necessidade do jovem médico de ter por perto
pessoas afins, ou seja, que harmonizavam com sua essência e partilhavam de sua
evolução.
SHIZUKA – Seja lá o que for, não vai fazer mais
estragos.
Porém, passado esse tempo, a rosa não emitiu mais
labaredas. Eles sequer viram o fogo iluminar o interior do saguão do hospital.
VOZ MASCULINA – Mas que droga, hein? Vocês
arruinaram tudo. E quanto a você, Joji durão, essa armadura não vai me impedir
de acabar com você dessa vez. O seu coração, junto com o dos seus amigos, será
o meu aperitivo de hoje.
JOJI – Essa voz... mas como?!
KEN – Conhece, Joji?
De repente, uma figura monstruosa saiu do saguão do
hospital; porém a visão não era clara, graças as lâmpadas incineradas pelas
labaredas de antes.
CRIATURA – Eu voltei do inferno para te buscar,
Joji Sasaki!
CONTINUA...
4 Comentários
Grande Lee Yu!
ResponderExcluirComo é bom ver sua trama ganhando forma a cada capítulo!
Os heróis se encontrando ,se reconhecendo...
Percebo o esmero e o cuidado como você vem conduzindo esse processo de formação do "escolhidos" pelas entidades quintessenciais.
Pela dica do texto e pelos acontecimentos, o sumiço de Hotaru,em breve será estabelecido, tendo a quarta integrante atuando com Jooji, Ken e o nipo-brasileiro Shizuka.
A conexão da fera lendária com os os seus hospedeiros, também tem sido um ponto muito bem narrado, à semelhança do que ocorreu com os queridos NeoChangeman do Lanthys.
Uma trama envolvente e que promete muito.
Meus parabéns!
Obrigado pelo seu apoio, meu querido Jirayder.
ExcluirLogo logo muitas coisas serão esclarecidas de uma vez, de modo que enfim teremos o fechamento de um arco.
Mais uma vez agradeço pelo seu apreço e, peço que continue dando esse apoio de ouro.
E mais um episódio muito bom veio à tona, tivemos o surgimento do deus fera Byakko, um dos que mais gosto dessa lenda dos deuses celestiais, e convenhamos, chegou de forma legal, bem narrada, bem trabalhada, apresentando muito bem a que veio e como muito provavelmente funcionará sua presença! A saga está tomando forma, os personagens estão se conhecendo, a trama toda está sendo muito bem montada e creio que teremos grandes aventuras pela frente! Parabéns pelo trabalho Lee Yu, está realmente ficando muito boa tua saga e teu trabalho, fico feliz em te ver produzindo e espero que continue sempre que te for possível! Grande abraço meu amigo!
ResponderExcluirGratidão, meu amigo! Eu fico muito feliz em ver que você aprecia o meu trabalho dessa maneira! Gratidão mesmo pelo seu apoio! Continue acompanhando, pois muita coisa vai se desenrolar!
Excluir