Capítulo IV - Os Stroheim ao longo da história (parte III)
Não sei se vocês ficaram sabendo, mas esses dias saiu trailer do próximo Fatal Fury, que irá sair no ano que vem sob o título "Garou: City of the Wolves". Cinco personagens já foram divulgados, entre eles o Terry (protagonista da franquia) e o Rock Howard (filho do Geese - sobre o qual falarei nos capítulos finais), e mais três novos. Esse é o primeiro lançamento de jogos da franquia desde "Garou: Mark of the Wolves", de 1999 e lançado para o Dreamcast. Espero que o jogo faça sucesso e a que a atual SNK comece a dar o devido valor às franquias Fatal Fury e Art of Fighting.
Após a morte
de Carlos Magno (814) e a posterior fragmentação do império carolíngio em três
partes por meio do tratado de Verdun em 843, os Stroheim se tornaram uma das
mais eminentes famílias da aristocracia feudal germânica que emergiu nos
séculos subsequentes. No final do século IX e primeira metade do século X, o
clã germânico se destacou no combate aos avanços das hostes magiares e eslavas
sobre as terras germânicas, e apoiou a fundação do Primeiro Reich, o Sacro
Império Romano-Germânico (962 – 1806). Como retribuição ao apoio à fundação do
Primeiro Reich, Otto II, o vencedor da batalha de Lechfeld (955) e fundador do
Primeiro Reich, concedeu aos Stroheim amplas terras na Baviera. Lá, construíram
glebas e até mesmo imponentes castelos e se tornaram uma das famílias mais
influentes dentro da política do Primeiro Reich.
E, com a
fundação de reinos na Europa Oriental e Setentrional tais como a Noruega, a
Dinamarca, a Suécia, a Hungria, a Polônia, a Boêmia (atual República Tcheca) e
a Rus’ (os quais com o tempo abandonaram os velhos deuses pagãos e adotaram o
cristianismo nos séculos X e XI), os Stroheim aproveitaram-se para ampliar seu
raio de ação. Dinastias islâmicas como os fatímidas no norte da África também
estabeleceram relações com o clã germânico. No Império Bizantino, os Stroheim
passaram a servir a partir do século X na guarda varegue, a guarda de
mercenários de origem escandinava que serviam como a guarda imperial dos
imperadores bizantinos entre os séculos X a XIV. Até mesmo o Santuário de
Athena na Grécia utilizou-se dos serviços de guarda-costas do clã germânico.
Do ponto de
vista militar, os Stroheim participaram ativamente e se envolveram em conflitos
como a Reconquista cristã na Península Ibérica, as conquistas de Knut o Grande
no Escandinávia e nas ilhas Britânicas, as batalhas da Ponte Stamford e
Hastings na Inglaterra em 1066, as cruzadas (tanto no Oriente Médio contra os
potentados islâmicos locais quanto no norte contra os povos pagãos da região do
Mar Báltico) e outros. No caso específico das cruzadas levantinas, após o
estabelecimento dos reinos cruzados no Levante, os Stroheim com o tempo
passaram a servir tanto aos reinos cruzados quanto aos soberanos islâmicos
vizinhos. Exemplo disso foi a Terceira Cruzada. Os Stroheim serviam tanto às
forças cristãs de Ricardo o Coração de Leão quanto às forças islâmicas do
sultão aiúbida Saladino. Tanto na linha de frente como soldados de infantaria,
cavalaria e comandantes, quanto como guarda-costas dos líderes litigiosos e até
mesmo embaixadores e tradutores.
Na Ibéria
também atuaram desta mesma maneira na Reconquista, assim como em querelas entre
o Papa e o imperador do Sacro Império-Romano Germânico. E os Papas da época não
apenas perceberem esse jogo duplo por parte dos Stroheim, como também um deles,
João XIX, ameaçou excomungar o então chefe dos Stroheim, Wilhelm da Suábia, até
ameaçaram de excomungá-lo. Este se usou de sua influência subterrânea para
resolver a questão com o Papa, e então as duas partes chegaram a um acordo e a
excomunhão não se efetivou.
No século
XIII, os Stroheim não apenas atuaram na linha de frente das conquistas das
ordens de cavaleiros germânicos (entre eles os Cavaleiros Teutônicos) na
Prússia e no Báltico oriental, nas chamadas Cruzadas do norte, como também em
um primeiro momento se opuseram aos avanços das hostes mongóis sobre a Europa,
quando estes invadiram os principados russos entre 1237 a 1240 e a Polônia e a
Hungria em 1241 sob a liderança de Batu Khan[1],
um dos netos do grande Čingis Khan, e do general Subėdėi. Mas, tão logo os
mongóis, após vencerem os exércitos polacos e húngaros um após o outro e
enviarem tropas às fronteiras orientais do Sacro Império Romano-Germânico, se
retiraram da Europa central, eles trataram de chegar a um acordo com os
recém-chegados. Batu Khan, após o fim da campanha europeia, passou a ter em sua
própria guarda imperial guarda-costas Stroheim. Após a morte de Batu, os
sucessores dele também se valeram dos serviços dos Stroheim.
Uma vez
estabelecidos na corte de Batu em Sarai no baixo Volga, foi questão de pouco
tempo guarda-costas Stroheim aparecerem também na corte imperial em Karakorum,
a capital do Império Mongol e fazerem parte da guarda imperial. E desempenharam
papel importante no afastamento da linhagem de Ogodėi do poder em Karakorum tão
logo Gujug faleceu em 1248 após dois anos de reinado. Eles se aproximaram dos
opositores de Gujug e ao lado de Batu e outros eminentes opositores do então
grande khan apoiaram a ascensão de Mongkhė, o qual anos antes esteve junto de
Batu na campanha europeia, ao poder.
Os Stroheim
presentes em várias partes do império tiveram importância crucial para formar a
articulação que removeu a linhagem de Ogodėi do poder, como também, por meio de
seus informantes estabelecidos por meio das rotas comerciais da Rota da
Seda, também foram importantes para os mongóis não só articularem a campanha,
como também aniquilarem com o poder da seita dos assassinos na Pérsia, nos anos
1250.
Após a morte
de Mongkhė, eles apoiaram a ascensão de Khublai Khan, o fundador da dinastia
Yuan na China, e com isso os Stroheim estabeleceram seus primeiros pés na
China. À época de Khublai Khan, guarda-costas germânicos oriundos do clã
Stroheim serviam à guarda imperial ao lado de efetivos chineses, russos, persas
e de outros povos conquistados pelos mongóis. E tão logo os Yuan entraram em
declínio ante a aparição do movimento dos turbantes vermelhos em meados do
século XIV, eles apoiaram a ascensão da dinastia Ming (r. 1368 – 1644). Por
fim, até mesmo o grande Tamerlão recorreu aos serviços dos Stroheim. Quando
este guerreou contra a Horda Dourada entre 1391 a 1396, lá estavam os Stroheim
atuando em ambos os lados da contenda. Tanto do lado de Tokhtamyš, o perdedor
da guerra, quanto de Tamerlão, o grande vencedor.
Com a
descoberta das Américas por parte de Portugal e Espanha, também foi questão de
tempo os Stroheim se estabelecerem no Novo Continente, visto que guarda-costas
foram enviados especialmente pelo grão-mestre da família na Alemanha para
servir aos administradores coloniais das regiões sob o controle da Espanha e de
Portugal. Com a entrada de outras potências na corrida colonial como
Inglaterra, Holanda e França, o serviço dos Stroheim também se estendeu às
potências emergentes. Parte do o ouro e da prata trazidos da América também
chegou aos cofres dos Stroheim, ajudando o clã a ficar ainda mais rico e
poderoso. E com esse afluxo extra de ouro e prata eles se aproveitaram dessa
quantia extra de recursos para agirem como mecenas (não que eles não já fizessem
isso antes, diga-se de passagem) de pintores, escultores, músicos e outros
artistas, principalmente durante o período do Barroco. Catedrais em estilo
gótico foram construídas com o mecenato dos Stroheim em partes da Alemanha e da
Áustria e Renascentista em locais como a França, a Itália e a Suíça.
Outro império
que também contou com o apoio do clã Stroheim foi a Rússia, sob a liderança do
Principado de Moscou. Tal como fizeram com o Império Mongol, os Stroheim
apoiaram a expansão da Rússia na direção do leste. Serviram aos imperadores em
regimentos como os atiradores (em russo strelcy/стрельцы), e após o período de
distúrbios que flagelou a Rússia após a morte de Ivan IV o Terrível apoiaram a
ascensão dos Romanov ao poder, a partir de 1613 com a entronização de Mikhail
Romanov. Há quem acredite, a propósito, que o duque Johan Ernst Von Biron, o
favorito da imperatriz Ana da Rússia (r. 1730 – 1740) e regente do império
russo por três meses no ano de 1740, tenha sido um representante dos Stroheim
na Rússia. O Império Otomano também contou com o apoio dos Stroheim. Na
verdade, eram os próprios Stroheim que ajudavam os turcos a localizar e
capturarem infantes europeus para depois se tornarem janízaros, a tropa de
elite do exército otomano e que servia diretamente ao sultão otomano. Os
janízaros desempenharam papel essencial nas guerras de conquista da Sublime
Porta na Europa, até serem extintos em 1826 por decreto do sultão Mahmud II.
Sobre a
atuação dos Stroheim na política mundial, alguns parênteses: ela não tem
passado despercebida ante os olhos da população. E a atuação deles ao longo dos
séculos, como não poderia deixar de ser, é objeto de controvérsia. Há quem
acredite que os Stroheim sejam um mero clã da nobreza germânica, ao passo que
outros acham que eles é que são o poder por trás do trono de reis, imperadores,
califas, papas, sultões, tzares, xás e tantos outros soberanos ao longo da
história. Há aqueles que os admiram, não apenas pela riqueza que eles obtiveram
ao longo do tempo, como também pelo fato de ser uma família influente na
política mundial há muito tempo. E
também pelo mesmo motivo há aqueles que não vão nem um pouco com a cara deles.
Há quem acredite também que aqueles que acham que os Stroheim sejam os
poderosos por trás dos tronos e que eles estão envolvidos em toda sorte de
golpes de Estado e mudanças dinásticas (entre elas a queda dos Ming e a
ascensão dos Manchu na China a partir de 1644) ao longo da história não passam
de teóricos da conspiração e que estes inventam muita coisa a respeito deles
que não corresponde à realidade. Entre tantas outras controvérsias.
Mas, voltando
ao ponto principal, nem tudo foram flores para o clã germânico. A milenar
história dos Stroheim também passou por algumas crises, e talvez a maior e mais
impactante delas teve lugar no século XVI, durante a Reforma Protestante,
iniciada por Martinho Lutero após o monge agostiniano, insatisfeito com certas
práticas da Igreja Romana, divulgar as 95 teses em Wittenberg no ano de 1517. O
grão-conde do clã na Baviera, por seu turno, manteve-se fiel ao Papa e passou a
repudiar os ramos de sua família que aderiram ao “impostor Lutero”, de tal modo
que ele apoiou a contrarreforma lançada pela Igreja Romana a partir de 1545.
Com a Reforma
Protestante, o clã se dividiu entre aqueles favoráveis à Reforma, mais comuns
no norte da Alemanha, e àqueles que se mantiveram fiéis ao Papa Romano, mais numerosos
no sul da Alemanha e na Áustria. Nas guerras religiosas que flagelaram a Europa
nos séculos XVI a XVIII, parte deles apoiou potências católicas como a Áustria,
a Espanha e a França, outra parte deu apoio às potências que aderiram à Reforma
como a Inglaterra, a Holanda e os países escandinavos.
Outra grande
perda que o clã sofreu nesse ínterim aconteceu em 1686, quando o grão-conde de
Stroheim da época, Johan Graf von Stroheim, foi morto em um confronto com saqueadores espaciais. Estes, por seu turno,
após matarem o patriarca da família, Gottfried Krauser Graf[2]
von Strolheim, sequestraram uma das crianças, chamada Franz Krauser Graf von
Strolheim. Outras crianças bávaras também foram sequestradas pelos saqueadores
espaciais naquele mesmo ano[3].
O baque foi
tão profundo que levou certo tempo para o clã Stroheim recuperar-se do choque.
E, como aconteceu no primeiro século da Era Cristã, houve até quem acreditasse
que o lixo da história aguardava aos Stroheim e que eles nunca mais teriam o
poder que tinham outrora. Mas tão logo o tempo passou, o clã germânico mostrou
mais uma vez ao mundo que se há uma coisa neste mundo no qual eles são
especialistas é em sobrevivência.
Pouco a
pouco, o clã foi se reestruturando, algumas reformas internas foram feitas, as
questões religiosas foram sendo gradativamente resolvidas após a tragédia de
1686 por meio de uma grande concordata e assim a boca daqueles que achavam que
os Stroheim não sobreviveriam a todos esses baques e crises seguidas foi
calada. O clã germânico sobreviveu não apenas às guerras religiosas dos séculos
XVI a XVIII, como também à Guerra dos Sete Anos, às Guerras Napoleônicas e
outros conflitos subsequentes do período.
[2]
Graf – conde em alemão.
[3]
Ver “Cruzador Imperial Mess” e “A verdadeira história do rapto dos Flashman
quando pequenos”, ambas disponíveis nesta plataforma.
1 Comentários
Mais um avanço no tempo e chegamos a efervescente era Moderna, com o Renascimento e a Reforma Protestante.
ResponderExcluirEntre altos e baixos, o fato é que o clã Stroheim, sobreviveu, se fortalecendo em meio a perdas e contratempos na jornada.
Como será a atuaão do clã na Idade Moderna?